André Ventura foi banido do Twitter e o Twitter exultou. A seguir à euforia inicial, com muitos emojis de mãozinhas para cima e corações, instalou-se uma certa melancolia. A rede social do passarinho azul sofreu da síndrome do ninho vazio. A cria que mais adorava odiar voou para longe, e, depois do alívio da casa silenciosa, começou a sentir-se falta do barulho das discussões e das portas a bater. O Twitter é como uma discoteca: reserva-se o direito de admissão e o direito de pôr no olho da rua quem parecer embriagado. É legítimo, como empresa privada pode criar o seu código de conduta. Recorrer aos tribunais para reclamar de uma expulsão, como chegou a ponderar Ventura, faz tanto sentido como processarmos a discoteca Coconuts por nos ter vetado a entrada numa ladies night, alegando que íamos mal vestidos. Mas, mesmo aceitando a legitimidade das normas, podemos discordar delas. A minha roupa não era assim tão má, naquele verão de 2001, devia ter entrado! E Ventura não devia ter saído. Bem sei que as pessoas se comportam de modo infantil nas redes sociais, mas não creio que pô-las de castigo seja a melhor solução. Twitter e Instagram insistem em comportar-se como se fossem nossos pais, “não podes ver mamilos femininos!”, e como se tivéssemos 5 anos, “o Bob Esponja e o Ventura são muito violentos!”. Banir os que se dizem anti-sistema é como dar-lhes razão: fá-los crer que são tão incómodos que é preciso silenciá-los. E quem diz Ventura, diz Trump ou qualquer anónimo adepto de teorias sobre a “fraudemia”, a terra plana ou os rastos químicos dos aviões. Não precisamos de que as redes sociais nos tapem os olhos, como os pais fazem aos miúdos nas cenas assustadoras dos filmes. É que até os nossos pais, a certa altura, perceberam que não podiam proteger-nos de tudo. Fomos para a escola, ouvimos o maluquinho do metro aos gritos, a dizer que era perseguido pela Interpol, ouvimos o Jorge, repetente do 10.ºC, que chumbava sempre a História porque insistia em negar o Holocausto, ouvimos o professor de Moral garantir que a masturbação causava cegueira. Fomos tirando as nossas conclusões, desenvolvendo o pensamento crítico e, a grande surpresa, ninguém ficou cego! Mas este instinto protector não é de agora, as redes sociais sempre deram mostras de quererem a nossa tutela. Vêem todos os utilizadores como filhos, mas alguns transformam-se em enteados. O Facebook sempre quis saber onde andamos, o que estamos a fazer e com quem. E mais, tal como a nossa mãe, quando nos vê silenciosos, pergunta “em que estás a pensar?”, como quem diz, “para estares calado há tanto tempo, é porque estás a tramar alguma”… Entretanto, e ao fim de apenas dois dias, André Ventura foi readmitido no Twitter. Está visto que esta rede social é tão frouxa como eu enquanto mãe; rapidamente passo de “um ano sem sobremesa!”, para: “OK, já passaram cinco minutos, come lá esse pudim”.
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