O segundo debate entre António Costa e Passos Coelho, na quinta-feira, 17, foi o melhor dos dois. Os moderadores deixaram-nos falar, não os interrompendo constantemente, o que permitiu a cada um retorquir e contrariar o adversário. Os temas estavam melhor estruturados e os entrevistadores melhor preparados do que os seus companheiros da televisão. Os líderes da coligação PSD/CDS-PP e do PS estavam também mais aquecidos, talvez porque este debate se sucede a uma ronda de entrevistas e de debates de segunda linha, nas televisões, e a muitas horas de estrada em pré-campanha.
Passos Coelho fez o trabalho de casa e não deixou que o encostassem à parede, como aconteceu no primeiro debate. Em minha opinião, Passos não perdeu o primeiro embate com Costa, tendo antes “representado” um papel que lhe foi atribuído pelos seus assessores e marketeiros: o de encostar o atual líder do PS à governação de José Sócrates. Por isso repetiu o nome do antigo primeiro-ministro 12 vezes. É certo, contudo, que se deixou apanhar mais do que uma vez, não ripostando nem contrariando eficazmente o discurso de António Costa.
Desta feita, tal não aconteceu. Em relação ao primeiro tema, deixou claro que os outros partidos socialistas europeus também alinharam pela cartilha da austeridade, que António Costa tanto critica. E lembrou que Costa se congratulou com a vitória do Syriza tendo mudado de discurso depois do partido de Tsipras ter sucumbido à Alemanha. Costa marcou poucos pontos. Lembrou um artigo de Passos no Wall Street Journal e defendeu a necessidade de cumprir o Tratado Orçamental, seguindo uma leitura “inteligente e flexível” do mesmo. Mas também disse que não concorda com o Tratado Orçamental. Lembrou-me Tsipras a dizer aos deputados do seu partido que não concordava
com o resgate que havia acabado de negociar com os parceiros europeus. Pareceu-se com aquele momento de Clinton em que o ex-presidente norte-americano reconheceu ter fumado marijuana mas sem inalar o fumo…
Costa foi mais claro no que respeita ao regime conciliatório de despedimentos, depois dos ataques a que o sujeitou a bloquista Catarina Martins durante o encontro, dias antes, na TVI. E a crítica ao coeficiente familiar no cálculo do IRS foi contundente e clara a proposta dos socialistas. Passos, contudo, não se ficou. Partiu ao ataque e garantiu que foi a compra dos terrenos do antigo aeroporto de Lisboa que permitiu a Costa reduzir a dívida da Câmara Municipal de Lisboa, bandeira que o socialista tem abanado cada vez que o deixam. E regressou ao legado de Costa, evocando as promessas feitas na campanha eleitoral para Lisboa e não cumpridas: terceira travessia do Tejo e Parque Mayer.
Foi na Segurança Social, contudo, que Passos Coelho esteve melhor. Passou a ideia de responsabilidade, ao incitar o seu adversário a negociar, quer perca ou ganhe as eleições. E quando Costa não lhe deu resposta, marcou pontos ao transmitir a imagem de estadista mais preocupado com os problemas do país do que com os resultados eleitorais. Por momentos, Costa pareceu mais um chefe de fação do que um candidato à governação do país, capaz de gerar os consensos necessários à resolução dos seus problemas, de que a Segurança Social é um dos maiores.
No segundo round sobre o tema, levou mesmo o adversário às cordas. Costa saiu-se mal da pergunta sobre as prestações sociais do regime não-contributivo que o PS pensa sujeitar a condições de recurso (para os leigos: a prova de rendimentos antes da sua atribuição), poupando aí mil milhões de euros. Os moderadores pediram-lhe para dizer quais eram essas prestações e Costa mostrou não saber a lição. O mal-estar do líder do PS foi visível e a falta de preparação evidente. Passos voltou à carga, exigindo a Costa que enunciasse os cortes e em que prestações, o que o líder do PS não fez. Foi o leitmotiv para
o acusar de demagogia e de apresentar um programa com números que não conhece. Foi parecido com o momento do debate entre Sócrates e Louçã, em 2011, em que o socialista acusou o bloquista de atacar a classe média, propondo a supressão das deduções de saúde e ensino no IRS. Esmagou, sem açúcar e sem afeto.
Costa saiu do debate a distribuir sorrisos e a acenar a apoiantes. Não havia necessidade. Nos próximos dias, tem de corrigir o rumo para que as coisas que lhe começaram a correr melhor não voltem a correr-lhe mal.
PS: Catarina Martins, é consensual, ganhou todos os debates em que participou. E até no embate com Ricardo Araújo Pereira na TVI, no genial “Isto é tudo muito bonito mas”, mostrou a sua combatividade, tendo aproveitado cada oportunidade para lançar uma farpa a Passos Coelho. Fará subir a votação no Bloco de Esquerda? Conseguirá reconquistar aqueles que abandonaram o partido? Será o fiel da balança de um possível governo socialista? A seguir com atenção…