Os últimos anos têm sido profícuos em alterações nas dinâmicas sociais, parentais e familiares. Temos assistido a um prolongar da coabitação entre pais e filhos, com os filhos a sair de casa dos pais e a autonomizar-se muito mais tarde do que acontecia há umas décadas atrás. Isto tem levantado muitas vozes críticas, até a minha, por vezes, confesso! Tendemos, enquanto sociedade, a olhar para estes jovens como imaturos, irresponsáveis, dependentes ou até mesmo preguiçosos.
É verdade que, existem vários fatores associados a esta dinâmica de autonomização mais tardia, que começam logo na persecução dos estudos até mais tarde e na dificuldade em estabilizar economicamente. Contudo, não é menos verdade a dificuldade do jovens atuais em conseguirem manter-se por períodos prolongados no mesmo contexto profissional, fruto, talvez, de uma ideia generalizada de que ter múltiplas experiências é bom ou de que não devem submeter-se a determinadas coisas, desvalorizando a ideia de continuidade e estabilidade. Fator de acrescento prende-se também com o custo de vida e a dificuldade em alugar/comprar casa. São tudo pesos num mesmo prato da balança que vão contribuindo para estas dinâmicas.
Contudo, desenganemo-nos se achamos que a responsabilidade é apenas dos jovens. Estes jovens são produto da sociedade e de dinâmicas parentais, as quais os foram moldando. Os pais quiserem proporcionar diferentes condições aos seus filhos, suprindo várias necessidades, o que não está incorreto. O problema ocorre a partir do momento em que isso limita a sua capacidade de autonomização. E há por isso uma pergunta que emerge e precisa ser colocada no campo da reflexão. Serão apenas os jovens a depender dos pais ou os pais também dependerão emocionalmente dos seus filhos? Será que, inconscientemente, os pais estão a impedir os filhos de partirem, através de práticas comportamentais de “retenção”, mais uma vez, de modo inconsciente?
São também estes pais que não conseguem passar férias sem os filhos, não conseguem deixar os filhos com os avós uma noite ou até umas horas para poderem ir jantar em casal. São estes pais que ajudam a comprar casas ao lado das suas e que se voluntariam para cuidar da mesma. Estaremos por isso a falar de uma dinâmica de dependência de filhos em relação a pais ou também de pais em relação a filhos? Estarão os pais com dificuldade em “deixar ir”, em olhar os filhos na sua independência e autodeterminação, bem como seres diferentes dos pais? Estaremos a usar os nossos filhos e as suas vidas para nos realizarmos?
É importante refletir estes aspetos no momento em que apontamos o dedo a uma criança ou jovem. Não são apenas eles que não querem partir, são também os pais que os não deixam partir.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.