Todos os meses, milhares de portugueses levantam-se cedo, planeiam os seus dias e confiam – ingenuamente – que o comboio vai passar. Mas em vez disso, enfrentam atrasos, greves e silêncios. E depois ainda se pergunta porque é que as pessoas desistem dos transportes públicos.
Entre 1 de janeiro e 12 de maio de 2025, o Portal da Queixa registou 118 reclamações dirigidas à CP. Aparentemente um número modesto, não fosse o pequeno detalhe de representar 45% de todas as queixas da categoria Comboios e Metropolitano. Isto num universo de 258 reclamações. Em bom português, a CP lidera. Mas é daquelas lideranças que ninguém quer: campeã na insatisfação dos seus passageiros.
Os dados falam por si. Maio, até ao dia 12, já soma 22 reclamações — o que equivale à maior média diária de queixas do ano: 1,8 por dia. Se a CP aplicasse essa média à velocidade dos seus comboios, talvez os passageiros tivessem algo positivo a relatar. Mas não. A realidade é outra.
Em vez de movimento, há paralisações. Em vez de progresso, há greves. E não estamos a falar de greves pontuais. Nos dias 7, 8 e 9 de maio, por exemplo, não houve sequer serviço mínimo em várias ligações. Em Rio de Mouro, como relatou uma utilizadora no Portal da Queixa, sair de casa tornou-se uma aventura digna de um prémio de resistência. O destino? Escola da filha e local de trabalho. A solução? Uber e Bolt. A conta? Paga do bolso de quem já tinha pago um passe anteriormente.
Em outro caso, um utilizador resume bem o sentimento de quem todos os meses paga para não ter serviço: “Quando pago os 40€ do passe, tenho direito a usufruir de um serviço por 30 dias. Se esse serviço não está a ser cumprido, é mais que razoável que seja reembolsado.”
Parece óbvio, não? Não para a CP. A política de reembolsos continua envolta em nebulosas burocracias e silêncios administrativos. Não há comboios, não há serviço, mas há faturas. Tudo muito “eficiente”.
A pergunta que se impõe é: até quando se tolera um serviço público que se comporta como se fosse um favor? A CP parece operar com um sentido de impunidade que envergonharia até empresas privadas menos escrupulosas. Quem paga é sempre o passageiro — com tempo perdido, salários descontados e qualidade de vida comprometida.
Estamos em 2025. A mobilidade sustentável está na boca do mundo, os elétricos multiplicam-se, e fala-se em descarbonizar tudo. Mas basta uma viagem de comboio para perceber que o futuro, para a CP, ainda vem a carvão. E vem atrasado.
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