Ahmed Ben Bella foi o líder do movimento nacionalista argelino. Esteve sob prisão dos franceses mas foi libertado em 1963, ano da independência do seu país, tendo sido eleito de seguida presidente. Mas este artigo não é sobre a independência da Argélia. É sobre refugiados e imigrantes económicos. E Bella só é evocado por causa de uma sua frase, relembrada por Filipe Fialho na edição impressa da VISÃO desta semana. “O Sul é um arrabalde de barracas que tem em frente um campo de golfe. O que pode acontecer? Uma invasão. Para a impedir, só há uma fórmula: que os arrabaldes vivam melhor”.
Pois é. No Egito, 31% da população tem menos de 15 anos de idade. O panorama demográfico dos países da parte sul e nascente da bacia mediterrânica é semelhante à daquele país, se excetuarmos pequenas diferenças: a população jovem é maioritária e precisa de trabalhar. Em alguns desses países, além desta pressão demográfica, há ou houve recentemente guerra ou conflitos militares (Síria, Egito, Líbia). O PIB per capita destes países chega a ser um décimo do da média da União Europeia, que é de 34 mil dólares per capita. Além disso, a sul e a leste desta bacia existem ainda mais pobres, quer seja na África central, no Corno de África ou na Ásia Central. O PIB per capita da Etiópia, por exemplo, é de 547 dólares. É este o arrabalde de que falava Bella.
A verdade é que eles precisam de nós. Se cada europeu contribuísse com 100 euros para desenvolver estes países (em projetos de desenvolvimento económico, de educação e de saúde), juntar-se-iam 50 mil milhões de euros num ápice. O dinheiro até podia ser disponibilizado já e os pagamentos serem feitos depois (através de mecanismos como o do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira). Se fosse pago num ano, corresponderia a cerca de 25 cêntimos diários por europeu, mais ou menos o preço de um papo-seco. Seria um pequeno esforço para nós mas um poderoso instrumento de desenvolvimento para estes países, se o dinheiro fosse bem aplicado: uma espécie da plano Marshall para o Magrebe e para o Médio Oriente em necessidade.
Mas nós também precisamos deles. A população europeia está em rápido e inexorável envelhecimento. Por muitos anos, exceto no caso de eventos imprevisíveis e de magnitude assinalável (grandes desastres naturais, guerras, epidemias), a Europa envelhecerá e diminuirá a sua população. Como mostram os dados publicados no final de Julho com base em projeções das Nações Unidas, Portugal será em 2030 o terceiro mais envelhecido país do Mundo, se usarmos por bitola a idade média da população. No segundo lugar deste pódio encontra-se a Itália.
A redução do número de filhos é resultado de uma reviravolta civilizacional assente no papel social e económico da mulher. Suponho que ninguém desejará um retrocesso a esse nível (embora alguns portugueses pareçam desejar colocar as mulheres em casa a ter filhos para garantir o bem da Nação). Resta-nos para tanto a imigração. Que deve ter uma política, claro.
Construir muros, contudo, não é uma política. É o comportamento equivalente ao das velhinhas que trancam as portas e as janelas com medo dos bando de adolescentes que fazem barulho na rua. Nem é preciso, portanto, evocar princípios humanitários ou os Direitos do Homem para perceber o quão estúpidas são as posições dos líderes europeus. Cameron, Órban e Borisov não conseguem sequer apertar os atacadores da Europa, muito menos olhar além das suas fronteiras. É a esta gente que um eleitorado medroso e traumatizado com a crise nos entregou. Não estranhem, por isso, quando o campo de golfe for invadido por magotes de gajos do bairro de barracas irados e sem qualquer esperança no futuro…