Quem é capaz de realizar um testamento?
A capacidade testamentária refere-se à capacidade legal de uma pessoa para elaborar um
testamento: documento legal que descreve como os bens e propriedades serão distribuídos
após o falecimento. Para que um testamento seja válido, a pessoa deve ser considerada
capaz de o fazer conseguindo expressar a sua vontade de forma objetiva. Isso envolve
alguns elementos essenciais:
1 – Idade
Não existe idade mínima para fazer um testamento, sendo que qualquer pessoa pode fazê-lo
desde que a lei não as considere incapazes para tal. Os menores não emancipados e os
maiores acompanhados considerados incapazes para testar (conforme a sentença de
acompanhamento), não o podem fazer. Anteriormente estes eram designados: interditos
(quando eram incapazes de gerir as suas vidas e bens) ou inabilitados (incapazes de gerir os
seus bens). A ideia por trás é garantir que a pessoa tenha consciência para tomar a decisão
importante sobre como distribuir o seu património.
2 – Capacidade Mental
A pessoa deve estar no pleno gozo das suas faculdades mentais e ser capaz de
compreender a natureza e as consequências da sua decisão. Se alguém estiver sob a
influência de doenças ou outra incapacidade que afetem a sua capacidade de compreensão e
capacidade cognitiva, por exemplo uma demência, o seu testamento pode ser questionado.
3 – Livre Vontade
A vontade do testador deve ser livre de qualquer coerção ou pressão indevida. O
testamento deve ser um reflexo das verdadeiras intenções do indivíduo, e não um produto de
manipulação. Se for alegado que o testamento foi assinado sob coação, ameaça ou fraude, este
pode ser impugnado.
Depois de assinado, é possível revogar um testamento?
Sim, quando a pessoa que fez o testamento evidencia, posteriormente, por exemplo sinais de
déficit cognitivo, a parte interessada tem a opção de contestar a validade do testamento.
Isto porque, à luz da lei portuguesa, até prova em contrário, presume-se que a pessoa está
capaz de fazer um testamento. Assim, o familiar ou alegado herdeiro que pretende
contestar, provavelmente por se sentir lesado e não concordar com a divisão de bens, é
que terá que provar que o testador estava incapaz à hora do testamento.
Para isso, é feita uma perícia psiquiátrica independente para determinar se à data da assinatura
do testamento, o testador estava realmente capaz ou não, sendo que esta irá influenciar o
sucesso da causa em tribunal.
E depois da morte do testador?
Sim, também, mas estes casos em que o testamento é contestado post mortem são bastante
raros. Como o testador já não se encontra vivo e não pode ser avaliado por um médico, é
exigido que exista prova documental médica significativa que fundamente a alegada
(in)capacidade para testar.
A documentação médica do testador, como relatórios clínicos de consultas de
neurologia/psiquiatria/psicologia, avaliação neuropsicológica e exames de diagnóstico, apesar
de estar ao abrigo do sigilo médico, pode ser obtida atendendo ao interesse legítimo.
Um parecer independente e bem fundamentado de psiquiatria levanta a dúvida razoável
e legítima junto do tribunal sobre a real (in)capacidade do testador à data do testamento,
no sentido de promover a realização da perícia oficial no Instituto Nacional de Medicina
Legal e Ciências Forenses (INMLCF).
Por outro lado, quer em vida ou após a morte, caso já exista uma perícia pública oficial com
incoerências, é possível contestar enunciando essas falhas, sob a forma de um parecer
privado dando origem ao contraditório. Isto permitirá que o julgador possa fundamentar o
pedido de uma segunda perícia ao mesmo Instituto, que será executada por um novo perito,
dando assim uma maior probabilidade de êxito ao pretendido.
Como posso prevenir que o testamento seja contestado?
Quando se prevê disputas entre familiares e herdeiros, é crucial que se prove, mediante
perícia médica, que o testador se encontra cognitivamente capaz de tomar decisões,
antes e à data do testamento. Nestes casos, será mais difícil no futuro contestar este
testamento.
A perícia da capacidade testamentária é realizada por um psiquiatra forense e inclui:
- análise dos relatórios médicos de neurologia, psiquiatria, neuropsicologia e/ou psicologia;
- análise de exames complementares de diagnóstico como RM ou TC cráneo-encefálica
- exame do estado mental;
- avaliação pela neuropsicologia.
Adicionalmente, a lei prevê, ainda, a presença de peritos médicos nos notários no ato do
testamento que abonem a sanidade mental do testador, quer seja a pedido do autor do
testamento, quer pelo próprio notário.
Assim, desta forma, prevenimos que o testamento, mais tarde, possa ser colocado em causa,
alegando que a pessoa não estava com capacidade psíquica e de livre vontade para fazer o
testamento.