Poupar energia não é apenas uma questão financeira, ainda que, para muitos, a diminuição da fatura energética seja um alívio ao final do mês. No entanto, não nos podemos esquecer também do impacto que a poupança energética tem a nível ambiental. Por isso mesmo, podemos dizer que a poupança de energia e a sustentabilidade andam sempre de mãos dadas.

Pensar nos consumos de energia é ainda mais importante no inverno, altura do ano em que sabemos que a necessidade de aquecer as casas leva a maiores consumos e, consequentemente, a maiores faturas. E basta olhar para alguns dados para perceber porquê. Por exemplo, a ADENE indica que cerca 69,5% das habitações avaliadas em Portugal têm uma classificação energética entre C e F, logo mais propícias a perder calor para o exterior neste período do ano. Um outro relatório recente, da Comissão Europeia, concluiu que Portugal registou, em 2023, a percentagem mais alta da UE em pobreza energética, com 20,8%. E os resultados dessa realidade ficam bem expressos no inquérito realizado pela Lisboa E-Nova (Agência de Energia e Ambiente de Lisboa) que revela que 63,2% dos inquiridos relatou sentir, por vezes, desconforto térmico dentro das suas habitações no inverno, o que é agravado pelo facto de mais de um quinto das pessoas (22,0%) dizer que não tem condições financeiras para manter a sua casa numa temperatura confortável nos meses de maior frio.

Para quem tem mais recursos, seja através de capitais próprios ou do recurso a crédito para obras, a solução ideal passa pelo isolamento térmico da habitação, o que se consegue através do isolamento de paredes e coberturas ou o investimento em janelas eficientes. Para este tipo de intervenções, o Fundo Ambiental tem desempenhado um papel fundamental porque permite recuperar parte do investimento feito, mas é importante que esse esforço se mantenha, com a abertura de novas calls que ajudem à missão de melhorar o perfil energético do parque habitacional português.

Uma opção mais económica e a que muitas pessoas recorrem são os aquecedores. Nesse caso, para controlar o consumo energético e o impacto financeiro e ambiental, é fundamental controlar o tempo em que o aquecedor está ligado, lembrando-se que o aparelho não perde imediatamente o calor, pelo que não se justifica tê-lo continuamente ligado.

Uma forma de balançar o maior consumo energético que se terá com o recurso ao aquecedor pode ser poupar eletricidade de outras formas. Por exemplo, trocando as lâmpadas tradicionais por lâmpadas de LED, uma opção bastante simples, mas que leva a uma redução rápida e eficaz do consumo energético, já que as lâmpadas LED consomem, em média, 8 vezes menos energia do que uma lâmpada de halogéneo para produzir a mesma quantidade de luz e duram mais tempo. Além disso, sempre que possível, devemos aproveitar a luz solar e nunca é demais recordar que, sempre que uma divisão não esteja a ser utilizada, é importante desligar a luz.

Uma outra dica que poderá fazer a diferença é desligar os aparelhos que estão em modo standby ou modo de espera, que acabam por gastar sempre alguma energia, mesmo sem estarem a ser utilizados. O melhor mesmo é ter extensões com interruptores, onde estejam ligados vários aparelhos, para que seja mais fácil desligar o que não está a ser usado. E claro, sempre que precisar de substituir um eletrodoméstico, ter em conta a classificação energética, o que terá um impacto no consumo de eletricidade desse equipamento.

A poupança energética não depende apenas de grandes investimentos ou de soluções sofisticadas. Todas as medidas enunciadas são um lembrete de que as nossas ações diárias e o conjunto de pequenos gestos podem fazer a diferença, tanto a nível financeiro como ambiental. Não se trata apenas de criar hábitos que também beneficiam o planeta, mas também de aliviar os encargos mensais.

Thea Kaplan-Lee and Teresa Lee landed in Lisbon at nightfall on the last Friday in January. They arrived tired, but relieved because they had a furnished apartment waiting for them, a bright sunny Saturday and, above all, a country in full democracy. The two Americans were leaving behind their lifelong friends and a beautiful gated community in San Diego, where California meets Mexico. Looking ahead, they hope to stay away from the influence of the new tenant of the White House.


“When Trump won in November, we thought: ‘Thank God we’ve already started the process of moving to Portugal’,” Thea recalled, still packing, on the phone. “There’s so much hatred that we don’t feel safe in the United States,” explained the former civil servant, who has worked in a veterans’ hospital for the past two decades. “I can hide the fact that I’m Jewish, but since Teresa is of Mexican origin and her father was Cantonese, she’s clearly a minority. And we’ve been together for 30 years and we’re married, but we’ve stopped introducing ourselves as a couple to strangers.”

Janet and Bill Morris
“We used to be proud to be Americans, now we’re not”

Now Janet, 66, and Bill, 67, confess to feeling embarrassed when they say where they’re from. They had planned to come for two years, but Trump’s election has turned the tide and they have bought a house in Tondelinha, near Viseu, where they will move later this month

A year and a half ago, around the same time that Donald Trump was confirmed as the Republican candidate for President, Thea and Teresa were first and foremost interested in finding out which was the safest country in the world for American expats. When Portugal appeared in sixth place, they decided to come and check it out for themselves and were so taken with the quality of life, the tranquillity and the friendliness of the people that they started to make the move.

Today, they say that politics would be the first reason to leave the United States and they believe that they are not the only ones who think so. “It’s not just the gay community or the Jews who are afraid,” Teresa stresses. “A lot of people are terrified of what comes out of Trump’s mouth. I pray that he doesn’t influence the rest of the world, because he’s really dangerous. And it’s scary to think that more than 77 million people voted for him.”

To speak of an exodus would be an exaggeration or premature, but the truth is that as soon as the first results pointing to Donald Trump’s victory over Kamala Harris became known, Americans started Googling “Move to Portugal”. And the peak happened just a few minutes after the winner’s speech, with searches being registered mainly in Oregon, Colorado and Washington, states where the map was filled with blue, the color of the Democratic Party.

After election night, HousingAnywhere, a medium-term rental platform in Europe, saw an increase of almost 400% in American users, with 66% focusing on Portugal, Spain and Italy. And by the end of that week, demand was not going to slow down, according to real estate consultancy Athena Advisers: between November 6 and 9, the terms “Portugal Property” and “Portugal Golden Visa” registered the highest number of searches in the United States in the last five years.

First part of the article published in VISÃO magazine. Available here in digital edition.

Foto: Lucília Monteiro

Ray and Gislaine McCall
“We already felt insecure”

The violence was happening closer and closer to home in Orlando. Hostility increased with the rise of Trump. And Ray and Gislaine, both 62, began to hear it said out loud that civil rights were unnecessary

Michael and Kelly Barrett
“Things have been insane”

With everything that’s been happening in recent weeks in the United States, Michael, 68, and Kelly, 64, guarantee that they have no regrets about their decision to soon swap their home in Mendocino, California, for a rented apartment in Porto

Foto: José Carlos Carvalho

Natasha Donets and Dean Stepánek
“We came looking for peace”

Natasha, 65, and Dean, 84, have nothing but good things to say about their neighborhood in Óbidos Lagoon. And they believe that the slower pace of society translates into greater kindness towards others

Glen and Amanda Sharp
“There is an element of fear”

The concept of a refugee is restrictive, remember Glen, 65, and Amanda, 57. But the two find many parallels between the Trump administration and the Nazi timeline and have the notion that a catastrophe could be on the way

Teresa Lee and Thea Kaplan-Lee
“There is so much hatred in the United States”

Initially, Teresa, 64, and Thea, 68, chose Portugal for its safety, quality of life, tranquility and friendly people. Having just arrived in Lisbon, they are grateful to have “escaped” Trump

Christopher Zimmerman
“I wanted to be here on April 25, 2024”

Christopher, 65, who moved with his wife to Setúbal almost ten months ago, calls himself “a recovering politician”. In the United States, he was a Democrat. In Portugal, he is still grateful for the solidarity

First part of the article published in VISÃO magazine. Available here in digital edition.

O Centro Ismaili de Portugal, na avenida Lusíadas, em Lisboa, começou a ser construído a 18 de dezembro de 1996 (e inauguraria em julho de 1998) com votos para que este lugar fosse mais do que um ponto de encontro dos ismailis portugueses. “Um testemunho duradouro do nosso compromisso com vista a um relacionamento longo e frutuoso com Portugal”, desejou então o príncipe Karim Aga Khan (Mawlana Hazar Imam, para os ismaelitas), descendente do profeta Maomé.

Só em Portugal estima-se que existam oito mil dos cerca de 15 milhões muçulmanos xiitas ismaelitas espalhados por mais de 25 países. São uma comunidade com elevado estatuto social e poder económico, com importantes ligações ao mundo dos negócios, como a família proprietária do Grupo Azinor, onde se incluem os hotéis Sana, ou os irmãos Sacoor, fundadores da multinacional de vestuário com o mesmo nome.

Os muçulmanos xiitas ismaelitas são uma duas principais correntes religiosas do Islão (a outra é o sunismo) e abrangem uma grande diversidade de culturas, línguas e nacionalidades. Regem-se por uma Constituição estabelecida em 1986 e retificada, em 1998, em Lisboa, a sede mundial da comunidade (desde 2015). E representam uma minoria religiosa que se distingue por ser a única a prestar devoção a um Imã vivo, que é designado de forma hereditária desde a morte do profeta Maomé.

O príncipe Karim Aga Khan IV personifica um imã “vivo, presente, manifesto e com descendência direta do profeta Mohamed (Maomé)”. Tomou posse em 1957, com 20 anos, e é o 49.º imã. Nasceu na Suíça, estudou em Inglaterra e tem residência oficial em Portugal. Usa o título de “Alteza Real”, que lhe foi atribuído pela rainha Isabel II quando morreu o seu avô, Aga Khan II

Na capital portuguesa, a comunidade está muito ligada a projetos de voluntariado, à semelhança do que acontece noutras geografias. O príncipe multimilionário fundou e preside à Rede Aga Khan para o Desenvolvimento, uma organização que apoia várias causas desde a educação, à exclusão social e à pobreza, em mais de 30 países, nomeadamente, em Portugal. País escolhido pelo príncipe para estabelecer a sua residência oficial e para celebrar o seu jubileu de diamante (60 anos à frente da comunidade).

O palácio Henrique de Mendonça, desenhado por Ventura Terra, distinguido com o Prémio Valmor e classificado como Imóvel de Interesse Público, é a casa da Fundação Aga Khan em Portugal

A Fundação Aga Khan é presença ativa no País desde 1983, emprega aqui cerca de cem pessoas e apoia projetos em várias áreas. Em 2017, doou meio milhão de euros para ajudar a reconstruir casas afetadas pelos incêndios de Pedrógão Grande. A Fundação foi reconhecida por decreto-lei, em 1996, por altura da construção do Centro Ismaili em Lisboa (18 mil metros quadrados projetado pelos arquitetos Raj Rewal e Frederico Valsassina com inspiração oriental, que incluem referências portuguesas, por exemplo, ao Mosteiro dos Jerónimos ou à Sala Árabe do Palácio Nacional de Sintra).

Origens

A comunidade ismaelita tem origem no século VIII, como uma ramificação dos xiitas, mas este termo já surgia no Livro de Génesis, na Bíblia, para se referir aos descendentes de Ismael, filho mais velho de Abraão. Começa por ser retratada enquanto minoria nómada e discriminada. Todavia, o cenário inverteu-se e os ismaelitas são hoje tidos como uma das comunidades com melhores condições de vida entre os muçulmanos.

O Centro Ismaili caracteriza-se não só por ser um espaço de oração para a comunidade, mas também, por ser ponto de encontro entre pessoas de diversos contextos sociais e culturais, promovendo desta forma a criação de pontes entre várias comunidades. Um lugar de partilha de conhecimento e desenvolvimento intelectual, celebrando valores como o pluralismo”

 Centro Ismaili em Lisboa

A representação mundial em Lisboa aconteceu graças a um acordo assinado a 3 de junho de 2015 – mais de uma década desde que outros países, como o Canadá, disputavam a atenção do príncipe, oferecendo benefícios fiscais e outras regalias em troca dos avultados investimentos da família. Portugal destacou-se, no entanto, por ter sido o primeiro Estado não muçulmano a assinar acordos com o Imamat (o Estado sem pátria dos xiitas): primeiro em 2005 e depois em 2009, reconhecendo-lhe um estatuto semelhante ao Vaticano.

(Artigo publicado originalmente a 28 de março de 2023, quando o centro foi alvo de um ataque)

1. Moedas e a segurança em Lisboa  Não acreditava, se só me contassem e se como toda a gente não o tivesse ouvido da boca do próprio. O que também significa ter uma consideração por ele (o “próprio”) que mais me fez ficar surpreendido, mesmo espantado, com a sua reação. Ele é Carlos Moedas. O caso é a divulgação pela polícia dos números que mostram ter diminuído a criminalidade, inclusive a violenta, em Lisboa. Diminuído a criminalidade, havendo mais imigrantes, como já tinha acentuado, numa esclarecedora e oportuna declaração, o diretor da Judiciária, Luís Neves.

Ora, a incompreensível reação de Moedas àquela boa notícia para a cidade de cuja Câmara é presidente foi pôr em dúvida, se não negar, tais números, sobrepondo-lhes a sua perceção em sentido contrário. Ou seja: contra os dados concretos, continuando a sustentar que a insegurança e a violência se agravaram – e mostrando-se quase zangado com tais bons números, embora dizendo que ficaria muito contente se eles fossem verdadeiros…

Em suma: o presidente da edilidade, em vez de sublinhar e valorizar esses números, para combater a equivocada perceção de insegurança – que só prejudica as pessoas e a imagem da cidade e contribui para a intranquilidade das pessoas –, fez exatamente o contrário!…

2. … e a Rua do Benformoso, que nem precisa de câmaras de vigilância  Tal, para mim surpreendente, conduta de Carlos Moedas vem no seguimento do seu apoio e aplauso à aparatosa operação policial que humilhantemente encostou à parede, durante uma hora a uma hora e meia, quem passava naquela rua, numa normal tarde de trabalho. O que, como aqui já salientei, só faz aumentar o sentimento de insegurança: se a presença de muita polícia, muito armada, a efetuar operações espetaculares, transmitisse ideia de segurança, não havia lugares tidos por mais seguros do que as favelas do Rio de Janeiro.

Mas há mais uma coisa extraordinária, que não vi referida. Se aquela Rua do Benformoso era tão perigosa, com um elevado índice de criminalidade, porque não tinha câmaras de vigilância? Não tinha, não tem, e muitíssimo mais significativo ainda: a Câmara de Lisboa ter um plano para instalar este ano mais 216 (216 repito) daquelas câmaras e dele não constar a Rua do Benformoso, pelo menos como prioritária. Prova evidente de existirem outros motivos para desencadear a operação num território sobretudo de residência e negócio de imigrantes asiáticos.

3. Pedro Nuno Santos: cambalhota?, radical? E sobre estas questões de segurança e emigração muito se disse a propósito de uma entrevista de Pedro Nuno Santos ao Expresso. Porque em matéria de emigração teria dado uma “cambalhota”. Não me parece: houve o reconhecimento do insucesso de medidas do anterior governo PS – e é sério, positivo, reconhecê-lo, exatamente por ser um governo do seu partido –, e houve um certa reorientação/ clarificação de rumo, que me parece ajustada. De resto, a entrevista mostra, confirmando as suas posições como líder do PS, é ser errada ou falsa a sua qualificação como “radical”. Qualificação muito conveniente para a direita, e que passou a ser quase um lugar-comum acriticamente repetido. Tê-lo-á sido antes, ou mesmo antes só alguém que em certas ocasiões deu umas bocas provocatórias? 

4. O título antes do texto  Tive de dar o título desta coluna, para o sumário da revista, ainda antes de a escrever… A minha ideia era salientar que muito mais importante do que os casos são as causas, e que se impõe sempre tentar apurar as causas dos casos… Acabei por seguir caminho diferente, fica para outra vez. E em matéria de casos da semana, telegraficamente três, entre muitos mais: a) o fim da comissão parlamentar sobre o tratamento às gémeas, um exemplo flagrantes de tempo e dinheiro mal gasto pelo Parlamento; b) ao fim de nove anos de óbvias infundadas suspeitas, a não acusação a Fernando Medina e Duarte Cordeiro, sendo este um dos melhores quadros do PS e que por causa delas abandonou a política, a que se espera regresse; c) o congresso da IL, um partido com elementos tão respeitáveis como Cotrim de Figueiredo, e agora, lamentavelmente, com os “afueras” e a motoserra de Milei.

À Margem

Os 90 anos de Ramalho Eanes

António Ramalho Eanes, o primeiro Presidente da República eleito em Portugal após uma tirania de quase meio século, fez 90 anos. É muito o que a democracia e o País lhe devem, embora ele sempre se tenha limitado – gosta de acentuar e passe o pleonasmo – a cumprir o seu dever. Por isso, creio que terá sido ele a recusar o que quer que fosse para, a propósito da data, o homenagear.

Como militar, toda a sua ação é exemplar, sem prejuízo de possíveis discordâncias sobre algumas escolhas enquanto CEMFA. Como político, a sua ação foi muito positiva, por vezes fundamental, sem prejuízo de erros que entendo ter cometido.

O seu legado, no conjunto, é sobretudo ético. Foi muitas vezes injustamente atacado, hoje é muito justa e maioritariamente reconhecido como a grande figura nacional.

Esta quinta-feira é o grande dia: Luís Marques Mendes, advogado, comentador político, ex-presidente do PSD, antigo governante, apresenta, em Fafe, sua terra natal, a candidatura às eleições presidenciais de janeiro de 2026. Conhecido, com notoriedade assegurada, o que faz Marques Mendes optar por uma tão grande antecipação? Em primeiro lugar, a liderança da agenda. Não nos esqueçamos de que, no próximo fim de semana, o PS vai reunir a Comissão Nacional, órgão máximo entre congressos, para se decidir pelo apoio a um candidato socialista. No momento em que escrevo, ainda não se sabe se avançará algum, antes dessa importante reunião. Em segundo lugar, Marques Mendes sabe que, a partir da primavera, o debate político estará dominado pelas eleições autárquicas, que se disputam no início do outono. Portanto, é conveniente aproveitar o momento de relativa acalmia política para ter o pleno das atenções mediáticas. Marques Mendes parte para a corrida depois de ter feito um percurso quase decalcado de Marcelo Rebelo de Sousa: tal como o professor, foi líder do PSD, sem chegar a ser primeiro-ministro. Tal como o mestre, cultivou um perfil moderado e conciliador. Tal como o modelo, manteve, pacientemente, alguns anos de exposição, em canal aberto, através de um programa de comentário político, igual ao do antigo espaço televisivo do atual PR, seja na forma – comentário da atualidade, revelação de algumas notícias em primeira mão e fecho com recomendações de livros –, seja no conteúdo: um estilo livre, aparentemente descomprometido, à primeira vista distanciado e isento, mas sem dispensar a necessária agenda de quem nunca fez outra coisa senão política partidária. Não se sabe se funcionará. Pelas sondagens, está difícil: depois de um ciclo de dez anos de um Presidente “doce”, o eleitorado muda para um Presidente austero, antes de, dez anos depois, voltar à “doçura” (Sampaio-Cavaco-Marcelo). Se o histórico contar, este não é o momento para um candidato com o perfil de “um Marcelo de marca branca”…

O elefante no centro das salas partidárias chama-se, porém, Henrique Gouveia e Melo. Para já, há que desmontar dois preconceitos: a condição de militar não constitui um capitis deminutio. Gouveia e Melo tem os mesmíssimos direitos cívicos de qualquer outro. E dizer-se que a Presidência da República está vedada a quem não tenha experiência política é uma posição… monárquica. Nas monarquias, normalmente hereditárias, é que a chefia do Estado está reservada a uma casta. O almirante não abre a boca. Nem precisa. Ele lidera todas as sondagens, contra qualquer possível adversário, seja à primeira, seja à segunda volta. E penetra profundamente no eleitorado de todos os partidos, em especial, nos do chamado Bloco Central. Neste momento, ele é o favorito. E há quatro razões para isso.

Primeira razão: não se lhe conhece um pensamento político. Ótimo. O eleitorado não quer saber de “pensamentos políticos”. E se quiser, é para isso mesmo que servem as pré-campanhas e as campanhas. Por uma vez, pode ser que esta sirva para alguma coisa – além de espetáculo e “folclore”. Segunda razão: os portugueses guardam dele uma imagem de competência, no cumprimento de uma missão dificílima – a da organização do programa de vacinação contra a Covid-19 – durante a qual terá contribuído para salvar milhares de vidas. Ora, num país onde o Estado funciona mal, isto não é pequena coisa. Terceira razão: é uma figura muito mais carismática do que a concorrência e paira acima dos partidos. E os portugueses habituaram-se a apreciar aqueles presidentes que, na sua prática, mais suprapartidários se revelam. Numa sociedade permeável ao populismo antipartidos, este é um argumento demolidor. Quarta razão (que deriva da terceira): grande parte do eleitorado acha que aquilo de que o País precisa é de “um homem a cavalo”. E este é o principal trunfo do almirante.

Dito isto: as sondagens, nesta fase, são puro entretenimento, com pouco valor informativo. O foco do eleitorado não está nem aí. E Gouveia e Melo ainda não começou a falar. Para ele, a fase mais fácil está a esgotar-se. Uma vez candidato, a reverência ao “senhor almirante” esfuma-se. Passa a ser um entre iguais. Será confrontado, escrutinado e contradito todos os dias. Em horas de televisão, Gouveia e Melo leva dez a zero da concorrência. Tanto pode dar uma volta triunfal ao País, como pode deitar tudo a perder quando reagir mal a uma atitude hostil. Ora, como na obra de Horace McCoy, popularizada, na grande tela, pela mão do mestre Sydney Pollack, “os cavalos também se abatem”.

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O turismo é a indústria mais depredadora e com maior impacto de sempre. Com esta afirmação não quero pôr em causa a mais importante e significativa atividade económica, social e cultural do nosso tempo.

É nesta altura do ano que a Europa (agências de viagens, operadores e turistas) corre às principais feiras onde o turismo para 2025 se vende e compra. A regra é só uma: o máximo (do que quer que seja) pelo mínimo (custo). Ninguém acredita que a atual bolha vai crescer infinitamente, como se nada fosse, sem rebentar como todas as outras; apesar disto, por cá, mantemo-nos eufóricos com os sucessivos recordes de número de turistas, dormidas, receitas, etc., como se não houvesse amanhã e este fosse igual.

A alma de Veneza perdeu-se, a cidade converteu-se num parque temático tipo Disneylândia onde chineses vendem a outros chineses, por um euro, máscaras venezianas fabricadas na China. Um exército de dezenas de milhões de turistas por ano torna a cidade dos sonhos românticos um inferno e os poucos venezianos que restam estão saturados e desiludidos. Os voos baratos e os cruzeiros levaram à extinção da cidade e as autoridades italianas não sabem o que fazer.

Por cá ainda estamos longe deste desolador cenário, mas vamos no “bom” caminho, Lisboa que o diga, onde todos os dias se ouve o grito: “Olhe, desculpe eu vivia aqui.” Na verdade, já se torna complicado passear nos caminhos da encantada Sintra. E o que nos fica? Muito pouco.

Por muito que custe admiti-lo, o turista vive apenas o imediato: o objetivo é viajar cada vez para mais longe em menos tempo com a intensidade máxima, cumprindo o “quanto mais, melhor”. Acresce ainda que, depois da viagem em low cost, o turista no destino exige e consome sem limites – “faz e leva o que quiseres desde que pagues”, o quanto basta para o nosso contentamento. Acresce ainda que turismo, além de persistir na sazonalidade, é profundamente assimétrico; enquanto os clássicos destinos estão saturados, o Portugal vazio permanece vazio à espera de alguns turistas. Esta é a perfeita indústria insustentável.

Enquanto nada se passa, a expectativa é a de continuar a crescer no mesmo contexto (como se nada se alterasse…) e bater os números do último ano. Ora, como em tantas outras matérias, enquanto é tempo, o País deve refletir estrategicamente sobre o turismo que quer; para todos os efeitos, qualquer coisa melhor do que o presente.

Apesar de alguma degradação ecológica, sempre negada pelo Ministério do Ambiente, e exagerada por ecologistas, Portugal goza de um conjunto de patrimónios únicos e de grande valor, positivamente distintivos quando comparados com a concorrência. Entre eles, destaca-se o património natural, que nos dá uma enorme riqueza, não quantificada e ignorada. Aqui, sim, está o nosso valor distintivo, pois temos uma geobiodiversidade única e há muito perdida na Europa.

Podemos e devemos estruturar produtos turísticos que abranjam franjas do mercado de alto valor e baixa pegada ecológica, exatamente o contrário do que hoje temos. Todos os nossos vizinhos, concorrentes, e também origem de grande parte dos nossos turistas, têm mais grandiosos castelos e palácios, igrejas e monumentos romanos, árabes ou gregos. Mas Natureza temos nós melhor.

No que respeita aos principais desafios, já os sabemos e lemos muitas vezes: combate à sazonalidade, valorização do património e da cultura, desconcentração da procura, qualificação e valorização dos recursos humanos, estímulo à inovação e ao empreendedorismo, e envolvimento da população e dos atores locais. Como não?  

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Palavras-chave:

Num país com uma profunda crise na Justiça, um gravíssimo problema de habitação, um Serviço Nacional de Saúde com problemas endémicos, com índices de desigualdade que por milagre não ameaçam a coesão social e com tantos problemas que ameaçam a confiança das pessoas na democracia, o Presidente da República anuncia que convocará o Conselho de Estado para debater os dados da insegurança. Sim, da insegurança. Não, não aquela que afeta os lares portugueses, aquela que mata sobretudo mulheres e crianças dentro de quatro paredes, aquela que transforma as casas em infernos.

Não, Marcelo Rebelo de Sousa chamará os seus conselheiros para debater um tema em que Portugal apresenta dos melhores resultados do mundo. Somos um dos países mais seguros do planeta e vamos ter os seus mais importantes senadores a discutir algo que não é um problema para a comunidade.

Podia-se discutir o estado da nossa memória coletiva. Esquecemos, por exemplo, o quão as nossas cidades estavam degradadas e como melhoraram tanto, esquecemos que havia partes das nossas duas mais populosas áreas metropolitanas onde pura e simplesmente não se podia ir. Em frente.

O Presidente da República é assim o mais recente colaborador de uma absurda mistificação, um peão de uma tática que pretende abalar a paz social, um cooperante de uma estratégia que tem como objetivo reforçar quem quer derrubar o regime.

Só quem viveu toda a sua vida fora de cafés ou caixas de comentários de jornais é que desconhece a conversa dos crimes horríveis que acontecem por todo o lado. A vizinha que tinha uma amiga da prima que tinha sido assaltada, a tia do senhor do quinto que tem um afilhado que é polícia e que sabe bem o que se passa…

Era um filão à espera de ser explorado comercialmente. E assim o Correio da Manhã, primeiro em papel e depois em formato televisivo, tratou de ganhar dinheiro a vender notícias de assaltos, violações, tráfico de droga e o mais que meta crime e violência. E quando não há que cheguem, repete-se a mesma história dias e dias.

É impossível que uma pessoa que consuma habitualmente aqueles produtos não pense que vivemos numa espécie de faroeste. E sabemos que é muita gente.

É um modelo testado por esse mundo fora e sempre com sucesso: nada como a desgraça alheia para nos distrair das nossas pouco interessantes vidas.

Com o advento das redes sociais, a capacidade de divulgação da conversa de tasca multiplicou-se exponencialmente. Basta abrir uma qualquer rede e é uma profusão gigantesca de descrições dos mais variados crimes e, sobretudo, muitos filmes, muita suposta realidade. A cargo, claro está, dos Venturas desta vida.

Era uma questão de tempo até que uma força política sem escrúpulos, sem valores e sem o mínimo sentido de Estado aproveitasse o ambiente criado e construísse um discurso em cima disto. E, claro, apareceu. Bem organizada e muitíssimo bem financiada, inunda as redes sociais com, lá está, filmes e mais filmes de crimes e um nunca acabar de declarações estrondosas sobre o ambiente de guerra civil instalado.

Claro está que o discurso é reproduzido nos média tradicionais e no púlpito da Assembleia da República. É em primeiro lugar aí que passa a credível.

Havia uma forma de combater esta narrativa: denunciá-la. Falar de factos, dizer a verdade, expor a mentira. Usar todos os meios do Estado para esclarecer as pessoas, fazer comunicações ao País em horário nobre a mostrar os factos e não a deitar gasolina na fogueira do medo. Repetir os números, mostrar a realidade das nossas cidades, mostrar que as perceções estão erradas.

São exatamente as pessoas que mais responsabilidades têm, que de mais meios e credibilidade dispõem, que melhor sabem que estão a propagar-se falsidades, que se demitem de o fazer. Pior, estão a legitimá-las e a amplificá-las.

Acabemos com a nojenta conversa das perceções. O que há é uma campanha que pretende convencer as pessoas de mentiras. E está a ter um sucesso retumbante. O que não é de estranhar quando conta com pessoas como o primeiro-ministro, os mais importantes presidentes de câmara e, agora, até o Presidente da República.

Talvez estes personagens não saibam que estão a fazer o jogo dos que irão dizer que têm uma solução musculada, esquecendo as leis e os direitos para acabar com a guerra que há nas nossas ruas; talvez achem que colaborar com aldrabices criminosas lhes vai trazer votos e, no fundo, acreditem que só estão a dizer mentiras piedosas; talvez não saibam que estão apenas a fazer com que os populistas ganhem cada vez mais peso eleitoral. Pouco importa, já são tão responsáveis pela propagação de uma mentira, por um cada vez maior clima de medo, por um aumento de tensão social como quem inventou esta conversa ou quem primeiro a cavalgou. 

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Palavras-chave:

Isto poderia ser enunciado de uma maneira filosófica, mas vamos deixá-lo para os mais encartados. A ideia da prevalência do interesse individual sobre interesses coletivos e, nomeadamente, a conceção de que o “eu” se sobrepõe de forma implacável ao “nós” – e a uma certa noção de “bem comum”, que até agora constituiu um chão comum, pelo menos nas ditas sociedades ocidentais do pós-guerra. 

Dos sistemas de saúde e de educação ao crescimento económico e à utilização da tecnologia nos tempos livres, há já algum tempo que este sentimento perpassa vários aspetos da – nossa? – vida pública. Os mais críticos dirão que falamos dos valores e princípios da social-democracia, os mais pragmáticos dirão que falamos do “grande centrão”. A perceção que tenho é de que, enquanto trocamos entre argumentos, não chegamos a lado nenhum. A nova ordem mundial não vem aí, ela já aí está. Ouve-se que Donald Trump continua imprevisível, mas não há grandes surpresas nesta guerra comercial: as políticas de protecionismo económico não só estavam no programa do Partido Republicano como foram amplamente anunciadas durante a campanha eleitoral.  

Imprevisíveis serão os resultados desta guerra a que até o Wall Street Journal já chamou “a guerra comercial mais idiota da História”. O Prémio Nobel da Economia Paul Krugman comentou, no Substack, que as tarifas ameaçam a fé global na América. “Mesmo que algumas das tarifas sejam temporárias, o Rubicão foi ultrapassado”, defende Krugman. “Sabemos agora que, quando os EUA assinam um acordo, de comércio ou de outra coisa qualquer, o Presidente vai olhá-lo apenas como uma mera sugestão, a ser ignorada sempre que lhe apetecer. Essa revelação, por si só, causará enormes danos a longo prazo.” Para o antigo professor do MIT e da Universidade de Princeton, a queda dos mercados financeiros da última segunda-feira, 3, pode antecipar uma queda mais acentuada: “Esta complacência do mercado é uma profecia autodestrutiva: a reação silenciosa do mercado propicia que Trump continue e expanda a sua guerra comercial.”

Não é preciso ser Nobel (vénia, vénia, senhor Krugman) para saber como esta atitude pode atrapalhar o crescimento. Um documento realizado para a Reserva Federal, citado pela The Economist, concluía que a incerteza da política comercial durante o primeiro mandato de Trump, então concentrada sobretudo na China, reduziu em, pelo menos, 1% o investimento nos EUA, só no ano de 2018. Não sabemos quando, mas as novas tarifas chegarão à União Europeia, “definitivamente”, avisou o Presidente norte-americano. Acrescentou também: “Eles não compram os nossos carros, não compram os nossos produtos agrícolas, não levam quase nada e nós compramos-lhes tudo.”

Apesar de a frase de Trump ser apenas uma parte da história da relação comercial entre os EUA e a União Europeia, não deixa de ser um facto. O que não significa que daí dependa o renascimento da indústria transformadora americana… No princípio da semana, António Costa convidou os líderes europeus para um “retiro estratégico” em Bruxelas, com o objetivo de discutir matérias relacionadas com defesa e segurança, mas acabou subjugado à agenda de Donald Trump. Sobre o aumento de despesa militar, a presidente da Comissão Europeia admitiu ser possível ajustá-lo às regras orçamentais. “Em tempos extraordinários, é possível ter medidas extraordinárias”, afirmou Ursula von der Leyen.

Não é só no domínio dos valores e dos princípios que o jogo de Trump, o novo-velho engenheiro do caos, é perigoso: na política do triste e orgulhosamente sós, os mais frágeis e os mais pobres serão sempre os primeiros a sofrer. Cinicamente, num mundo onde prevalece o “eu”, até poderia ser admissível perguntar: problema deles? Ou “nosso” também?

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Viva, bom-dia  
Pode dizer-se que o primeiro comício fê-lo Luís Marques Mendes, no último domingo, ao pôr fim a 12 anos de comentário político na SIC. Teve direito a ramo de flores e tudo. Hoje, ao final da tarde, ainda a tempo da edição das peças dos telejornais das 20 horas, o advogado fará a apresentação formal da sua candidatura a Belém. As sondagens não são animadoras, mas tudo parece estar alinhado, pelo menos, seguindo a velha fórmula de Emídio Rangel, antigo diretor da estação de Francisco Pinto Balsemão, de que uma televisão tanto pode vender um sabonete como um Presidente da República. Veremos se ainda consegue…

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