Uma das frases que muitos economistas mais gostam de usar é “não há almoços grátis!”. Alguns usam-na, até, com uma certa sobranceria/paternalismo, no sentido de mostrar aos outros, não economistas, que há sempre um custo, mesmo que escondido, nas decisões que se tomam, pelo que não podemos, nomeadamente em termos políticos, prometer “amanhãs que cantam”, pois há sempre um reverso da medalha.
Mais, na economia, alude-se muito às noções de escassez de recursos e de trade-off, advogando-se o império da racionalidade para se efetuarem as melhores escolhas nesse contexto de restrições e compromissos.
Assim, será muito fácil ouvirmos um economista a dizer que um serviço fornecido pelo Estado sem custos para o utilizador é um logro, na medida em que esse serviço tem um custo (que até pode ser muito elevado) que tem que ser financiado pelos impostos. Lá está, nada é grátis.
Porém, quando se muda a discussão para o aquecimento global do planeta, e as consequentes alterações climáticas, muitos economistas agarram-se à sua fé inabalável na inovação tecnológica e na eficiência dos mercados para dizerem que “não passa nada”, tudo a inovação e o capitalismo resolverão.
Sucede que o aquecimento global mais não é do que um exemplo perfeito da inexistência de almoços grátis. Em concreto, a Revolução Industrial e o capitalismo geraram um crescimento exponencial da produção de bens e serviços em 250 anos, sem precedente na história da humanidade. Porém, esse crescimento só foi possível através de uma estratégia extrativista dos combustíveis fósseis, e outros recursos naturais que, agora, nos mostra os seus limites.
Quando se começou a maquinizar a produção usando carvão como combustível não se sabia que as partículas de C02 libertadas iriam “entupir” a atmosfera e causar um efeito estufa. O mesmo para a utilização do petróleo ou do gás natural. Hoje, é um facto irrefutável. Isso significa que não podemos mais continuar a mesma estratégia económica como se esse efeito colateral não existisse. Significa, então, que temos que olhar para a nossa forma de viver e prosperar na Terra condicionada pelo facto de que a utilização de combustíveis fósseis já atingiu um tal nível de dano que não podemos continuar nesse caminho. Teremos que encontrar tecnologias que nos permitam gerar, a partir de novas fontes, os níveis de trabalho energético a que estamos habituados, para podermos levar uma vida cada vez mais longa e feliz. Porém, essas tecnologias demoram a surgir, e temos que gerir o curto prazo. E é aí que entra a tecnologia social e a urgência redistributiva à escala mundial. Temos de mudar a estratégia, do “crescemos todos muito para tirar os pobres da miséria”, para “fazer chegar aos pobres a energia necessária para os tirar da miséria, eliminando consumos e investimentos espúrios, conspícuos e de alta pegada ecológica onde a abundância já existe”.
Verdadeiramente, descobrimos que aquilo que parecia grátis, um modelo económico extrativista baseado em combustíveis fósseis e na ideia de crescimento infinito, afinal, tem um custo elevadíssimo, que eliminará a vida humana na terra se não encontrarmos alternativas. Enquanto as novas tecnologias sustentáveis não forem capazes de gerar o mesmo nível de trabalho (a partir da energia) a que estamos habituados, teremos que enfrentar um tempo de relativa escassez energética. Como repartir os custos dessa escassez é uma questão política.
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