Joshua Brown era um ilustre desconhecido, cerca de 40 anos, em mais novo esteve nos Navy Seals, gostava do seu carro o suficiente para lhe dar um nome, Tessy. Em 5 anos teve 7 multas sobretudo por abusar do acelerador.
Desta vez Joshua Brown, ao que parece, nem iria em excesso de velocidade. Numa estrada com limite de cerca de 100 km/h, passou por baixo de um semi reboque destruindo a parte de cima do carro, bateu em duas sebes e ainda teve força para destruir um poste. O carro ficou literalmente desfeito e Joshua Brown morreu. Morreu e foi notícia em todo o mundo.
O inquérito preliminar já revela que não houve sequer tentativa de travagem. Ao que parece Joshua Brown estava a ver um filme de Harry Potter num leitor de DVD portátil, quando o enorme semirreboque se atravessou na sua frente para mudar de direção. O embate deu-se com toda a velocidade do veiculo.
Fica como a primeira vítima mortal de um carro em modo de condução automática “Autopilot”. O condutor não viu o semi reboque pelo menos não o viu a tempo de reagir, e o carro terá ao que parece ficado encandeado. O reboque era branco, a luz do sol estava muito intensa e os sensores terão interpretado o veiculo como um vazio. Em muitos testes já aconteceu precisamente o contrário, carros que lêem uma sombra como a de uma ponte sobre a estrada como sendo um objecto sólido e travam bruscamente sem necessidade. Quando ficamos encadeados, quando sabemos que estamos a ver mal mesmo supondo que não há nada na frente temos a reação natural de pelo menos abrandar até termos visibilidade, ao que parece o Tesla não o fez, continuou a reagir como se não tivesse nada em frente no momento em que o semi reboque se atravessou.
O Tesla S que Joshua Brown guiava é um carro de luxo, puramente eléctrico, tido como um dos expoentes da tecnologia automóvel. Para uma reportagem guiei recentemente o modelo S e o último Mercedes classe E, capaz de fazer o mesmo mas com combustível normal. O modelo S é um carro com um arranque impressionante. 700 cavalos, mas a potência de um carro eléctrico está praticamente toda disponível no momento em que o ligamos.
Muito mais impressionante é a forma como funciona o tal Autopilot, o carro é capaz de detectar as faixas de rodagem, de controlar os veículos em volta de forma a adaptar a velocidade, e até pode mudar de faixa se quisermos. Interessante na experiência, mas nada espetacular para as filmagens, é que o carro exige mesmo que o condutor dê sinal de que está atento. Claro que é possível dar a volta à coisa. Basta por exemplo manter a mão no volante e ir distraído com um filme do Harry Potter.
Há situações situações tipicas em que os condutores destes carros usam o Autopilot, no pára arranca dos engarramentos, em que o carro segue o ritmo do da frente sem termos que nos enervar e longos trajetos de auto estrada com faixas bem visíveis, apenas curvas ligeiras e boa visibilidade. Num cruzamento, num entroncamento, é suposto dar especial atenção aos outros.
Claro que esta morte faz com que apareça um coro de vozes a clamar contra a tecnologia. E, no caso, talvez com alguma razão. O problema aqui é que estamos numa fase intermédia. Cada vez mais carros terão estas “ajudas à condução” que de facto tornam os carros mais seguros. Joshua Brown tinha contado no Facebook que cerca de uma semana antes a tecnologia do carro evitou um acidente. Em muitos casos reagem melhor do que nós, e os carros nunca se distraem. O caso deste acidente estava destinado a acontecer. Por mais avisos que os fabricantes dêem, por mais que tentem educar os condutores para as limitações do sistema era certo sabido que os compradores iam abusar. Já abusaram muitas vezes só a fazer experiências em condições limite, e ao fim de muitos quilômetros e de ganhar confiança era certo que alguns iam fazer o que não deviam, e deixar de dar a atenção devida ao trajeto.
Sabendo-se que é assim que os humanos funcionam, fica a dúvida se estes carros devem circular, com a certeza de que alguns dos seus condutores estarão ainda mais distraídos do que os que guiam e falam ao telefone ou a enviar mensagens escritas.
É também mais uma vez a prova de que o elemento mais perigoso num carro em movimento continua a ser o condutor.
Permitem de facto a condução sem mãos nas condições ideais. mas não são verdadeiros carros autónomos. A esses, quando chegarem, damos o destino e eles fazem o resto, a Google até já queria fazer um modelo sem volante mas não foi autorizada. Nesses sim, poderemos ler, ver filmes, até dormitar. E serão muito mais seguros, ou se não os conseguirem fazer assim, não serão comercializados.
E só quando deixarmos de conduzir veremos reduzir substancialmente o número de acidentes. Até lá, infelizmente, haverá com certeza mais uns quantos a fazer o mesmo que Joshua Brown e até com consequências mais graves ainda.
A organização mundial de saúde estima que tenham morrido 1,23 milhões de pessoas em acidentes com automóveis em 2013. Nos Estados Unidos terão sido 34 064 e já agora em Portugal, 828. Joshua Brown foi o primeiro que morreu por ter confiado demais na demasiado na inteligência do seu carro. Curiosamente, marca de forma simbólica o início do fim desta catástrofe rodoviária.