1. Tem sido apontada como uma das consequências mais graves de o Chega (CH) haver eleito mais deputados do que o PS o facto de agora ser André Ventura o “líder da oposição”. O que obrigaria, por exemplo, a que numas próximas eleições, no debate final que as televisões costumam promover, entre o líder do partido de governo e o seu principal opositor, ele tivesse de ser entre Montenegro e Ventura (ou quem lhes suceda). Ora, creio não ter isto qualquer fundamento.
De facto, a ideia de um “líder da oposição” só faz sentido em bipartidarismo, quando há dois partidos únicos ou dominantes que se alternam no poder. É o caso dos EUA e do Reino Unido – e foi até agora, mas deixou de o ser, de Portugal.
Assim, entre nós não há agora “um” líder da oposição”, até porque não há “uma” oposição, e os dois maiores partidos que não estão no governo, com número de deputados aproximado, são “oposições” completamente diferentes.
Não há, aliás, nem na Constituição nem em qualquer norma legal, referência a “líder da oposição”. E apenas na ordem de precedência do protocolo do Estado aparece, na oitava posição, o “presidente ou secretário-geral do maior partido da oposição” – não partido da oposição com maior representação parlamentar.
E então, qual é o “maior partido”: o CH que tem mais dois deputados no Parlamento português ou o PS que tem mais votos?; o CH que tem um deputado no Parlamento Europeu ou o PS que tem oito?; o Chega que elegeu 19 vereadores ou o PS que preside 148 câmaras e 1 248 freguesias?, etc., etc. É óbvio que a realidade pode mudar, mas neste momento o “maior” ou principal partido da oposição continua a ser o PS.
2. Após o desastroso resultado nas legislativas, as autárquicas são o principal desafio e objetivo do PS. Julgo inevitável que desça em relação a 2021, o máximo a que pode aspirar, e não fácil de conseguir, é continuar a ser nelas o partido mais votado.
Em tal contexto, as presidenciais passaram a ter para o PS uma relevância, até um “dramatismo”, que antes não tinham. E também relativamente a elas o partido está numa posição difícil. Porque não tem nos seus quadros uma figura incontestável e que possa ser um provável vencedor, nem criou condições para apoiar um candidato não militante do partido que pudesse sê-lo. Na minha opinião, a quase certa candidatura de António José Seguro não tem hipótese de chegar a uma segunda volta; a de António Vitorino decerto não se concretizará, e a concretizar-se tem algumas vulnerabilidades; a de Augusto Santos Silva sobra-lhe em termos intelectuais e curriculares o que lhe falta em simpatia e empatia para ter votos.
Não militante do partido, mas em 2016 apoiado por Mário Soares e Jorge Sampaio, além de Ramalho Eanes, nunca foi considerado António Sampaio da Nóvoa, que contra Marcelo conseguiu ultrapassar um milhão de votos, cinco vezes os que obteve a então presidente do PS Maria de Belém.
Entretanto, Gouveia e Melo continua a navegar em mar calmo e com vento a favor. Creio que beneficiando até, como já aqui escrevi, de críticas injustas e amiúde contraditórias que lhe têm sido feitas, mormente por boa parte da “multidão” de comentadores de serviço. Não cabe agora analisar aqui essas críticas, nem expor outras que podem ser feitas. Sublinho apenas que na entrevista que deu à TVI-CNN o candidato mostrou moderação, contenção, bom senso. Num posicionamento “central”, com independência dos partidos e recusa de ser aproveitado pelo Chega, que lhe convém e vai cultivar. A escolha de Rui Rio para mandatário afigura-se positiva para o almirante, sem prejuízo das ondas que levanta e de nas figuras mais conhecidas que têm aparecido a apoiá-lo predominarem as do PSD.
Assim, estão a faltar-lhe as de outras procedências. E, sobretudo, personalidades relevantes da sociedade civil, em particular do pensamento, da cultura, da ciência, da academia, etc. Seja como for, a sensação que tenho é de que Gouveia e Melo, até pela sua figura, pela sua presença e pela sua forma de falar, transmite aos eleitores uma forte sensação de segurança, sem pôr em perigo a liberdade.
À margem
A “chacina” dos palestinianos
O povo palestino continua a ser vítima, em Gaza, de um verdadeiro “massacre”, de uma “chacina”, cada vez mais qualificado como genocídio por países e personalidades das mais variadas latitudes e ideologias. Nem se acredita que perante tanto sofrimento e tal horror, a desumanidade e a crueldade levadas ao extremo, que as imagens que todos os dias nos entram em casa mostram, haja quem não sofra também, não se indigne, não levante a voz. E é pelo menos lamentável que a reação da UE seja tão débil; é vergonhoso que países ditos civilizados, cristãos, continuem a vender armas a Israel.
Por isso subscrevi e apoio totalmente uma recente petição em que, nomeadamente, se apela a que Portugal reconheça o Estado da Palestina, juntando-se a 149 países que já o fizeram; se comprometa com as deliberações do Tribunal Penal Internacional; e impossibilite, em território ou águas territoriais nacionais, o trânsito e o transbordo de armas para Israel.