Abram-se as garrafas de champanhe de vidro reutilizável, descasquem-se os camarões de pesca sustentável, comam-se as doze passas produzidas de forma biológica e rebentem-se toneladas de fogos de artifício. É hora de celebrar! Em 2024 falhámos o Acordo de Paris. Venha mais um ano de sucessos em 2025.
Não é inocente que o Acordo de Paris tenha definido o limite máximo “aceitável” de aquecimento global para 1,5ºC (relativamente ao período pré-industrial, 1850-1900). A partir de 1,5ºC, a crise climática inicia reações dificilmente reversíveis chamadas tipping points – reações que geram outras reações ainda piores, como por exemplo: incêndios florestais devastadores para as florestas que agravam as emissões de gases de efeito estufa, ou o degelo do permafrost (o solo congelado em regiões muito frias que retém enormíssimas quantidades de dióxido de carbono, prestes a serem libertados para a atmosfera).
O Acordo de Paris foi assinado por todos os Países que integraram a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2015 (COP’15). O seu insucesso é uma responsabilidade coletiva. Em 2024, pelo primeiro ano, a temperatura global superou o 1,5ºC de aquecimento global. E em 2025, a tendência é para continuar a subir.
A história não é nova, a primeira consequência prática do aquecimento global é o aumento de fenómenos climáticos extremos:
- Inundações dramáticas e chuvas cada vez mais imprevisíveis e intensas (Algés em 2022; 217 mortos em Valência, novembro de 2024);
- Seca severa (como a generalidade do País já enfrenta, com consequências graves para a agricultura e não só);
- Incêndios cada vez mais intensos (neste momento, em Los Angeles, já ardeu uma área superior à cidade de Lisboa);
- Aumento da regularidade de grandes tempestades, incluídos ciclones tropicais (com capacidade cada vez mais destrutiva).
E estes fenómenos, um pouco por todo o mundo, associados ao aumento do nível médio das águas do mar e ao colapso de ecossistemas com consequências para a agricultura, pecuária, caça e pesca, levam já milhões de pessoas a deixar as suas casas (22 milhões de refugiados climáticos em 2021, por exemplo).
A história não é nova. Em 2019, jovens de todo o mundo saíram às ruas numa Greve Climática Estudantil. Na altura, os jornais só falavam do clima e os governos desdobravam-se em propostas para estancar os efeitos devastadores do aquecimento global. Falava-se que 2030 era o ano, definido pelos cientistas, como o ponto de não retorno.
Hoje, passados 6 anos, a crise climática foi esquecida, afastada das bolhas mediáticas e da ordem do dia. O aquecimento global agravou-se. E a inação dos governos agravada, pela falta de checks and balances e do barulho que cabe a um povo fazer para exigir mais a quem nos governa. Os ativistas climáticos foram rotulados de radicais. E todos nós passámos a aceitar a crise climática como uma inevitabilidade com que devemos lidar.
Mas antes de abrirmos as garrafas de champanhe, lembremo-nos: A crise climática não é uma questão de sim ou não. Quanto mais a agravarmos, piores serão os seus efeitos. Portanto, mesmo para quem já a tem como inevitável, cabe-nos lutar para evitar as piores consequências. Ainda há muito que podemos, que temos de fazer. A pior consequência é baixarmos os braços, tornarmo-nos homicidas por cumplicidade ou negligência.
Mas nada disto é novo, não é? E neste momento, nos incêndios de Los Angeles, já são as mansões dos mais ricos que estão a arder. Quem é que precisa de sofrer para que cada um de nós acorde?
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