A Inteligência Artificial (IA) é uma das principais tendências para 2025 e está a afirmar-se como uma ferramenta essencial para o crescimento do e-commerce. Num cenário global em que se estima que 2,9 mil milhões de consumidores adquiram bens online — representando 36% da população mundial — a IA desempenha um papel fundamental, contribuindo em cerca de 31 mil milhões de dólares (perto de 29,8 mil milhões de euros, 1,1%) para o crescimento total do sector em 2025, de acordo com dados da Statista.
Este impacto é explicado pela expansão do mercado global de IA, com estimativas a apontar para um valor de 244 mil milhões de dólares (234,5 mil miilhões de euros) em 2025 e podendo atingir uns impressionantes 827 mil milhões (795 mil milhões de euros) até 2030. Este facto faz com que as tecnologias de Inteligência Artificial sejam um tema incontornável para empresas de todos os sectores, em especial para o e-commerce.
Para Marcelo Caruana, Head de Marketing da E-goi — plataforma de automação de marketing omnichannel e inteligência artificial — estas conclusões não surpreendem: “A utilização de inteligência artificial em e-commerces é uma mais-valia, pois a tecnologia permite impulsionar a relação com os clientes, aumentar o número de vendas e optimizar processos.”
O estudo da Statista reforça esta posição ao indicar que mais de 50% dos e-commerces já adoptaram soluções baseadas em IA, sendo que 30% contam com uma integração total. Isto demonstra como a IA se está a tornar num factor de competitividade no sector.
Neste contexto, a E-goi demonstra o impacto positivo das soluções de IA nos e-commerces, com resultados de clientes que implementaram soluções nas suas lojas online:
A Salsa Jeans registou um aumento de 73% no ticket médio ao utilizar a ferramenta Send Time Optimization, uma funcionalidade que envia a mensagem para cada destinatário na melhor hora e no melhor dia.
Um retalhista de brinquedos na Península Ibérica obteve um aumento de 24% na taxa de conversão com campanhas baseadas em Next Best Offer (NBO), uma ferramenta de IA que analisa o comportamento do cliente para sugerir produtos/conteúdos relevantes, melhorando a experiência do utilizador.
Um e-commerce na América Latina registou um crescimento de 7% na taxa de cliques em campanhas personalizadas.
Estes casos exemplificam como a IA está a revolucionar o e-commerce, oferecendo ferramentas avançadas para optimizar vendas e o engagement do cliente, e evidenciam a importância de adoptar soluções de inteligência artificial.
A trajetória que o asteroide 2024 YR4 tem vindo a seguir apresenta 1,2% de probabilidade de poder vir a embater na Terra, segundo as estimativas preliminares da Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço dos EUA (NASA). Apesar de a percentagem parecer baixa, coloca o objeto no topo da lista de risco da NASA, com base nestes cálculos preliminares. A colisão pode vir a acontecer já dentro de sete anos, em 2032.
O 2024 YR4 foi detetado em dezembro do ano passado pelo ATLAS (Asteroid Terrestrial-impact Last Alert System) e estava a 829 mil quilómetros da Terra, afastando-se do nosso planeta. A trajetória calculada coloca-o a aproximar-se de novo em 2028. Os cálculos preliminares feitos pela NASA, que “podem facilmente estar imprecisos por um fator de poucos ou ocasionalmente de algumas dezenas”, mostram uma percentagem de 1,2% de uma colisão em 2032.
O asteroide mede 55 metros de largura e viaja a uma velocidade de 17,32 km por segundo. Os investigadores da NASA desenharam seis possíveis cenários de impacto, entre 2032 e 2074, com o de maior probabilidade a acontecer a 22 de dezembro de 2032.
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A equipa alerta que “muito provavelmente, novas observações telescópicas devem levar a uma reavaliação para Nível 0 ou Sem perigo”, mas atualmente o objeto está classificado como Nível 3 na escala de Torino, usada para medir o perigo que os asteroides representam.
De acordo com o Gizmodo, o impacto deste asteroide libertaria uma grande quantidade de energia (oito megatoneladas, mais de 500 vezes a que foi libertada pela bomba atómica de Hiroshima).
No passado, apenas o 99942 Apophis representou um risco maior, tendo sido classificado com o Nível 4, em 2004. Nesse caso, o nível de ameaça foi progressivamente sendo reduzido para zero, com os astrónomos a descartarem qualquer possibilidade de colisão nos próximos cem anos.
Com a possibilidade de as características como velocidade, magnitude e massa do asteroide a poderem mudar nos próximos tempos, os investigadores vão estar atentos e a realizar monitorizações continuas que levem a uma reavaliação do risco de colisão.
Um avião da companhia American Airlines que transportava 60 passageiros e quatro tripulantes colidiu na noite de quarta-feira com um helicóptero do exército, com três militares a bordo, durante a aterragem no aeroporto Ronald Reagan, perto de Washington. Os dois aparelhos despenharam-se no Rio Potomac.
Segundo o Washington Post, não foi encontrado, até agora, nenhum sobrevivente.
O acidente ocorreu por volta das 21:00 de quarta-feira, no horário local (02:00 de hoje em Lisboa).
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O avião regional proveniente de Wichita, no estado do Kansas, colidiu com um helicóptero militar, que realizava um voo de treino, durante a aproximação à pista do aeroporto, em Washington.
Segundo a Federação de Patinagem Artística dos Estados Unidos, a bordo do avião da American Airlines seguia um grupo de patinadores artísticos, os seus treinadores e familiares.
Não são ainda conhecidas ainda as causas da colisão, que ocorreu num dos espaços aéreos mais controlados e monitorizados do mundo, a pouco mais de cinco quilómetros a sul da Casa Branca e do Congresso norte-americano.
Foi com um anúncio no palco da Web Summit 2024 que Portugal ficou a saber que estava para nascer o primeiro Modelo de Linguagem em Grande Escala (LLM, na sigla em inglês) dedicado à língua de Camões. Nos meses seguintes, o projeto do AMÁLIA foi sendo revelado com mais detalhe, numa iniciativa que tem entre os seus grandes objetivos reforçar a soberania da língua portuguesa e preservar o património cultural, histórico, científico e literário do nosso país.
Mas Portugal não é o único país com ambições semelhantes. Um pouco por todo o mundo têm surgido vários projetos concebidos para criar LLMs focados em línguas específicas. As iniciativas, lançadas por Governos, organizações ou ainda comunidades de investigadores, refletem uma crescente preocupação em preservar identidades linguísticas e culturais num mundo dominado pelo inglês, mas também reduzir a dependência de soluções desenvolvidas por gigantes como a OpenAI, Google ou Anthropic.
Em entrevista à Exame Informática, António Branco, investigador do Departamento de Informática da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Ciências ULisboa), começa por explicar que há uma crescente tendência de intermediação tecnológica quando usamos linguagem natural.
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Hoje é possível recorrer a funcionalidades de inteligência artificial implementadas numa variedade de aplicações para, por exemplo, ajudar a escrever um texto ou a refinar as ideias nele expressas; transcrever ou resumir conversas gravadas. Esta é também uma intermediação que já acontece em casa, por exemplo, para quem tem equipamentos inteligentes que podem ser controlados por voz.
“O que está a acontecer na prática é que, em breve, nunca estaremos numa situação de utilizar linguagem natural sem que haja intermediação tecnológica”, afirma o investigador que coordena o laboratório NLX Ciências, que, em parceria com a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), desenvolveu o Albertina, o primeiro grande modelo de IA generativa para a língua portuguesa para as variantes de Portugal e do Brasil.
“O problema é que no estado atual da tecnologia, e para onde isto se orienta, esta intermediação tecnológica está, tendencialmente, a ser feita apenas por duas ou três Big Tech”, defende. “E aí é que entra a preocupação. Quer dizer que recorrer a uma necessidade tão básica e absolutamente corrente como é falar e usar uma linguagem passa-se pela dependência de entidades externas como sejam as Big Tech”.
Como explica o investigador, “os países estão cientes disso e percebem que precisam de criar alternativas” para “democratizar a IA generativa”, fornecendo “modelos Open Source a tantos atores quanto for possível como forma de mitigar essa excessiva dependência e essa excessiva concentração”.
A excessiva dependência de entidades externas é algo que “cria riscos e ameaças imensas à soberania cultural e linguística”, realça o investigador. Os modelos mais populares “são construídos a partir de dados do inglês e, obviamente, esses dados do inglês são escritos por pessoas que têm a cultura dos países onde se fala inglês”.
Em linha com António Branco, André Martins, vice-presidente de IA de Investigação na Unbabel e Professor no Técnico, explica em entrevista à Exame Informática que “os modelos da Anthropic, da OpenAI ou da Google são modelos que têm a cultura anglosaxónica muito central. Portanto, são treinados em dados da Web com uma grande predominância do inglês e não são suficientemente representativos de outras culturas”.
“Há aqui uma questão de soberania que é muito importante, sobretudo quando olhamos para os tempos atuais e vemos a dependência que a Europa tem nas tecnologias de inteligência artificial que são produzidas fora da Europa”, afirma. “É muito importante encontrar soluções europeias, que estejam integradas com a cultura europeia e com os valores europeus”.
É para dar resposta a essa necessidade que nasceu o EuroLLM, um modelo de linguagem de grande escala aberto e concebido especialmente para apoiar as línguas oficiais da União Europeia (UE) e cuja versão mais recente foi lançada em dezembro do ano passado.
Voz Europeia
Segundo André Martins, o EuroLLM afirma-se como “uma confluência de vários outros projetos europeus” em que a Unbabel está envolvida, com destaque para o UTTER (Unified Transcription and Translation for Extended Reality), onde participam também as Universidades de Edimburgo e de Amsterdão. Em Portugal, além da empresa liderada por Vasco Pedro, o projeto conta com a participação do Instituto de Comunicações (IT) e do Instituto Superior Técnico (IST).
No âmbito do projeto UTTER foi possível reunir esforços com outros projetos para aceder à infraestrutura europeia de computação de alto desempenho (Euro HPC, na designação em inglês). “Nós concorremos e, eventualmente, conseguimos uma alocação bastante grande, cerca de um milhão de horas em GPU” no MareNostrum 5, o supercomputador localizado em Barcelona que é uma iniciativa conjunta entre Espanha e Portugal.
“O processo começou a ser executado em meados de 2024. Na primeira fase do projeto nós treinámos o modelo com 1,7 mil milhões de parâmetros”, conta o investigador. A mais recente versão do EuroLLM foi treinada com nove mil milhões de parâmetros e, além das 24 línguas oficiais da UE, suporta também outras 11 línguas, “algumas europeias e outras fora da Europa”, num total de 35 idiomas.
“Não só lançámos o modelo como fizemos uma avaliação bastante extensiva em vários benchmarks”, detalha, acrescentando que a mesma permitiu concluir que o EuroLLM é “muito forte” e “bastante competitivo” com modelos de dimensões semelhantes da Google, Mistral e Meta, assim como de outras iniciativas europeias, “sobretudo quando olhamos para línguas que não são o inglês”.
“O foco do EuroLLM não é por si só criar modelos nacionais”, pois uma das grandes vantagens de ter várias línguas num só modelo é a transferência de conhecimento entre os vários idiomas. “Nós achamos que é um passo lógico interessante poder ser depois especializado por várias línguas”, permitindo, por exemplo, que o EuroLLM seja usado como base para um país que esteja a desenvolver o seu LLM nacional.
Nesse sentido, o facto de ser um modelo Open Source “é fundamental”, afirma André Martins, pois permite que qualquer pessoa interessada e com conhecimentos na matéria possa utilizar o LLM, adaptá-lo e partilhá-lo com outros. Ao remover a barreira no acesso e utilização, esta é uma abordagem que “contrasta, por exemplo, aquilo que a OpenAI, a Google e outras grandes empresas estão a fazer em que há uma tendência para se desenvolverem modelos em ambientes fechados”, realça o investigador.
Rumo ao futuro
“Estamos a treinar um modelo maior, que esperamos que venha a ser ainda melhor e que tenha ainda mais impacto, com 22 mil milhões de parâmetros”, conta André Martins. Mas ter uma versão ainda maior do EuroLLM não é o único objetivo de futuro para o projeto. Apostar na transição para a multimodalidade e explorar novas técnicas de treino estão também entre os planos em desenvolvimento.
“Neste momento estamos a avançar em várias direções ao mesmo tempo. Nós conseguimos outras alocações em outros supercomputadores, o que nos permite continuar a fazer experiências em várias direções”, afirma.
Tal como qualquer software, os LLMs precisam de ser constantemente atualizados para acompanhar a evolução tecnológica. Criar infraestruturas robustas que permitam assegurar a sua manutenção e evolução será crucial para garantir o sucesso das iniciativas focadas na soberania das línguas e culturas nacionais, defende António Branco. “Esta atualização e manutenção não pode ser feita ao sabor de investimentos ocasionais”, alerta o investigador.
À medida que a tecnologia de IA generativa avança, com os modelos de linguagem a tornarem-se mais complexos, ter uma base estratégica sólida é cada vez mais relevante. Olhando para Portugal em específico, se o país quer concretizar o sonho de ter o seu próprio LLM e, no futuro, posicionar-se como uma referência europeia e mundial neste campo será necessário ter “uma estruturação articulada no sentido de mobilizar e de promover a nível nacional, e de acordo com os interesses nacionais, a inteligência artificial”.
Este é um processo que está longe de ser simples e, tendo em conta que a Agenda Nacional de Inteligência Artificial ainda está em desenvolvimento, prevendo-se que seja apresentada no final do primeiro trimestre de 2025, após um processo de consulta pública, há ainda muito caminho a percorrer.
AMÁLIA no horizonte
De acordo com informação avançada pelo Governo, o AMÁLIA é uma iniciativa que será liderada pela Ministra da Juventude e Modernização e Ministro da Educação, Ciência e Inovação, tendo previsto um investimento de 5,5 milhões de euros – assegurado pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) – e um calendário de trabalho e desenvolvimento de 18 meses.
Por sua vez, a execução do projeto será liderada pela Agência para a Modernização Administrativa (AMA) e pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). O treino do LLM, com recurso a dados curados do Arquivo.pt e outras fontes nacionais, ficará a cargo de um consórcio liderado pelos centros de investigação NOVA LINCS da Universidade Nova de Lisboa, Instituto de Telecomunicações e Instituto Superior Técnico.
O projeto pretende também aproveitar sinergias de projetos e investimentos já realizados, entre os quais se contam, por exemplo, o EuroLLM e os modelos GlórIA e v-GlórIA; o projeto de curadoria dos dados do Arquivo.pt e os investimentos feitos nos supercomputadores Deucalion e Mare Nostrum 5.
Espera-se que a primeira versão Beta do AMÁLIA seja disponibilizada no primeiro trimestre de 2025, seguindo-se a versão base no terceiro trimestre do ano e uma versão multimodal até ao segundo trimestre de 2026. Estas versões serão disponibilizadas de forma gratuita e Open Source, indica o Governo, acrescentando que a informação usada para treino será disponibilizada em dados abertos.
Está em curso uma gigantesca operação de busca nas águas geladas do rio Potomac, em Washington DC, nos Estados Unidos, depois de um avião comercial com 60 passageiros e 4 membros da tripulação, e de um helicóptero com três militares terem colidido no ar, ontem à noite (já de madrugada em Portugal), junto ao Aeroporto Nacional Ronald Reagan.
O que se sabe é que o jato Bombardier CRJ700 de uma subsidiária da American Airlines, partira de Wichita, no Kansas, pela hora do jantar, e estava a fazer a aproximação ao aeroporto da capital norte-americana.
Quanto ao helicóptero Sikorsky H-60 (modelo conhecido como Black Hawk), estaria a fazer um voo de treino. Na rede social Twitter, conta-se que o piloto terá sido avisado pela torre de controlo da presença do avião comercial, tendo respondido que estava a vê-lo, a uma distância de segurança. Mas cinco segundos depois, os dois colidiram em pleno ar, mergulhando no escuro Potomac.
Pode exigir-se a um imigrante hindustânico, ou de qualquer outra parte da Ásia, acabado de aterrar em Portugal, que passe a comer bacalhau com grão, que celebre o Natal, que se ponha a cantarolar um fado ou que vá a uma tourada? E se não fizer, estará ele a desrespeitar a nossa cultura e o nosso modo de vida? Mas como, se há tantos portugueses de gema que querem acabar com as touradas, que detestam fado, que não ligam ao Natal ou que não suportam bacalhau?…
Quando Pedro Nuno Santos diz, numa entrevista ao Expresso, que os imigrantes devem respeitar a nossa cultura e o nosso modo de vida, quer dizer o quê? Que não devem cozinhar o kebab, que não devem cumprir o Ramadão, que deixem de celebrar o Ano Novo Chinês ou que têm de usar o biquíni, nas nossas praias?
Aonde nos leva este tipo de discurso?
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É verdade que não devemos tomar títulos gordos pelo contexto geral de uma entrevista. Lida esta, o líder do PS expõe, aparentemente, um conjunto de frases sensatas, ou, pelo menos, de “senso comum”, o que pode não querer dizer bem a mesma coisa… Evidentemente que o respeito pela nossa cultura e pelo nosso modo de vida significa apenas isto: respeitar estes valores é não quererem impor-nos outros. No entanto, esta postura exige reciprocidade: os portugueses também devem respeitar os valores dos que vêm de fora, como devia ter acrescentado o líder do PS. Integrá-los não significa aculturá-los, mas aceitar que pratiquem, entre nós, os seus costumes, desde que estes não violem a lei. Por seu turno, os imigrantes hindustânicos, ou outros, muçulmanos ou hindus, não podem manifestar-se ofendidos por verem as mulheres portuguesas de biquíni na praia; nem têm nada que criticar os nossos hábitos gastronómicos, como o da ingestão de carne de porco ou de vaca; nem devem insurgir-se contra a celebração do Natal. Onde está, então, a fronteira entre o que apenas deve ser respeitado e o que, mais do que isso, deve ser praticado? Já atrás o referimos: na lei. Pedro Nuno Santos faz, portanto, uma lamentável confusão entre o respeito pelo nosso modo de vida e o cumprimento da lei. Mesmo quando, com boas intenções, dá como exemplo o respeito pelos direitos das mulheres – talvez para que, com esta nuance dita “progressista”, não confundam o seu discurso com o da extrema-direita. O exemplo é infeliz, porém: um país com os altos índices de violência doméstica sobre as mulheres, incluindo o assassínio, por maridos, namorados ou companheiros, de dezenas delas por ano, não pode dizer que entre os seus “valores culturais” e o “seu modo de vida” esteja o respeito pelos direitos das mulheres. Mais uma vez, não é a cultura nem os costumes que os garantem, mas a lei portuguesa. Por exemplo, qualquer muçulmana é livre de usar o hijab ou mesmo uma burca: um Estado que não seja totalitário não deve interferir nem nas crenças religiosas nem nos gostos de vestuário. Mas o caso muda de figura se for o marido, o irmão ou o imã a exigir-lhe que se vista assim, cometendo, com isso, violência doméstica por coação. E nenhum preceito religioso pode justificar, por exemplo, a excisão feminina. Ponto.
O respeito recíproco pelos “valores culturais” ou pelos “modos de vida” significa apenas isto: live and let live. Uma verdade de La Palice que não precisa de ser vincada, por um político sénior, numa importante entrevista, exceto quando, por detrás da ênfase, se encontra uma intenção escondida. (Por exemplo, a de piscar o olho a um eleitorado que, mesmo que vote, tradicionalmente, à esquerda, começa a ficar contaminado pelas narrativas sobre imigração e segurança, uma agenda artificialmente imposta por determinadas forças políticas, e sem nada que o justifique). Veja-se, a propósito, o relatório desta semana sobre a criminalidade na cidade de Lisboa, que demonstra como ela desceu nos últimos anos, em especial, em 2024… De caminho, os jornalistas seguem essa agenda, fazendo do tema o principal assunto das entrevistas a políticos, fechando um círculo vicioso de onde é difícil escapar.
Apostaríamos que Pedro Nuno Santos já comprou, numa ou noutra ocasião, fantasias de Halloween para o seu filho de 7 anos. Provavelmente, nem por um momento lhe passou pela cabeça que a celebração do Halloween é uma importação cultural, imposta, sub-repticiamente, pelo soft power capitalista (aliás, tal como o São Valentim), em “desrespeito” – se quisermos caricaturar, claro! – pelos “nossos valores culturais” ou o “nosso modo de vida”. Como se constata, é tudo uma questão de… perceção.
Golpe de vista
Casos e casões
A demissão do secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Hernâni Dias, era o mínimo que se esperava de alguém que, além de investigado pela Procuradoria Europeia por um caso enquanto autarca, constituiu duas empresas do ramo imobiliário, já depois de ser governante, e quando tinha sob sua alçada política o diploma da nova e polémica lei dos solos e, portanto, informação privilegiada. Entetanto, a lei está aprovada, ele está fora do Governo e, portanto, fica livre para fazer os seus negócios. Tudo está bem quando acaba mal.
Um relatório provisório da Polícia de Segurança Pública, divulgado na terça-feira, mostra que a criminalidade geral em Lisboa diminuiu 12,6% em 2024. Numa década, foi o terceiro ano com menor número de crimes na capital portuguesa, estando apenas atrás dos dois anos da pandemia (2020 e 2021), quando fomos todos mandados para casa. Também a criminalidade violenta registou uma descida de 10,4%.
De facto, o crime do qual os lisboetas mais se queixam é o de burla informática. Não é, no entanto, chocante o suficiente para alimentar o País dos canais televisivos de notícias 24 sobre 24 horas. A forma como estes se têm multiplicado nos últimos anos causa espanto neste Portugal que nunca foi dado a leituras de jornal. Historicamente estivemos sempre na cauda da União Europeia a esse respeito.
Voltando ao crime. No início de janeiro, a Polícia Judiciária revelou que houve, em 2024 e para o total do País, 112 homicídios dolosos. É um número superior à média da década, que foi de 93,4, sendo que a década, lá está, inclui os anos de reclusão pandémica. É, por outro lado, um número inferior à média da década anterior (2004/2013), que rondava os 150 homicídios por ano. E antes disso, na viragem do século, tivemos anos tenebrosos, com a média a chegar aos 346,5.
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Entre os homicídios de 2024, houve ainda outro dado significativo: em 93% dos casos, o agressor conhecia a vítima. Eram familiares, vizinhos, homens que mataram as suas mulheres… A violência homicida aleatória, em caso de assaltos ou conflitos entre gangues, é residual.
Porque temos tanto medo, então?
“Em países com taxas de homicídio muito baixas, como em Portugal e de um modo geral na União Europeia, o sentimento de insegurança aparece mais associado à criminalidade de rua, furtos e roubos, e formas de incivilidades mais ou menos graves, ou de desacatos sociais, do que propriamente ao homicídio. Embora seja de referir que a divulgação repetida pelas televisões de cenas de crimes de homicídio, particularmente nos casos mais graves, possa aumentar a perceção de insegurança”, referiu Nelson Lourenço, presidente do Grupo de Reflexão sobre Estratégia e Segurança, ao Diário de Notícias, colocando o dedo na ferida.
A insegurança é televisionada, em loop, em casa, nos cafés, nas salas de espera dos consultórios. E no discurso político, obviamente, numa manipulação grosseira de um dos nossos instintos mais básicos.
O jogo do medo deixa-nos permeáveis ao discurso que se segue: o de que existe uma ameaça bem identificada, a imigração, fenómeno que, embora tenha tido um grande aumento nos últimos anos, não se vê refletido nos números do crime em Portugal porque simplesmente uma coisa não tem nada a ver com a outra.
Disse o diretor nacional da Polícia Judiciária, Luís Neves: “Há 120 pessoas de outros países que estão presas num universo de mais de dez mil.” Mais: “Temos hoje vários canais de televisão que passam uma e outra vez aquilo que é notícia de um crime, o que vem criar uma ideia de insegurança que não tem a ver com a insegurança plena do crime” realmente existente.
Audiências alimentadas pela sede do espetáculo e a toque do medo. E estes tempos perigosos, com a democracia assombrada pelos populismos, mereciam mais discernimento.
Pedro Nuno Santos quis dar uma entrevista sobre imigração. Fez bem. É um tema importante para um país que recebeu tanta gente em tão curto espaço de tempo. Todos os seus contornos têm de ser alvo de debate público, é uma realidade com que vamos ter de conviver como comunidade agora e no futuro. Uma alteração no nosso quadro social desta dimensão não pode ser ignorada. Não olhar para o fenómeno de frente é abrir espaço para preconceitos ou moralismos bacocos.
Esperava-se, portanto, uma análise cuidada e propostas sérias e fundamentadas. Talvez reforço do ensino do Português para os imigrantes e seus filhos, promover a vinda das famílias, formação específica para uma melhor integração, centros para encaminhamento profissional e mais umas quantas que, com certeza, os especialistas dos socialistas saberão.
Afinal, o líder do PS limitou-se a umas considerações pouco rigorosas sobre o passado recente, a enunciar pregões próprios de uma direita serôdia (para não dizer extremada) e a trocar o património político PS por um prato de lentilhas que nem oportunistas chegam a ser.
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Pouco importa lembrar o que o próprio disse em pleno Parlamento sobre o fim da manifestação de interesse ou que tenha mandado às malvas tudo o que defendeu como membro do governo e já líder da oposição. Mudou de ideias, nada mais legítimo.
Aguarda-se, já que não a disse, a proposta dos socialistas.
Convém recordar, ao contrário do que disse o governante dos últimos governos, que o instituto da manifestação de interesse não era nenhum decreto de escancaramento de portas nem tinha o tal efeito de chamada.
As pessoas teriam autorização de residência se cumprissem certos requisitos e mostrassem que tinham contrato de trabalho.
E não houve nenhum efeito de chamada, os imigrantes foram, sim, chamados. Foram as nossas empresas que precisavam de mão de obra para o crescimento económico que existiu e existe e que não a encontravam dentro das nossas fronteiras. Não foram chamados, mas ainda bem que vieram para trabalhar, para equilibrar a nossa Segurança Social e para nos equilibrar demograficamente e é fundamental que continuem a vir – agora pagamos com discursos xenófobos e velhacarias. Aliás, onde está o problema dessa suposta chamada se o nosso desemprego é residual e as empresas continuam a queixar-se de falta de gente para trabalhar?
Quem será o tonto que ainda acredita que um empresário que necessita de meia dúzia de empregados para a sua exploração agrícola ou para o seu restaurante se vai dirigir ao consulado do Paquistão para ver se alguém quer vir para Vila Real ou Portimão trabalhar? Mas será que ninguém conhece os nossos consulados e o que custaria prepará-los para este tipo de funções? E quanta mais burocracia os empresários têm de aguentar?
Pronto, aguardemos pela solução socialista. Esperemos que não parta de pressupostos como os que Pedro Nuno Santos utilizou para analisar a crise da habitação, culpando em larga medida a vinda dos imigrantes por ela. Alguém diga ao ex-ministro responsável pela pasta o que (não) tem sido a construção pública, a especulação, a burocracia para construir, a pressão da indústria turística e mais uns etcéteras.
O mais surpreendente da entrevista foi o espantoso discorrer sobre a nossa cultura e os nossos valores que os imigrantes têm de respeitar.
De que raio estaria Pedro Nuno a falar? Presumo que estivesse a falar de direitos e deveres. Espero que não estivesse a querer obrigar quem imigra para Portugal a gostar de futebol e não de cricket, que passe a apreciar cozido à portuguesa e desista da cachupa ou de caril ou que deixe de frequentar a mesquita ou a sinagoga.
No mesmo sentido, este português não partilha valores com o juiz que achava que as mulheres não deviam provocar o macho luso nas suas pastagens, com os inúmeros praticantes duma espécie de desporto nacional que é a violência contra as mulheres, nem com os padres praticantes de pedofilia. Será que não mereço a nacionalidade?
E sejamos justos, não creio que Pedro Nuno Santos também partilhe valores com a Rita Matias ou se sinta culturalmente próximo da irmã Lúcia.
Convém recordar que o respeito pelos direitos humanos e pelas mulheres é muitíssimo recente na História deste país. Lembremos apenas o que eram os direitos das mulheres até à reforma do Código Civil em 1977 (para não ir mais longe) ou o respeito pelos direitos humanos até 1974.
Nós, em democracia, resolvemos a questão de definir quais os valores fundamentais e o que para nós é inegociável e assim consagramo-los na nossa Constituição da República. Destaco um artigo: o 13º. É sempre importante ir lê-lo, mas avanço que fala de igualdade perante a lei e da impossibilidade de discriminação em função de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
Ouvi dizer que esta coisa de estar a pensar numa nova política de imigração e a conversa dos valores e da cultura eram um recentramento de Pedro Nuno Santos. Não me parece. É, sim, uma ignorância total sobre o que é viver em democracia, o que é a coexistência de pessoas numa comunidade e o valor da Constituição e da lei. Como sei que Pedro Nuno é um democrata, não posso dizer que é um fã de regimes autoritários, mas é nesses que se impõem formas de pensar, de agir e até de nos relacionarmos com entidades celestiais.
Insisto, não é recentramento nenhum, é só errado. Mas se formos por essas fórmulas gastas, é, sim, uma viragem para uma direita extremada, a das tradições conservadoras, a do fado, futebol e Fátima como espécie de modelo cultural. Aprecio muito os dois primeiros, bem como muita gente que não nasceu cá e mal fala a minha língua, como sei de muitos patrícios que odeiam bola e fado.
Pouco importa que ache que com este discurso fica mais bem-visto pelos autarcas socialistas ou que pense que com estas barbaridades pode roubar votos ao Chega ou a quem quer que seja. Não interessa. Tenha chegado a estas convicções agora, estivessem escondidas, seja apenas por mero oportunismo, não são com certeza próprias de um social-democrata, nem de um líder do Partido Socialista de Soares, Sampaio e Guterres.
Mais, se Montenegro, nesta área, tem amplificado as teses do Chega, Pedro Nuno legitima-as de uma forma que nem nos seus melhores sonhos Ventura podia esperar.
O líder do PS fez o verdadeiro toque de Midas ao contrário: não conquistou um único eleitor que se revê nas ideias de extrema-direita sobre imigração e perdeu muita gente que, apesar de todos os erros, ainda o achava um abrigo de decência. Sendo isso o menos, não deixa de ser obra.
Pedro Nuno Santos é o funcionário do mês do projeto Chega. No mês passado foi Montenegro, mas o líder do PS consegui suplantá-lo.
Ora muito bom dia. Não tenho lata para lhe recomendar que leia esta newsletter ao som do maior êxito de Alejandro Sanz, mas é assim que estou – a ouvi-lo em loop, enquanto escrevo.
E, não, não o faço para poder chegar aqui e confessar que um dos meus guilty pleasures é ouvir canções pirosas em espanhol. Quem me conhece sabe que então escolheria as burbujas de amor de Juan Luis Guerra, ainda melhores para ouvir numa repetição potencialmente infinda.
A culpa de eu estar a começar a última quinta-feira de janeiro a ouvir ¿Quién llenará de primaveras este enero /Y bajará la luna para que juguemos? /Dime, si tú te vas, dime cariño mío /¿Quién me va a curar el corazón partió? é do jornalista do El País Manuel Ansede, que antes de estudar Ciências de Comunicação para poder dedicar-se a escrever sobre temas de Ciência foi veterinário.
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[Esta graça de ele ter sido médico de animais é só um parêntesis na vida de um homem que provavelmente já sofreu um desgosto de amor e que de certeza sabe o que é a síndrome do coração partido, que a minha amiga Clara Soares já explicou tão bem na VISÃO.]
1 – “Nada une tão fortemente como o ódio – nem o amor, nem a amizade, nem a admiração.” A velha frase do escritor russo Anton Chekhov nunca esteve tão atual como nestes tempos de irracionalidade à solta em que vivemos. Tempos em que o ódio, alimentado pelo desvario das redes sociais e utilizado como combustível por políticos populistas, é usado até à exaustão para transformar qualquer debate num campo de batalha. Com as consequências que se conhecem: qualquer ataque mais violento ajuda sempre a cerrar fileiras de um lado e, em simultâneo, desencadeia uma resposta igualmente agressiva do adversário, numa espiral que rapidamente fica fora de controlo.
O ódio aos imigrantes é hoje o combustível que anima os partidos extremistas de direita um pouco por todo o mundo. E fizeram-no tão insistentemente e com base em tanta desinformação que, aos poucos, acabaram por conseguir torná-lo um tema central no debate político, na maior parte dos casos pelas piores razões, sem que existissem factos que o justificassem.
A realidade acaba, no entanto, por se sobrepor sempre às perceções. Dentro de poucos anos, Portugal vai entrar numa nova era de grandes obras públicas e, portanto, há uma pergunta que se impõe: alguém pensa que o novo Aeroporto Internacional de Lisboa vai ser construído dispensando a mão de obra imigrante? E a pergunta pode ser repetida também para a construção das novas linhas de alta velocidade Lisboa-Madrid e Lisboa-Porto-Vigo. Além da terceira travessia sobre o Tejo. Se outros motivos não existissem (e existem tantos!), só estes chegariam para demonstrar como a imigração deve ser analisada no âmbito de uma estratégia nacional, alicerçada nos valores do País e no seu desenvolvimento económico e social. Onde o ódio não pode entrar.
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2 – De tempos a tempos, a sustentabilidade da Segurança Social é posta em causa. Mesmo, como é o caso, quando o sistema até apresenta resultados animadores, graças ao quase pleno emprego e às contribuições da população imigrante. A demografia exige, no entanto, que se encare o futuro com cautelas. Até porque há uma espécie de bomba-relógio que não pode ser ignorada: estão a chegar agora à idade legal de reforma (atualmente nos 66 anos e sete meses) todos aqueles que nasceram no final da década de 1950 e no início da de 1960 – quando havia, de forma consistente, mais de 210 mil novos bebés por ano (hoje são cerca de 84 mil). Ou seja, como se começa já a assistir em muitas profissões, há setores onde vamos começar a assistir à saída de mais profissionais do mercado de trabalho do que aqueles que entram.
Qualquer discussão sobre a sustentabilidade da Segurança Social devia incluir, por isso, uma reflexão aprofundada sobre as estratégias de emprego, e não apenas sobre as contas públicas. Até porque há uma pergunta de resposta difícil: quantos licenciados em início de carreira serão necessários para pagar a reforma de um licenciado que se aposenta no topo da carreira? O problema das reformas, se calhar, é um dos vários em Portugal relacionados com os baixos salários.
3 – Uma pequena empresa chinesa, desconhecida da maioria dos mortais até há poucos dias, conseguiu, num ápice, abalar aquilo que parecia uma certeza inabalável: a de que os EUA eram líderes incontestados da Inteligência Artificial e que, por essa via, estavam prontos a dominar o mundo. O espetáculo dos líderes das empresas tecnológicas americanas, que são em simultâneo os homens mais ricos do mundo, na cerimónia de tomada de posse de Donald Trump foi visto, aliás, como a encenação perfeita para projetar essa imagem. Afinal, o êxito imediato da DeepSeek, que conseguiu melhores resultados do que as gigantes americanas com muito menos dinheiro envolvido, levanta agora uma outra hipótese sobre a união repentina de Musk, Bezos e Zuckerberg com Trump: a de que os EUA precisam mesmo de se unir para resistirem ao avanço da China, o país que, atualmente, forma mais engenheiros, técnicos e cientistas por ano. Mas fica também outra pergunta, em busca de resposta: o financiamento milionário das gigantes tecnológicas tem servido para desenvolver novas tecnologias ou apenas para deixar os mais ricos… ainda mais ricos?
4 – Escrevo esta página, como habitualmente à terça-feira, mas desta vez na véspera de um momento que pode ser decisivo para a VISÃO: a reunião da assembleia de credores que vai analisar o processo de insolvência da Trust in News, empresa proprietária da revista, cujas dificuldades financeiras se tornaram públicas ao longo do último ano. Não faço a mais pequena ideia do que poderá ser decidido nessa assembleia, cujo resultado já será conhecido quando esta edição chegar às mãos dos leitores. Sei, no entanto, que apesar desta inquietação, a VISÃO continua a merecer a confiança de milhares de leitores e a ser escrita, fotografada e paginada (em papel, no online e em várias extensões de marca) por uma redação que não vacila nos seus princípios de jornalismo rigoroso, atrativo e de qualidade. Foi essa confiança, manifestada de múltiplas formas, que nos animou nos tempos difíceis. E é essa confiança a única certeza que temos para o futuro – qualquer que seja.