A VISÃO teve acesso a uma declaração que vários trabalhadores de call center estarão a ser obrigados a assinar que exclui o regime de teletrabalho, alegando que não estariam garantidas as devidas condições de segurança e de confidencialidade necessárias à prestação do serviço nessa modalidade.
“Assim, resulta do exposto que estas atividades não podem ser exercidas em regime de teletrabalho, pelo que é necessário que o referido trabalhador se desloque, diariamente, sem prejuízo dos dias de descanso semanal, às instalações da empresa, de modo a assegurar o seu trabalho durante este período extraordinário de surto”, lê-se na missiva.
“Alguns call centers estão a assediar os trabalhadores para os obrigarem a trabalhar nas instalações das empresas”, confirma o presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Call Center (STCC), Danilo Moreira.
O assédio reflete-se em ameaças de despedimento, de não renovação do contrato ou de redução do horário de trabalho.
Ao presidente do STCC chegam relatos de casos de pessoas que decidiram gastar dias de férias para evitarem a deslocação à empresa durante a epidemia ou mesmo de quem esteja a dar faltas injustificadas “por medo do contágio”.
Danilo Moreira explica que os call centers são verdadeiros locais de risco: “Se uma pessoa ficar infetada, corremos o risco de contaminar mil” – na Coreia do Sul, um único call center foi responsável por 129 infeções de uma vez só. “As pessoas sentam-se a um metro de distância e trabalham num espaço aberto onde circula toda a gente. Além disso, estes locais não costumam ser arejados”.
Outro dos principais fatores de risco é o facto de “os postos de atendimento serem partilhados por seis ou sete pessoas e não terem higienização”, denuncia.
O STCC não tem conhecimento de que tenha sido entregue qualquer material de proteção aos trabalhadores, mas alguns levam máscaras e álcool de casa. “Também acontecem casos de serviços que abrem às oito da manhã e, às dez, já não têm detergente disponível para os trabalhadores limparem os teclados ou os auscultadores”.
O sindicalista só vê uma razão para as empresas recusarem o teletrabalho: “exige investimento”. Trabalhar de casa implica um posto de trabalho por cada trabalhador, enquanto nas instalações das empresas o material é partilhado por vários funcionários.
“Existem vários países da Europa onde a prática já é trabalhar a partir de casa e, em Portugal, também há algumas empresas que já o fazem, o problema é que muitas delas não estão dispostas a fazerem esse investimento”, afirma.
O STCC defende que todos os call centers deviam fechar portas e apostar no teletrabalho e também sublinha a necessidade do encerramento para desinfetar as instalações e reorganizar o espaço, garantindo a devida distância de segurança.
Desde 24 de março que o sindicato apela à greve dos trabalhadores como forma de pressionar os empregadores a optarem pelo teletrabalho, mas a adesão à greve não está contabilizada. “Sabemos que houve departamentos inteiros que aderiram à greve”, garante Danilo Moreira.
Existem mais de 400 call centers no País, que empregam ente 80 a 100 mil pessoas.