Quase 24 horas antes do prazo, deixando para trás pelo menos uma centena de cidadãos americanos, e ainda alguns milhares de afegãos que ajudaram, os EUA abandonaram Cabul pela calada da noite, duas semanas depois de o presidente Biden ter garantido, e jurado, que nunca sairiam sem retirar todos os cidadãos e aliados. A debandada militar americana foi, e é, uma vergonha sem desculpa nem perdão.
Mas fizeram pior, e Biden já se engasgou com o tema: os americanos, na vertigem da fuga, deram aos talibãs listas de nomes e moradas de americanos, e de afegãos, que queriam que chegassem ao aeroporto. Não há adjetivos para qualificar este procedimento. Em vez de uma Lista de Schindler, os EUA entregaram aos talibãs uma lista de execuções. A existência destas listas foi revelada inicialmente pelo general comandante do CENTCOM, com o objetivo de demonstrar que tudo estava a ser feito para não deixar ninguém para trás, e só quando as perguntas começaram, de todos os lados, é que perceberam a loucura do ato.
Quem não viu a cerimónia da chegada aos EUA dos corpos dos militares americanos mortos no aeroporto de Cabul? Solene, pesada, silenciosa e comovente. Eram, na sua maioria, jovens de 20 anos, marines, que foram salvar vidas. E quem não viu, também, Biden a olhar para o relógio, quando passou o último caixão? Estava com pressa? Tinha fome? Este gesto ficou na memória dos americanos, tal como o de George Bush (Pai), embora em circunstâncias sem nenhuma gravidade, quando olhou para o relógio num debate com Clinton. Perdeu as eleições, para não ter pressa.
Biden, e a sua Administração, em particular o secretário da Defesa, o de Estado, e a mais alta hierarquia militar, e de Segurança Nacional, precisam, de facto, de descansar. De sair. O peso nas suas consciências não vai abrandar, e a lista das execuções exigiria a destituição imediata de quem a mandou, de quem ordenou, e de quem aprovou. Esta desumanidade, este crime, é incomparavelmente mais grave, e de consequências futuras tenebrosas, do que o «impeachmant» de Trump, por causa da Ucrânia. Só não há destituição de Biden, e da cadeia de comando política e militar, porque o Congresso está nas mãos dos democratas. Mas daqui a um ano e pouco pode mudar. Deve mudar. Tem de mudar. Em nome dos equilíbrios e balanços de que tanto se orgulham os EUA.
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