No sábado, ao chegar a Lamego, Assunção Cristas tinha tudo – e no domingo, apenas 24 horas depois, quase tudo desperdiçara. O grande resultado eleitoral que obteve nas autárquicas em Lisboa era, no arranque dos trabalhos, obviamente passível de celebração, com direito a bandeirinhas esvoaçantes, a hinos entoados com pujança e vigor pela multidão de fiéis e a gritos histéricos por parte dos jotinhas, essa lamentável tribo que exibe lamentáveis semelhanças às cartas de amor tal qual foram qualificadas por Álvaro de Campos num igualmente lamentável poema cuja qualidade é inversamente proporcional à notoriedade que inequivocamente ganhou.
Parece, por isso, ridículo, que Assunção Cristas tenha optado por transformar um congresso que deveria ser de aclamação numa enorme e desnecessária interrogação: o que lhe passou pela cabeça para ter afirmado, sem se rir, que quer ficar à frente do PSD nas próximas legislativas?
Vamos a números? O melhor resultado da história do CDS ocorreu nas eleições de 1976, em que teve 16%, correspondentes a 876 mil votos. Em 2011, depois de muitos anos a arrastar-se nas catacumbas das cabines de voto, o partido obteve, sob a liderança de Paulo Portas, outro óptimo resultado: 11,7%, correspondentes a 654 mil votos. Agora o PSD que Assunção quer liquidar: Em 2011, quando Portas obteve um excelente resultado, Passos Coelho obteve 38,6%, correspondentes a 2,1 milhões de votos. Bem mais do que o dobro. E em 2005, quando Santana Lopes concorreu contra José Sócrates e foi vergastado por uma copiosa derrota (uma das piores de sempre), conseguiu 1,6 milhões de votos. Ou seja: o melhor resultado do CDS, que foi conseguido em circunstâncias políticas irrepetíveis, é cerca de metade de um dos piores do PSD.
Ao confundir os seus sonhos com a realidade, a líder do CDS acrescentou à venda que aparentemente já tinha nos olhos (e que ficou bem visível, passe a expressão, na entrevista que concedeu ao Expresso deste fim-de-semana) uma corda em redor do pescoço, porque tornou o CDS – e a sua liderança – refém de um resultado que obviamente não alcançará. É certo que num partido em que a maioria dos militantes está sobretudo confortável a olhar para trás não deixa de ser interessante observar uma líder a tentar fazer o exercício inverso, mas aqui chegados talvez não fosse má ideia que alguém informasse Assunção Cristas de que, nas circunstâncias actuais, olhar para além daquilo que os seus olhos conseguem alcançar não é apenas um erro – é um acto politicamente suicida, manifestamente capaz de lhe arruinar uma carreira que até nem lhe estava a correr mal.