São Paulo, Brasil, 14 Abr (Lusa) – Os efeitos da crise económica global vão intensificar os conflitos no campo no Brasil, com mais ocupações de grandes propriedades, afirmou hoje um dos líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
João Pedro Stedile salientou, numa conferência de imprensa, em São Paulo, que o aumento dos despedimentos e a quebra do poder de compra dos trabalhadores vão aumentar a pressão social pela distribuição de terras por parte do governo.
“As ocupações vão aumentar com a crise, podem escrever”, afirmou, ao salientar que o “inimigo principal” do MST passaram a ser as “grandes empresas multinacionais” do sector agrícola que actuam no Brasil.
Stedile avançou que o MST modificou recentemente a sua estratégia, passando a actuar contra as multinacionais do sector, em vez de ocupar grandes propriedades agrícolas improdutivas.
“Ocupar um latifúndio é muito fácil, o problema é mudar o modelo agrícola representado por essas empresas que plantam uma única cultura em grandes extensões de terra”, disse.
O líder do MST afirmou que a monocultura para fins de exportação, como a soja, por exemplo, utiliza grandes áreas, destrói a biodiversidade, faz uso de defensivos tóxicos e não cria empregos.
“Esse modelo depende do mercado externo, é predador do meio ambiente. Queremos um modelo que mantenha a diversidade de cultivos, use tecnologias ecológicas e que fixe as pessoas no campo”, disse.
Stedile acusou o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, de ter feito um “pacto com as elites” e de ter abandonado a defesa da reforma agrária dos tempos em que era líder da oposição.
“Achávamos que a eleição do Lula (em 2002) e o seu compromisso histórico, a reforma agrária seria levada adiante. Mas as forças maioritárias deste governo estão prioritariamente apoiando as grandes multinacionais”, disse.
“O Governo de Lula não é de esquerda nem de direita, é de composição. Ele se elegeu compondo com parte das elites, fez uma espécie de pacto para não mudar a política económica do governo anterior”, disse.
Stedile sublinhou que a crise económica diminuiu os investimentos estrangeiros no sector agrícola brasileiro, nomeadamente na produção de biocombustíveis a partir de cana-de-açúcar.
“O acordo diabólico assinado por Lula e Bush, em Março de 2007, previa a construção de 130 fábricas de etanol. Isso tudo está paralisado”, afirmou, referindo-se ao programa de cooperação assinado na visita do presidente dos EUA ao Brasil.
“Com a crise, vai haver um freio na expansão das plantações de cana-de-açúcar, o que abre espaço para a implantação de um projecto voltado para a população, não para abastecer automóveis nos EUA, Japão e China”, salientou.
Stedile disse ainda que o MST realizará uma série de manifestações esta semana para assinalar o chamado “Massacre de Eldorado de Carajás”, um dos mais violentos da história recente do país.
A 17 de Abril de 1996, foram assassinados 19 sem-terra pela polícia, na cidade de Eldorado de Carajás, no Estado do Pará, na região Norte do Brasil.
Depois de 13 anos, o processo judicial ainda continua parado e ninguém está preso.
Criado em 1984 por um grupo de trabalhadores rurais, o MST controla actualmente cerca de 100.000 famílias à espera de um lote de terra do Governo brasileiro.
Em 2007, último dado disponível pelo MST, foram realizadas 183 ocupações de propriedades rurais, em todo o país, número inferior à média de 238 ocupações anuais registadas entre 2003 e 2006.
MAN.
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