Voltou a acontecer o festival showcase MENT que há já alguns anos nos tem vindo a acordar do logo janeiro de inverno (que aqui na Eslovénia é especialmente longo) para uma multiplicidade de concertos, palestras e eventos relacionados com a música alternativa para todos os gostos, da eletrónica ao punk. O festival MENT deslumbrou quem viu e ouviu: uma montra singular que todos os anos diverge do mainstream, revelando os novos talentos desta geração. A edição deste ano do festival contou com a impactante presença do português Scúru Fitchádu, e da dupla Nuno Saraiva e João Santos a partilhar a experiência da música Indie portuguesa. Escusado será dizer que quem aqui vem, não vai para casa de mãos a abanar – o MENT é contagiante e cria em nós a vontade de continuar a descobrir novas realidades musicais.
Desde as conferências relacionadas com as editoras e com grandes agentes da música do futuro (como o Spotify ou o Bandcamp) que, como Chris Eckman da Glitterbeat Records, sediada na Eslovénia, acredita em contar a história de artistas e culturas diferentes, novos artistas de vários países. Estes bons momentos incluem histórias dos artistas contadas em primeira pessoa por Rob Challice da Paradigm Agency, UK, agente de Billy Bragg, Bon Iver, Briston Maroney e Calexico (entre muitos outros), cujo tema principal pautou pela discussão da sustentabilidade de continuar a fazer álbuns e tours de promoção nesta new-age digital e em consideração pelo planeta. Nesta nota, até o famoso Metal Fest esloveno vai passar a ser Green, a contribuir para uma consciencialização ambiental comum.
Esta narrativa inclui o projeto português de fusão entre o rock alternativo e o funaná – Scúru Fitchádu (ou escuro denso) – que marcaram pela diferença tão necessária nesta época em que o pop lamechas é regra comum. Estivemos com Marcus Veiga antes do concerto que nos contou que veio de um mundo de rock muito politizado com tanto por falar que nunca poderia ter uma música, por exemplo, sobre namoradas. Fala também da crítica à inércia e à preguiça mental, e muitas vezes até criticando-se a si próprio. O novo álbum que apresentou em Ljubljana tem assuntos mais claros e diretos, que talvez não fossem compreendidos (sendo em Crioulo e muitas vezes acerca de temas nacionais) mas foram de certeza sentidos pelo público que aliás encheu a sala de espetáculos. O Funaná e o ferro & faca foram pontos altos da noite que os eslovenos não tinham antes presenciado, e com um ritmo contagiante não deixaram ninguém inerte. A entrevista completa será em breve publicada em www.e-sardinha.eu.
Ventos de leste, de origem russa e bielorussa, têm vindo a trazer do melhor que se faz por lá desde há algumas edições do festival. Este ano tivemos o prazer de estar com o músico Stadt (ШТАДТ), que nos visitou de Moscovo e trouxe consigo um som entre o EBM e o post rock com tons dos saudosos Joy Division, como se estes tivessem trocado Manchester por Moscovo. Garantiram-nos que a vida de um artista na capital russa tem muitas possibilidades, muito mais do que se vai publicando na imprensa ocidental. O autor único deste projeto, um músico de 22 anos com uma abordagem à vida bastante filosófica, veio de Donetsk para se estabelecer em Moscovo que é a sua principal inspiração. Distanciam-se da música industrial russa que consideram simples e um pouco apalermada. A imponente presença em palco, envergando um fato de macaco industrial dizendo nas costas “crash test yourself”, e confrontando o IBM industrial do sintetizador com um bombo tocado quase como um saco de pancada. Uma estreia em palcos europeus que não será esquecida.
O festival contou ainda com o workshop Europe in Synch, um projeto de ação preparatória da Music Moves Europe que promove o desenvolvimento de jovens músicos envolvidos ativamente no licenciamento de sincronização, promovendo o uso da música europeia no cinema e na publicidade dado por dois portugueses: João Santos e Nuno Saraiva da Lisbon Music Supervision. Na última edição tínhamos já estado à conversa com o Nuno acerca das iniciativas similares que se promovem em Portugal e da vontade de trazer cá mais música independente portuguesa. Embora pequena a Comunidade Portuguesa, a apreciação da música e cultura Lusa é cada vez maior pelo público esloveno e vai-se abrindo a oportunidade para uma maior presença de artistas portugueses de todos os estilos musicais (para além do Fado e do Jazz que estão já bastante bem representados na programação cultural).
Para a história ficam a atuação de abertura de Dakh daughters, um grupo da Ucrânia com 6 elementos multitalentosos, dedicados ao espetáculo meio circense, meio burlesque em que cada uma toca, canta e dança um sem fim de ritmos e tons que criam uma incrível harmonia com o público a reagir com emoção. Ficaram também na memória os maravilhosos concertos no castelo de Ljubljana que enche as medidas de qualquer um e, simultaneamente, traz uma nova vida a este importante espaço de encontro da capital eslovena.
Este artigo foi escrito com a colaboração de Pedro Resende.