Tudo isto está claro e é muito claro, ainda que no dia-a-dia tenhamos nuances que nos deixam a pensar o porquê de num Estado plural o primeiro-ministro permitir que os trabalhadores que exercem funções públicas em serviços localizados em Lisboa tenham tolerância de ponto nos dias 3 e 4 de agosto, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude.
Poderá responder-me, tal como se lê no despacho governamental, que as JMJ serão o maior evento realizado em Portugal, “perspetivando-se um fluxo anormalmente elevado de pessoas”, que é necessário “mitigar os impactos deste afluxo no quotidiano e na mobilidade, especialmente no concelho de Lisboa”. Mas, será MESMO necessário fechar os serviços públicos nesses dias? Não poderá um cidadão que vive na capital tratar do seu Cartão de Cidadão enquanto outros acompanham/rezam com Sua Santidade? Não poderá um cidadão lisboeta, ou que está a passar uns dias em Lisboa aproveitar para tratar de uns assuntos pendentes numa entidade pública em vez de estar a acompanhar/rezar com Sua Santidade?
A resposta é: Não. Não pode!
Os funcionários públicos têm tolerância de ponto e, como tal, estão dispensados de comparência ao trabalho. O que irão fazer com essa tolerância só a eles diz respeito, mesmo que a opção inclua não ir ver o Papa.
Num país a várias velocidades, esta posição governamental deixa a nu os diferentes sinónimos que a palavra “igualdade” tem em Portugal.
É funcionário público em Lisboa? Ganhou dias extra de férias!
É funcionário público fora de Lisboa, mas quer acompanhar a vinda a Portugal do Papa? Agende dias de férias!
É esta a realidade num país onde as convocatórias para greves começam a ser “o pão nosso de cada dia” – são os médicos, os professores, o pessoal dos Aeroportos Manutenção e Aviação, entre tantos outros –, onde quem nos Governa continua a assobiar para o lado e a mostrar que aprendeu muito pouco com a pandemia, falo do teletrabalho.
É caso para dizer que o Porto trabalha, Coimbra estuda, Faro recebe, Braga reza e Lisboa…diverte-se – perdão! Reza.
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