Até ao século XVIII, o litoral foi um local temido pela população, por ser associado a perigos e mistérios. Os que se aventuravam no mar eram vistos como heróis ou loucos. No entanto, a partir do final do século XVIII, deu-se o início da procura por estas áreas para fins terapêuticos, impulsionada pela família real e, posteriormente, pela aristocracia e pela burguesia. Só nos pós-25 de Abril, é que o usufruto destes locais se democratizou, abrangendo todos os estratos sociais.
O aumento da procura levou a um desenvolvimento desordenado nas áreas costeiras, que expôs a população a novos riscos. Atualmente, 45% da costa baixa arenosa de Portugal é afetada pela erosão.
A falta de sedimentos, retidos nas barragens, é um dos principais fatores que contribuem para este problema. O Rio Douro, por exemplo, transporta apenas 20% dos sedimentos que transportaria em condições naturais. A redução de sedimento na foz dos rios – e sem grandes cheias que os expulsem para a zona costeira – os areais começam a minguar.
Esposende, Espinho, Furadouro, Vagueira, Costa da Caparica, Alvor, Quarteira e Faro já não são uma novidade para nós em matéria de riscos costeiros, e não há dúvidas de que constituem um problema atual e complexo. Não há como negar que a subida do nível do mar, a erosão costeira, a derrocada de arribas e os galgamentos oceânicos são um problema real de Norte a Sul do país.
Quando pensamos nas próximas gerações, facilmente percebemos que viver com esta problemática será ainda mais desafiador. Segundo o 6º Relatório do IPCC, a subida do nível do mar continuará durante séculos, mesmo que o aquecimento global seja limitado a 2 °C. Em Portugal Continental, estima-se que este aumento seja na ordem dos 80 cm até ao final deste século, o que aumentará a vulnerabilidade das zonas costeiras, já sobrecarregadas pela pressão humana.
Para mitigar estes riscos, é essencial atuar sobre a vulnerabilidade natural ou sobre a ocupação humana. Embora não possamos controlar a “força da natureza”, podemos e devemos reduzir decisões que amplificam os riscos.
Em Portugal, o Plano de Ação Litoral XXI prevê intervenções na zona costeira, destinando 356 milhões de euros para a alimentação artificial de praias em risco. Em 2025, os custos destas intervenções na Costa da Caparica rondarão os 11 milhões de euros. Na Figueira da Foz, para o troço entre Cova Gala e Lavos, serão despendidos cerca de 27,7 milhões de euros. Nunca se tinha investido tanto em Portugal em alimentação artificial de praias.
Estas intervenções são essenciais para restaurar o equilíbrio natural nas zonas costeiras e a melhor aposta por serem as mais sustentáveis, com menos impactes ambientais e melhores resultados. No entanto, as ondas nunca pararão de transportar areia ao longo da costa, retirando daqui, repondo ali. Logo, teremos sempre de repetir as alimentações artificiais quando o seu fim de vida se aproximar.
Poderá chegar o dia em que deixaremos de poder viver em algumas das localidades costeiras que, por agora, ainda possuem níveis de risco aceitáveis. No entanto, é necessário antever as situações que podem vir a ser agravadas.
O presente atribui-nos o desafio de resolver um dos problemas estruturais que herdámos de desordenamento do litoral e o dever de o abordar com uma visão estratégica de longo termo, investindo no (re)ordenamento sustentável do território.
Além de sermos capazes de conceber e implementar com eficácia uma estratégia de gestão costeira, temos de sensibilizar mais uma população que ainda continua a ter comportamentos de risco. Ter uma sociedade consciente e envolvida na mitigação dos riscos costeiros é parte do caminho necessário para que não tenhamos de pagar o preço da nossa inação ou das más decisões.