Será que um coração pode mesmo partir-se? A ciência diz que sim.
A patologia chama-se Takotsubo Cardiomiopatia, também conhecida pela Síndrome do Coração Partido, assim definida há cerca de 30 anos por investigadores japoneses. O coração deixa de bombear de forma eficaz, fruto de uma contração anormal do ventrículo esquerdo. Quando tal acontece, o paciente apresenta os mesmos sintomas de um ataque de coração: dores no peito e dificuldades respiratórias. Em casos raros pode provocar a morte. A contração anormal do ventrículo esquerdo faz com que a sua forma original se altere, parecendo-se com uma armadilha para polvos usada no Japão cujo nome é Tako-Tsubo.
Embora os sintomas sejam os mesmos, a origem do acidente diverge. Em caso de ataque de coração, existe o bloqueio de uma das artérias coronárias que irrigam o coração. No caso da Takotsubo Cardiomiopatia, é o ventrículo esquerdo que fraqueja, literalmente envenenado pela hormona do stress, a maldita adrenalina. Na maior parte dos casos, existe um quadro de profundo stress físico e psicológico que antecede esta cardiopatia: morte do cônjuge, divórcio penoso, problemas no trabalho, perda de propriedades ou de bens importantes, morte de um animal de estimação, entre outros. Tem maior incidência em mulheres já em período pós-menopausa, com idades compreendidas entre os 65 e os 70 anos, embora homens e mulheres de todas as faixas etárias também estejam expostos, crianças incluídas. Esta patologia é identificada no despiste de um ataque de coração, quando se verifica que nenhuma artéria está entupida e o ventrículo esquerdo aparenta uma contração anormal. O que isto quer dizer é que a expressão coração partido não é uma invenção de poetas, músicos, pintores e romancistas. E também quer dizer que é preciso ter cuidado com o nosso coração e com o coração dos outros, sob penas de fazermos mal a alguém ou deixarmos que alguém ou algo nos magoe.
Então o que fazer em caso de ter o coração partido? Não acredito que ferida de cão se cure com pelo de outro cão segundo a sabedoria popular, que recomenda uma substituição de sujeito amoroso, como quem manda sair um jogador do campo para entrar outro. Substituições são para o futebol e para outros desportos de equipa, cujo objetivo é vencer o adversário. Nem o amor é uma competição, nem no amor é suposto ganhar ao outro no que quer que seja. Quem encara o amor como uma guerra surda – os melodramáticos – ou como um desporto – os insensíveis – não percebe nada de amor, porque não é um jogo nem um negócio. Até pode ser um acordo, com cedências pelo meio, e um desafio, pela adrenalina que desperta, mas essa adrenalina tem de ser boa, não nos pode inibir o apetite nem tirar o sono.
Quando o amor começa a envenenar-nos a vida, já não é amor. E se isso nos parte o coração, o melhor é encolher os ombros, atirar a toalha ao chão e aceitar que precisamos de ser pacientes e queridos com nós mesmos. Não esquecer que o coração é um músculo e que por isso mesmo se pode treinar. É preciso ir puxando por ele devagarinho, ao mesmo tempo que lhe damos mimo e conforto. Por exemplo, se o leitor/a está de coração partido e tem vontade de chorar, chore. Mas marque um tempo limite para chorar e depois continue o seu dia. Chore de manhã ou à noite, à hora que lhe for mais conveniente, mas não passe o dia a choramingar. Não vale a pena.
Outro remédio altamente eficaz para ajudar um coração partido a recuperar é fazer coisas novas. A dopamina que é hormona do bem-estar é segregada com a novidade. Pode ser aprender a fazer tricot, a andar a cavalo, ir passar um fim de semana a Coimbra ou simplesmente mudar a disposição dos móveis em casa ou pintar uma parede de azul. O importante é inovar por dentro e por fora.
Corações partidos já tivemos todos, a primeira traição aos 15 anos quando a nossa melhor amiga nos rouba o namorado, aquele lugar que não conseguimos, um noivado interrompido, um cão que morreu atropelado, um amigo de infância que partiu de repente. O azar faz tanto parte da vida como a sorte, há que saber contar com ele com a mesma dignidade com que somamos alegrias e vitórias. Mas o mais importante é acreditar que tudo muda porque todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades. Saber ir a zeros e limpar o passado para a construção do presente com os olhos no futuro dá trabalho, mas cansa menos do que ficar preso na ruminação do passado e dá melhores resultados.
É preciso ter calma, paciência e muito amor-próprio. O tempo e a vida encarregam-se do resto.