Não se sabe, ao certo, desde quando se fazia, aqui no Porto, a feira dos moços e das moças para os trabalhos da lavoura. Sabemos que, em 1858 veio, transferida de algures, onde já se realizava desde tempos imemoriais, para o antigo largo dos Ferradores, a atual praça de Carlos Alberto. Fazia-se duas vezes ao ano, sempre a uma terça-feira, em abril, para recrutar mão de obra para os trabalhos de verão; e em novembro para os trabalhos do inverno.
Patrões e criados vinham dos arrabaldes da cidade concentravam-se estrategicamente pelo amplo terreiro e, os moços e as moças, aguardavam a abordagem dos candidatos a patrões. O ambiente ao redor era o de uma qualquer romaria do norte. Não faltavam as diversões nem os descantes, ao som de violas ou concertinas “com bailados saloios e namoriscadelas”, como consta das crónicas da época. Nunca faltavam as barracas dos comes e bebes; dos doces, com predominância para os célebres doces da Teixeira e de Paranhos e, era certa também, a presença do homem do cosmorama que, por dez reis, satisfazia a curiosidade popular mostrando o que ele dizia serem as sete maravilhas do mundo como, por exemplo, ” as prirambolas do Ingito com dois camelos em baixo” ou “a morte de D. Inês com o rei a mandar-lhe tirar o coração pelas costas…”
Não faltavam na feira, enquanto se fez nos Ferradores, espectadores atentos e divertidos, especialmente da Academia que ficava ali perto e que não se coibiam de gabar, especialmente, os olhos daquela moça, a alvura dos dentes desta ou o rosado da boca daqueloutra. E até se dizia que os potenciais patrões se decidiam, a maior parte das vezes, não pelo garbo ou aptidões físicas deste, mas sim pelo sorriso ou pelos olhos daquela…
Apesar de a maior parte dos moços e das moças não saberem ler e muito menos fazer contas, os ajustes faziam-se de comum acordo. Havia contratos , para eles, de 150$000 reis por mês com direito a cama, mesa e roupa lavada. Um moça de 15 anos pedia, em regra, 45$000 por mês e as demais condições. As raparigas entre os 18 e os 19 anos ajustavam por 55, 60 ou 80$000 reis, todas as outras condições e aos domingos e dias santos, direito a folga. De alguns destes contratos fazia parte uma cláusula segundo a qual o patrão se obrigava a oferecer determinadas peças de roupa e de calçado .
Costume antigo era o que obrigava todo o amo que contratasse criado ou criada a celebrar o acordo pagando “a cabrita” que era uma espécie de merenda obrigada largamente a vinho verde ou maduro e uma espécie de cozinhado de carne. Mas, como tudo passa, a feira dos moços e das moças também acabou no Porto. Do largo dos Ferradores foi transferida, em 1876, para a Rotunda da Boavista de onde transitou, já no começo do século XX para Arca de Água, a praça de 9 de abril dos nossos dias. Acabou, nos idos de cinquenta do século passado, na praça da Corujeira. Nos últimos anos a sua realização era já muito contestada.