É estranho e até irónico. Aos benfiquistas, pode até parecer heresia. Mas o maior problema do Benfica, esta época, pode estar naquele que foi o seu melhor jogador na época passada e é, inquestionavelmente, um dos melhores do plantel atual: Jonas.
Não me refiro, como é óbvio, ao jogador em si mesmo, nem o seu rendimento. Mas a tudo aquilo a que a sua presença na equipa obriga. É evidente que nada se pode apontar ao comportamento e até ao aproveitamento de Jonas. Tal como na época passada, e apesar de já não ser um jovem, o brasileiro continua a demonstrar toda a sua classe. Continua a ser o melhor marcador da equipa e é, juntamente como Gaitán e Gonçalo Guedes, responsável por muitos dos bons resultados que o Benfica já conseguiu esta temporada.
O problema é que, para que o brasileiro possa jogar onde mais rende, obriga o treinador Rui Vitória a ter de aplicar um sistema tático para o qual a equipa não tem jogadores. Jonas não pode jogar sozinho na frente de ataque. E, como é determinante, também não pode ficar no banco. Por isso, obriga sempre o treinador a colocar outro avançado a seu lado: Mitroglou, mais fixo na área, ou Raúl Jimenez, mais solto. Não viria mal nenhum ao mundo se a obrigatoriedade de um segundo avançado não inviabilizasse a entrada de um terceiro elemento para a zona central do terreno, algo de que o Benfica deste ano precisa como de pão para a boca. E como, nas alas, Gaitan e Guedes são jogadores talhados para jogar agarrados à linha, o meio do campo do Benfica de Rui Vitória joga, sobretudo nos jogos mais exigentes, sempre em inferioridade.
Muitos estarão nesta altura a questionar a razão de isto ser um problema agora, quando nunca o foi nos últimos anos, no consolado de Jorge Jesus, durante o qual o Benfica jogou quase sempre neste mesmo sistema, com dois homens na frente. Mas aí a resposta é simples, e vai para além da questão óbvia de se perceber que Vitória não é Jesus.
Antes de tudo mais, havia Lima, que foi o primeiro defesa do Benfica nas três últimas épocas. Rui Vitória tenta replicar o modelo com Jiménez, mas o mexicano mostra ainda mais sofreguidão do que eficácia e matéria defensiva e tem estado longe da veia goleadora que caracterizava o brasileiro. E, depois, se nos lembrarmos de alguns dos jogadores que povoaram o meio-campo do Benfica nos últimos seis anos (Ramires, Javi Garcia, Axel Witsel, Nemanja Matic e Enzo Perez) e os compararmos com os jogadores atualmente à disposição de Rui Vitória, fica tudo mais fácil de entender.
Atualmente, só o grego Samaris se aproxima, em classe e capacidade, àqueles cinco monstros sagrados que, aos pares, ao longo destes anos, foram quase sempre capazes de ser mais fortes do que os trios adversários. Cristante custou milhões mas, como não joga, dificilmente se perceberá quanto, de facto, pode valer. Fejsa, que foi muito útil para ajudar a suplantar a saída de Matic para o Chelsea, depois da lesão, nunca mais foi o mesmo. Pizzi, que na época passada conseguiu, a partir de Janeiro, suprimir em parte a ida de Enzo para o Valência, este ano, tem revelado falta de pedalada (ou será da vitamina Jesus?). E, depois, restam André Almeida e Anderson Tallisca.
O primeiro é o bombeiro de serviço, joga em quase todas as posições do meio-campo para trás, mas, como é comum nos polivalentes, não é realmente bom em nenhuma posição específica. E o segundo é, provavelmente, o maior prejudicado pela obrigatoriedade de jogar Jonas. Tem tudo para ser um número dez moderno. O homem solto no centro do terreno, capaz, por um lado, de se juntar aos dois médios mais fixos (Samaris e Pizzi, por exemplo) na luta pela posse de bola, Por outro lado, um atleta dotado de velocidade para transportar a equipa para a frente, nas costas do avançado (Jimenez ou Mitroglou), com visão de jogo para lançar e libertar o génio de Gaitan e Guedes e com uma capacidade técnica e um potência de remate invulgares. Amarrar Talisca a zonas recuadas do terreno e a tarefas fundamentalmente de contenção é afasta-lo das zonas onde ele pode ser mais eficaz. E acaba por desequilibrar a equipa, tornando-a vulnerável e presa fácil de adversários minimamente qualificados.
Este será o grande dilema com que se vai deparar Rui Vitória quando montar a equipa para defrontar, no próximo fim-de-semana e pela terceira vez desde agosto, o Sporting, em Alvalade, para a Taça de Portugal. Vai, por uma vez, reservar Jonas no banco e apostar em ganhar superioridade a meio-campo ou vai manter a aposta no avançado brasileiro? E como? Sozinho na frente, como fez na Supertaça, durante a qual o avançado brasileiro praticamente não se viu entre os dois centrais contrários? Ou atrás de um dos pontas-de-lança, como no jogo da Luz, para campeonato, deixando apenas Samaris e mais um (Tallisca, Pizzi ou André Almeida) entregues à luta com William Carvalho e Adrien, sempre apoiados por João Mário? No primeiro caso só perdeu por um, mas no segundo foi o que se viu…
No fundo, a questão é a de saber se Rui Vitória está disposto a arriscar deixar de fora o melhor excutante do plantel a troco de montar o esquema tático mais adquado aos jogadores de que dispõe e ao adversário que tem pela frente ou se vai continuar a desequilibrar a equipa para que Jonas possa jogar na única em que pode render. É verdade que, para defrontar a maioria das equipas portuguesas, vai dando para o gasto. Mas chegará, finalmente, para derrotar este Sporting… de Jesus?