Técnica de comunicação básica: quando não souberes o que dizer ou o assunto for melindroso, anestesia a audiência.
A pandemia da Covid-19 foi a melhor anestesia que se poderia ter arranjado para não serem abordados assuntos de caráter mais polémico. Os boletins noticiosos, sobretudo telejornais, são 90% preenchidos pelos números, pelas declarações, desde as mais abalizadas às mais comuns, pelas imagens repetidas até à náusea e comentários de tantos especialistas na matéria que é incrível como não somos sede e lideramos a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Felizmente os Jogos Olímpicos vieram trazer alguma alternativa noticiosa, mas até essa começa a cansar.
Decididamente, não há como adormecer o recetor para que ele não se questione nem levante muitas ondas. Parece que o mundo todo parou, nada mais acontece.
E no entanto….
Porque é que as associações de apoio, que tanto bradam em relação ao trabalho que desenvolvem nesta área do acolhimento, não acolhem?
Por uma razão: é que estes não se encontram em campos de refugiados e, portanto, não vêm munidos dos subsídios com que alimentam grande parte das organizações ditas humanitárias!
No entanto, os conflitos não cessaram, as alterações climáticas, que chocam por serem aqui ao lado em países “ricos” (como se a Natureza se importasse com o PIB!), mas que já assolaram e deslocaram milhares de pessoas em locais onde as economias são tão frágeis quanto os barcos com que se arriscam a fugir.
A primeira de todas as razões para a mobilidade e para a fuga é a fome. E a fome grassa num mundo onde se gastam milhões por dez minutos no “espaço”.
Em pleno mar, a aguardar um porto que os receba, estão 800 migrantes. A noticia passa como faits divers, masse bem que se trate duma questão de vida ou morte.
Pouco interessa, neste preciso momento, se acolher não é pactuar com o tráfico que alimenta as máfias transnacionais. É-o, não tenhamos dúvidas. Mas essa discussão ultrapassa quem luta pela sobrevivência e terá que ser tratada diplomaticamente e de forma rápida com base na cooperação.
Há um velho adágio que diz que “em tempo de guerra não se limpam armas”. Este é um tempo de guerra para os homens, mulheres, crianças que aguardam que alguém diga: venham!
Creio que eram os Gato Fedorento quem dizia que “eles falam, falam e depois vai-se a ver e nada”. Tal e qual!
Há anos que se vem falando duma política migratória comum para a Europa.
No final da Presidência portuguesa, foi anunciada uma Agência Europeia de Asilo (aparentemente mudar-se-á o nome da EASO e está feito). E as decisões arrastam-se, arrastam-se…
O tempo dos gabinetes não é o mesmo que o tempo do desespero.
Por cada dia que passa, é um dia a menos na esperança dos que se encontram à deriva.
Portugal tem vindo a fazer grande notícia com o acolhimento de meia dúzia de refugiados. Portugal é um país com portos marítimos. Portugal necessita de imigração. Então porque carga de água não se “chega à frente” para acolher estas pessoas?
Porque é que as associações de apoio, que tanto bradam em relação ao trabalho que desenvolvem nesta área do acolhimento, não acolhem?
Por uma razão: é que estes não se encontram em campos de refugiados e, portanto, não vêm munidos dos subsídios com que alimentam grande parte das organizações ditas humanitárias!
Estão em terra/mar de ninguém, são descartáveis, nada aportam, não interessam.
E assim vão ficando a boiar à mercê das vagas um e outro dia. À fome, as intempéries, à sede à desesperança, ao medo.
A Europa devia afundar estes barcos. Sempre era mais honesto e humano do que ficar assim de braços cruzados à espera do inevitável.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.