É como o tempo, anda tudo trocado. Nas legislativas discutimos presidenciais; agora que devíamos ter os olhos postos no futuro inquilino de Belém continuamos a fazer contas sobre quem vai formar Governo. Quem casa com quem, quem consegue uma união de facto, que validade podem ter acordos, pactos ou simples apertos de mão. Mas tranquilizemo-nos, o Presidente ainda em funções tem tudo previsto, todos os cenários estão acautelados.
Confiemos, então, e passemos a olhar para as presidenciais. E repare-se na circunstância, provavelmente inédita nos últimos anos nas democracias europeias, de os candidatos mais populares das áreas políticas dos dois principais partidos não serem do agrado dos respetivos líderes. Nem Passos Coelho quereria Marcelo Rebelo de Sousa nem António Costa gostaria de ter como Presidente da República a Maria de Belém que não quis para presidente do PS. É verdade que ambos perderam as eleições (ou será que as ganharam?), mas não era expectável que tivessem tão pouca influência na sociedade.
Vale a pena dar um salto atrás, até fevereiro de 2014, ao XXXV congresso do PSD. Disse então Passos Coelho que o futuro Presidente não pode ser “um protagonista catalisador de qualquer conjunto de contrapoderes ou um catavento de opiniões erráticas em função da mera mediatização gerada em torno do fenómeno político”. Não deve “buscar a popularidade fácil”. Obviamente estava a recusar Marcelo Rebelo de Sousa. Toda a gente assim o entendeu. Uns diziam que a sua opção seria Rui Rio, outros que o eleito era Durão Barroso. Mas a verdade é que nem um nem outro estão na corrida e Marcelo (se não fosse tão tu cá tu lá com o povo seria tratado pelos apelidos) veste na perfeição o fato de que Passos não gosta.
Abril deste ano. Sampaio da Nóvoa apresenta a sua candidatura no Teatro da Trindade. Mário Soares e Jorge Sampaio estão na assistência. Ninguém vê António Costa, mas sente-se a sua presença na sala. Estão lá Jorge Lacão, Gabriela Canavilhas e Duarte Cordeiro (o vereador que seria diretor de campanha de Costa). Há mesmo quem diga que o secretário-geral socialista mostrou interesse em que Jorge Sampaio se associasse à cerimónia. Dias depois, Santos Silva apareceu no Porto ao lado de Nóvoa e João Torres, o líder da JS, dizia ao Sol que ia “sugerir que a JS possa convidar Sampaio da Nóvoa para momentos políticos relevantes e participar em iniciativas da JS”. Explicava que, por falta de decisão oficial, a campanha de Nóvoa não será feita “diretamente” pelo PS ou JS, “mas é desejável e possível que ambas se possam empenhar”. Há dúvidas sobre o apoio dissimulado?
Chegados ao outono, que vemos nós? Que PSD, mesmo sem ter outro candidato da sua área, não irá aparecer na primeira volta das presidenciais e que o PS vai estar de mãos nos bolsos e a assobiar para o lado enquanto os seus militantes se dividem por duas – ou mais – candidaturas, uma das quais (por sinal a menos popular) até reuniu o apoio dos dois ex-presidentes socialistas.
Passos e Costa vão ficar em casa amuados e as campanhas deverão ser do mais triste que se possa esperar, pois sem as máquinas partidárias no terreno, a menos que mudem de opinião, tudo será muito mais discreto. Caricato? Nada disso. É a política à portuguesa, onde imperam os compromissos e falta a frontalidade e coragem. Tivessem Passos e Costa (nota: não são como Marcelo, não são tratados por Pedro e António) assumido que tinham preferências e não estariam sob a ameaça de terem de conviver com quem não querem. Ambos sonham com S. Bento, mas nenhum ficará feliz
(se as sondagens andam certas) quando for recebido pelo futuro Presidente.