Há poucas semanas, Marques Mendes não teria dito como disse no recente debate com António José Seguro que uma das suas forças era que seria um Presidente mais interventivo. Tão pouco este último se teria colado à sua raiz socialista e ao próprio partido aí.
O que se passou de especial para que esta mudança tivesse ocorrido em dois dos principais candidatos? Simples. Uma sondagem da SIC-Expresso, que naturalmente também influenciou e continuará a influenciar estes e outros candidatos. Distintas haverá com diferentes sinais, mas que tenham o mesmo efeito junto dos aspirantes ao cargo de Presidente da República. Ora, por experiência, sei que nenhuma sondagem deve ser levada a sério demais antes das eleições. Mas sim como a ‘fotografia’ do momento, onde se destacam alguns fatores a ter em conta: a dimensão da amostra, a margem de erro e a própria segmentação do público-alvo consultado.
Nesse âmbito, importa perceber o que obedecia ao tal instante e o que ia e vai para lá deste do ponto de vista analítico. Até porque apontam para erros dos candidatos e para os quais, desculpem-me os leitores a franqueza em causa própria, sempre apontei.
António José Seguro foi o primeiro a ligar os ‘motores’ da sua campanha presidencial depois de Gouveia e Melo e parece estar com alguma dificuldade em captar a maioria do eleitorado de centro-esquerda, do PS e à espera que outros dos candidatos à sua esquerda desistam para congregar os votos daí. Isto não deveria surpreender. Para a esquerda do PS que viveu isso e tem memória, serão as políticas que seguiu enquanto secretário-geral do Partido Socialista. Com mais ou menos razoabilidade nessa aceção. Para os eleitores do partido, outros independentes do espaço do centro-esquerda, será, entre outras coisas, o tal “partido dos interesses” que ele quis colar a António Costa pouco tempo depois do “caso” Sócrates. Ora, isso era o mais fácil na altura e o que a direita mais gosta de evocar em Seguro, mas que teve pouca ou nenhuma adesão à realidade quando nos apercebemos de que José Sócrates enquanto primeiro-ministro agiu essencialmente sozinho no que à política e ao PS diz respeito. Em todas as esferas da acusação do seu processo. O candidato que fez crer que dispensava o apoio do partido e vê na tal ‘fotografia do momento’ o PS a recuperar terreno noutra frente julgava que quase por magia ou pelos cinco amigos passistas na opinião pública conseguiria conquistar eleitorado à direita, numa altura em que existem três candidatos a concorrer nesse espaço. É obra!
A campanha de Seguro parece estar já a procurar emendar o erro, podendo ganhar engrenagem nos debates que faltam, mas começou por falhar, tanto nas convicções como na estratégia política. Da primeira dificilmente se recupera no contexto atual. Certo é que um eventual mau resultado não poderá ser imputado a uma suposta elite do PS, ao eleitorado de centro-esquerda que fugirá (?) para Gouveia e Melo e muito menos ao voto útil e aos candidatos que não desistiram em seu favor. A política também não deve viver de proclamações de uma decência e de uma seriedade singulares. Isso tem de estar subentendido e esse é o espaço dos populistas que querem tomar o pouco pelo todo, vivendo na ânsia de caracterizar ‘mundos’ como lhes convém mais e a partir de microrrealidades.
‘Convicções’ é outra das palavras que mais sobressaem destes levantamentos populares recentes. Todos os estudos de opinião têm indicado que a maioria inquirida quer um Presidente mais interventivo e perto de 70% analisam de forma positiva os mandatos do atual Presidente da República. Primeiro, nada disto combina com a estratégia na qual grande parte dos candidatos partiu para esta corrida. Um político assume-se e os tempos não estão para quem é ou procura ser vago. Segundo, a palavra frequente de Marcelo irritava essencialmente certo mediatismo e o último ano, no qual se resguardou mais, mostrou que foi ele a partir da Presidência quem mais liderou nos momentos de maior crise nacional. E diga-se, quem fez quase sempre melhor utilização da palavra. É bastante provável que Marcelo Rebelo de Sousa acabe os dois mandatos como um dos Presidentes com a taxa de aprovação mais alta.
Finalmente, estes reflexos do desejo da ‘convicção’ nas últimas sondagens também acabam por ir ao encontro do candidato presidencial da extrema-direita. Ele tem-nas por mais que eu discorde radicalmente das mesmas, do que despoletam no País e do propósito desta candidatura. Mas a sua prestação cada vez mais extremada, histriónica nos debates, prova que está inseguro e o quanto sentiu que as autárquicas foram uma derrota pesada e de perda de dinâmica do seu partido. Possivelmente fatal no contexto atual e onde era previsível que interessaria extremar. Para lá dos limites. Não interessa se disputam o mesmo eleitorado, quem quer ir à segunda volta deveria fazer marcação cerrada e desmontar o candidato da extrema-direita que não gosta do regime.
Convictamente.
Tanto nos debates como fora deles. É também isso que cimentará o seu próprio espaço eleitoral e a partir do qual se constrói depois. Gouveia e Melo foi o que melhor percebeu isso.
E os outros?
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