A par dos discursos populistas que grassam um pouco por todo mundo e que têm como ponto comum posições mais ou menos musculadas anti-imigração, as narrativas mediáticas tendem a enfatizar a condição de “migrante” quando relatam crimes, criando uma falsa noção de insegurança relacionada com o fenómeno da mobilidade humana.
Este clima social teve como consequência a criminalização dos imigrantes de forma bem mais severa, criando-se um sistema de monitorização de fluxos migratórios onde se entrecruzam políticas de migração e justiça criminal.
Surge assim o conceito de Crimigração, referido em estudos académicos, que reflete uma realidade que tende a penalizar ainda mais as populações em movimento.
Especialmente vulneráveis, os jovens migrantes, sobretudo os não acompanhados ou indocumentados, são alvos fáceis para redes de crime, acabando por cair em situações de marginalidade enfrentando um risco acrescido de serem apanhados quer pelas autoridades migratórias quer pelo sistema de justiça criminal.
Além da situação já de si altamente frágil enfrentada por estes menores e jovens adultos num país estranho, a falta de medidas específicas de proteção e integração, empurram-nos para estruturas marginais, muitas vezes por força da necessidade única de sobrevivência num local que lhes é adverso.
O controle da imigração através de leis mais rigorosas e práticas policiais intensificadas com o uso quase indiscriminado do recurso à detenção como ferramenta de dissuasão para a migração irregular tem levado a que vários países europeus detenham, durante longos períodos, jovens em condições desadequadas
Na Europa, a questão da crimigração juvenil tem vindo a alimentar o debate e a preocupar as autoridades.
Em países como Alemanha, Itália e Grécia, principais pontos de entrada e destino da grande crise migratória de 2015, assistiu-se a um aumento significativo da criminalização de infrações de imigração, em parte por força da opinião pública acicatada por discursos políticos com agendas nacionalistas inflexíveis e que associam a entrada de imigrantes a um aumento da insegurança.
Se bem que os números desmintam esta ligação, o que assistimos em relação ao sentimento de insegurança é um pouco o que acontece com a sensação térmica. O termómetro pode marcar 20 graus Celsius e a sensação térmica ser de 30!
O controle da imigração através de leis mais rigorosas e práticas policiais intensificadas com o uso quase indiscriminado do recurso à detenção como ferramenta de dissuasão para a migração irregular tem levado a que vários países europeus detenham, durante longos períodos, jovens em condições desadequadas, não raramente em conjunto com adultos o que aumenta o risco de violência e abuso.
No caso dos jovens, o impacto destas medidas musculadas tem um efeito “boomerang” uma vez que aumenta o envolvimento em atividades criminosas e cria um ciclo vicioso de exclusão e criminalização.
O Novo Pacto Europeu para a Migração traz um alto risco de aumento da criminalização juvenil, pelo que a sua adopção e implementação terá sempre de ser acompanhada de medidas especificas de integração e acompanhamento por forma a romper o ciclo de criminalidade para a qual estes jovens são atirados.
Portugal não está à margem deste problema e, tal como muitos outros países europeus, enfrenta desafios relacionados à crimigração juvenil.
Porém, sobretudo nos últimos anos, a abordagem portuguesa tem sido relativamente progressista em comparação com outros países, focando-se mais na integração social e menos na criminalização dos jovens migrantes.
Os dados sobre criminalidade juvenil entre migrantes em Portugal são relativamente escassos e de difícil tratamento porquanto se encontram a maior parte das vezes agregados a estatísticas mais amplas de criminalidade juvenil.
No entanto, de acordo com o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) de 2023, há uma ligeira presença (5% ) de jovens migrantes envolvidos em atividades criminais, sobretudo em pequenos furtos e envolvimento em gangues juvenis.
As penas aplicadas a jovens migrantes que cometem crimes em Portugal variam dependendo da gravidade do crime e da idade do infrator, sempre em conformidade com o Estatuto do Menores que prevê medidas socioeducativas em vez de penas punitivas para menores de idade.
Naturalmente que, em casos excepcionais, como seja o envolvimento em crimes graves, como tráfico de drogas ou crimes violentos, jovens acima de 16 anos podem ser tratados pelo sistema de justiça penal como adultos independentemente da sua condição de nacionais ou estrangeiros.
Não obstante esta posição mais integradora que se tem vindo a refletir em políticas de inclusão especificas (recordo o Programa Escolhas que, não sendo direcionado exclusivamente a jovens imigrantes, integra-os como grupo altamente vulnerável), Portugal não está imune aos ventos musculados e segregadores europeus.
A recente decisão inserida no Novo Pacto Europeu, no que concerne à recolha de dados biométricos de crianças a partir dos seis anos de idade, obriga a uma política de proteção ainda maior da fragilidade que acompanha estes menores, estas crianças.
Como tal a aplicação e adopção desta norma europeia terá que ser feita de acordo com a matriz humanista e integradora que nos caracterizada como povo e que não tem cor nem credo partidário.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.