Um dos grandes equívocos na interpretação das teorias da evolução de Darwin é a ideia de que a competição é a força vital da evolução e da sobrevivência das espécies. Na verdade, a biologia mostra-nos que a cooperação entre os seres vivos é uma dimensão que, muitas vezes, é mais relevante para a sobrevivência das espécies do que a competição. E, se nos focarmos na espécie humana, isso é particularmente evidente. Aliás, o Homo Sapiens Sapiens só se tornou o animal dominante no planeta por causa da sua especial propensão à cooperação (trabalho em equipa e ajuda aos mais fracos) em comparação com outros primatas.
No âmbito social e económico, há quem tenha feito a tresleitura de Darwin e dito que a economia de mercado é especialmente boa para a humanidade por causa da competição inerente, que gera progressos materiais continuados.
Na verdade, não só a economia de mercado é também uma forma de cooperação global entre estranhos, como os seus resultados só serão positivos (só contribuirão para a felicidade sustentada dos povos) se for enquadrada por mecanismos de solidariedade forçada (como o pagamento de impostos que efetuem a redistribuição de rendimento, riqueza e oportunidades) e por entidades que produzam bens e serviços fora da lógica dos mercados e dos preços, nomeadamente pensando no longo prazo e nos problemas sociais.
Em Economia, aliás, quando se utiliza a Teoria dos Jogos a certos problemas, esta dimensão da importância da existência de instituições que forcem a cooperação e a solidariedade fica evidente, uma vez que os equilíbrios que são obtidos quando as pessoas interagem apenas visando os seus interesses produzem menos bem-estar do que os que são obtidos quando a cooperação é institucionalizada.
Nos tempos primitivos das pequenas coletividades humanas, a cooperação era facilitada pela proximidade, conhecimento mútuo e possibilidade de punição dos não cooperantes. Nas actuais sociedade complexas de relações entre desconhecidos, precisamos de instituições fortes que preservem a cooperação. Não fossem os mecanismos obrigatórios de solidariedade intergeracional, intertemporal, inter-regional e interclassista (que redistribuem dos que têm mais para os que têm menos) e nunca teríamos conseguido prosperar tanto enquanto espécie, nunca atingiríamos a população mundial actual, nunca conseguiríamos viver tantos anos, nem aumentar a felicidade global como temos conseguido.
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