1 – Por muito modernaços que nos achemos, e até utilizemos palavras como “fixe”, “bué” e afins, os filhos vão achar sempre maneira de nos pôr no nosso lugar, seja fazendo-nos sentir uns velhos, mesmo que estejamos na casa dos 30 (“Já ninguém diz isso, mãe”), seja simplesmente porque existimos e fazemos questão de aparecer junto a eles e respirar;
2 – As crianças são seres bastante sugestionáveis: abstenhamo-nos, portanto, de os beijar com batom vermelho vivo (“Estou a sangrar!!!!!”), ou de os acordar com máscaras hidratantes na cara (“É um monstro!!!!”);
3 – Até sensivelmente aos 6 anos, o poder dos nossos beijos cura tudo. A partir dessa idade, transforma-se em algo repugnante e passível de causar o maior embaraço aos nossos filhos, que farão questão de no-lo demonstrar esfregando frenética e vigorosamente o local osculado e emitindo onomatopeias de asco;
4 – Não devemos subestimar o poder de um martelo dos bifes: é ameaçador q. b. quando brandido com genica, e a obtenção de carne bem tenra facilmente se torna numa desculpa plausível;
5 – A comida será sempre muito melhor em casa alheia, mesmo que seja pescada cozida com brócolos;
6 – O Playmobil irá sempre parar à sanita, o Lego irá sempre parar dentro de um sapato, a bala da pistola irá sempre parar dentro do prato da sopa;
7 – A sopa, essa será sempre uma porcaria. A não ser nas circunstâncias descritas no ponto 5;
8 – As batatas fritas fazem de qualquer refeição um dia de festa e, por arrastamento, transformar-nos-ão nos melhores pais do mundo;
9 – Não mais possuiremos bolsos vazios: lenços com ranho alheio serão o item mais frequentemente encontrado;
10 – Tornamo-nos na personificação das nossas mães, sobretudo na mania que achávamos nojenta de limparmos a cara dos nossos filhos lambendo o nosso próprio polegar;
11 – Não haverá nenhuma superfície comercial cujas instalações sanitárias não conheçamos, aliás, os nossos filhos estarão com certeza mesmo, mesmo, aflitinhos quando estivermos:
a) numa fila
b) num provador
c) numa fila para um provador
12 – Muito por essa razão, fluidos corporais filiais passam a reger a nossa vida, não só por termos de os prever/recolher/limpar, mas também porque a petizada tem uma quase doentia fixação por eles, seja porque se imiscuem na grande maioria dos temas de conversa, seja porque chegam a percorrer a casa inteira apenas para alegremente no-los ofertarem (que pai nunca recebeu um burrié?);
13 – A nossa agenda social é totalmente pulverizada e selvaticamente substituída pela deles, à razão de 17 festas infantis por fim de semana;
14 – A nossa vontade de degolar ovelhas e esventrar golfinhos bebés passa a ser diretamente proporcional ao tempo dos treinos de flauta da nossa prole;
15 – Com o decorrer do tempo desenvolvemos a capacidade de estar na casa de banho sob uma pressão formidável, com criaturas do outro lado da porta a perguntar “Já está?”, “Já acabaste?”, Ainda demoras muito?”, “Podes vir fazer passes de bola comigo?”;
16 – Passa a ser habitual as crianças fazerem uma festa maior quando ouvem o camião do lixo na rua do que quando nos ouvem chegar a casa;
17 – Damos por nós a encarar com normalidade respostas como “Já vou jantar, deixa-me só aqui acabar de morrer” ou “Podes esperar que atropele o mano?”, assim como desentalar-lhes da boca bagos de arroz com dois anos de rodapé;
18 – O pânico com que passamos a entrar, tateando, numa divisão escura é diretamente proporcional à quantidade de horas que eles lá estiveram a brincar;
19 – A frase “Deixa-me agora ouvir as notícias” aos ouvidos de uma criança soa a algo como “Podes a partir de agora fazer-me todas as perguntas que quiseres, preferencialmente a gritar”;
20 – As crianças vieram ao mundo, em grande parte, para nos embaraçar (regra geral com sons que achamos impossíveis serem produzidos por aqueles frágeis corpinhos), mas também com uma incrível capacidade de nos desarmar com um sorriso. Mesmo daqueles com os dentes todos sujos de chocolate. Sobretudo desses.