Como em crises desta dimensão os textos perdem atualidade imediatamente a seguir a serem escritos, a minha vontade era escrever sobre os cenários para as eleições de 10 de março. Comparar, porém, a importância desse ato eleitoral à situação que vivemos é quase absurdo. Mais, por incrível que possa parecer, o discurso que os partidos farão e, sobretudo, a interferência do poder judicial terão mais importância do que o resultado eleitoral. Neste momento, o que está em causa é a nossa democracia – nem mais nem menos.
Uma democracia não sobrevive quando os principais servidores são corruptos, prevaricadores e traficam influências em proveito próprio ou de terceiros – melhor, chega que exista essa perceção. Neste caso, a presunção de inocência e todos os outros direitos são apenas truques para que não se mandem os políticos e os poderosos para as galés; as eventuais absolvições só provarão que a corrupção chegou aos juízes. A democracia também se faz com a opinião pública, mesmo que essa opinião seja contra a própria democracia. A democracia também não sobrevive quando a Justiça deixa de funcionar – aliás, basta que deixe de saber o lugar que ocupa no edifício constitucional ou que deixe de compreender o funcionamento das outras instituições.