As sondagens das últimas semanas e, durante esta, as dos últimos dias, mostram a coligação PSD/CDS-PP à frente nas intenções de votos. Depois de quatro anos de governo Passos/Portas, pode parecer surpreendente, tendo em conta os cortes nas pensões e nos salários dos trabalhadores da função pública, o nível desemprego a que chegámos, a escalada da dívida pública, o brutal aumento de impostos e muitas outras coisas que aconteceram durante este período.
Na minha opinião, tal deve-se aos seguintes fatores:
1. A coligação de direita foi capaz de externalizar os fatores que conduziram a esta situação. Para o português médio, não foi a ação do governo que nos trouxe aqui mas a situação herdada e as condições impostas pelos credores da República. O opróbrio da época de dificuldades não recai, assim, sobre o governo. Os portugueses sentem-se mal mas não culpam a dupla que nos governou durante a atual legislatura.
2. A economia reanimou. Sobretudo graças ao turismo, certamente porque a torneira do crédito se reabriu, mas também porque as exportações agrícolas e metalomecânicas cresceram. Neste caso, o governou internalizou estes efeitos, fazendo-nos crer que foi por causa da sua ação que tal aconteceu. Paulo Portas sabe como ninguém fazer issso e aproveitou magistralmente a visita aos estaleiros de Viana do Castelo…
3. O programa do PS para a economia parece demasiado experimental para convencer um eleitorado traumatizado com a crise de 2011. Embora as propostas de Mário Centeno me pareçam muito interessantes – desagravam o custo de trabalho, aumentam o rendimento dos trabalhadores, dão folga às empresas – são território inexplorado. Surgiram demasiado em cima da campanha para fazerem o seu caminho. Neste caso, paradoxalmente, o facto de o PS ter feito as contas poderá virar-se contra o partido. Embora, do meu ponto de vista, a apresentação de um programa tão detalhado constitua um avanço notável sobre o modo como se faz política em Portugal e tenha dado uma banhada ao programa da coligação, que não avança com um número, este pode ter sido um dos principais fatores para fazer o eleitorado desconfiar. Ainda por cima, os números foram habilmente usados pela coligação contra o próprio PS e o seu líder, que no debate promovido pelas rádios não soube explicar o “corte” de mil milhões nas prestações sociais não contributivas por recurso a uma análise prévia da situação económica dos beneficiários (o que é, mais do que necessário, justo).
4. O PS começou a campanha dando a ideia de estar a fazer um trabalho em cima do joelho. Podia não ter importância nenhuma se o clima lhe fosse mais favorável mas o caldo já estava entornado. Não terem encontrado um “desempregado” real para os cartazes só contribuiu para a ideia de se estar a lidar com amadores.
5. O modo como Costa ganhou o poder no PS foi ultrapassado no seu partido mas não foi esquecido no País. É esse um dos problemas de se fazerem primárias: tem de se lavar muita roupa suja em público. Para muitos portugueses, Costa foi um oportunista que aguardou por uma fraqueza do seu correligionário para lhe espetar uma faca nas costas. Ou seja, sacar-lhe o partido numa altura em que as eleições legislativas pareciam estar no papo.
6. José Sócrates não é companhia para um partido que queira chegar ao poder quatro anos depois de ele nos ter conduzido praticamente à bancarrota. António Costa não soube distanciar-se do ex-primeiro-ministro e isso está a custar-lhe muitos votos. Na minha opinião, o distanciamento nem se exigiria por José Sócrates ser arguido num caso de corrupção e branqueamento de capitais – “não se viram as costas aos amigos”, pensa o eleitorado – mas por causa das suas políticas inconsequentes e irresponsáveis, de 2009 a 2011. Costa nunca disse com clareza que esta é uma herança que rejeita. Pelo contrário: temo-lo ouvido dizer que aceita toda a história do PS. Passos Coelho entendeu isto muito bem e por isso repetiu 12 vezes o nome de Sócrates no primeiro debate televisivo com António Costa…
7. A campanha ainda não acabou mas a procissão já saiu do adro. A vida para António Costa não está fácil…