O princípio da igualdade fiscal tem consagração ao nível da Constituição da República Portuguesa (artigo 13º, n.º1), sendo que nos termos do artigo 104.º, n.º 1, e quanto à estrutura do sistema fiscal, é clara na consideração de que o imposto sobre o rendimento pessoal visa a diminuição das desigualdades e será único e progressivo, tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar.
O “Estado Social”, baseado na dignidade da pessoa humana, como Estado de direito democrático, assenta num sistema fiscal que visa obrigatoriamente a satisfação das necessidades do Estado e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza e é nesse sentido que o imposto sobre o rendimento pessoal tem também por fim a diminuição das desigualdades, tendo em conta as necessidades e os rendimentos das pessoas singulares e dos respetivos agregados familiares.
O princípio da igualdade tributária impõe por isso que a administração pública e em particular a Autoridade Tributária imponha a titulares de rendimentos, ainda que obtidos ilicitamente, o mesmo sacrifício e pelas mesmas regras tributárias, dos rendimentos obtidos legalmente, previstas em cada um dos códigos tributários.
As regras da tributação que consagram a incidência objetiva, no âmbito da tributação do rendimento, em conjugação com o disposto no artigo 10.º da Lei Geral Tributária, são claras e expressas no sentido de tributar os rendimentos ou resultados de atividade ilícita ou ilegal, bem como a titularidade (CIMI), ou transmissão de bens prediais (CIMT e Imposto de Selo) ou mesmo bens móveis (CIVA).
A relação jurídica tributária constitui-se com o facto tributário, sendo este perspetivado numa vertente jurídico-económica, desde que constitua uma manifestação de capacidade contributiva, ou seja, a validade do ato não reveste carácter determinante para a constituição da obrigação jurídico-tributária, embora seja a lei que lhe atribui efeitos jurídicos. Por outro lado, retenha-se que mesmo o ato ilícito não deixa de ser jurídico, revelando capacidade contributiva e produzindo a lei tributária efeitos automáticos independentemente da vontade do fisco e do contribuinte, não imperando no direito tributário a autonomia privada, mas a subordinação das partes ao cumprimento escrupuloso do princípio da legalidade.
O artigo 1º, do CIRS, que define a base do imposto é claro ao estabelecer que “O imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) incide sobre o valor anual dos rendimentos das categorias seguintes, mesmo quando provenientes de atos ilícitos (…)”.
Embora possa parecer à primeira vista que esta solução corresponde a um vazio ético, um mero interesse do Estado na arrecadação da receita sem olhar à sua origem, porém o imposto não tem qualquer caráter sancionatório quanto ao comportamento ilícito, a obrigação tributária decorre automaticamente da lei com a mera verificação do facto tributário, ou seja, o rendimento, tenha ele natureza licita ou ilícita.
Veja-se, ao nível da categoria A, integram rendimentos desta categoria as gratificações auferidas pela prestação ou em razão da prestação do trabalho, quando não atribuídas pela respetiva entidade patronal, não distinguindo o legislador a sua origem licita ou ilícita.
Os crimes tributários não decorrem do incumprimento da obrigação principal – o pagamento do imposto, mas antes da realização de condutas dolosas desviantes, típicas, descritas na lei penal fiscal, bem como a violação grave de deveres tributários.
Se os crimes tributários podem dar origem à aplicação da respetiva sanção quando se verifique o preenchimento do tipo legal de infração, a simples possibilidade de eventual incriminação da conduta subjacente não justifica, só por si, que aquele que aufere rendimentos ilícitos fique dispensado de os declarar e consequentemente beneficie da sua não tributação.
O princípio do nemo tenetur se ipsum accusare não é um princípio absoluto, como reconhece a jurisprudência do Tribunal Constitucional, tal significa que pode sofrer restrições e ser objeto de juízos de ponderação em função da preponderância de outros valores constitucionalmente protegidos, dentro de determinadas circunstâncias e assumindo a aplicação do principio da proporcionalidade uma dimensão casuística.
Ora, o combate à evasão fiscal tem de implicar, não só uma imposição de colaboração acrescida aos contribuintes, mas uma ampla margem aos tribunais na utilização dos meios de prova. A Constituição tem de ser vista como uma unidade e os recursos económicos que escapam aos cofres do Estado, por incumprimento da lei, deixam de poder ser aplicados em tarefas fundamentais do Estado em benefício da coletividade.
Entendimento contrário conduziria à defesa de um Estado iniquo.
Num Estado de direito democrático tem de prevalecer o princípio da igualdade tributária, não se permitindo que os agentes que se dediquem a atos ilícitos ainda beneficiem de não tributação, sob pena dos sacrifícios patrimoniais em favor do Estado e outras entidades públicas incidirem apenas sobre os mais cumpridores da legalidade.