Os Troféus CentralComics (da responsabilidade do site com o mesmo nome) são votados online. Quanto aos Prémios Nacionais de Banda Desenhada (ex-Zé Pacóvio e Grilinho) são dados no âmbito do Festival de BD da Amadora. Antigamente eram votados por uma lista de especialistas que faziam parte da base de dados do Festival. Essas pessoas votavam em obras selecionadas previamente por um júri com poucos (cinco) elementos, tendo as editoras de enviar exemplares dos ditos para o Festival previamente, o que sempre me pareceu um disparate. É certo que os membros do júri podiam sempre propor para votação obras não enviadas, mas depender de ações individuais para uma coisa destas é preguiçoso por parte de um evento tão importante como o Festival. Mais recentemente o Júri passou a fazer um dois-em-um: selecionar nomeados e votar vencedores. Não percebo porque não saltam a fase da nomeação, mas, como disse na altura: acho preferível ter cinco responsáveis bem definidos do que um sistema menos transparente. Mas mantenho a crítica principal a estes prémios, que é a necessidade de haver candidaturas/envio de exemplares.
O que nos leva aos Prémios Profissionais de BD (PPBD).
Não aprecio particularmente o nome, mas pela aliteração, não pelo uso da palavra “Profissional”, que causou algumas reações jocosas. Embora perceba a crítica (enquanto proprietário de 25% da Livraria Dr Kartoon a mesma não me deu, até hoje e em dinheiro “vivo”, um cêntimo) estou de acordo com, por exemplo, David Soares, no sentido em que há profissionalismo em tudo o que os envolvidos fazem na BD. Prémios Amadores soaria pior, embora não fosse menos verdadeiro. Pode parecer uma baboseira, mas algo comum a todos os envolvidos (pró e contra) é gostarem, profunda e apaixonadamente, da banda desenhada. Se não gostassem a reação aos Prémios seria certamente menos ácida nalguns quadrantes, e menos entusiasmante noutros, há limites para o que a maledicência e a elação “puras” conseguem fazer. Diogo Semedo sugeriu (pelo menos li num comentário online pela primeira vez) que os PPBD se poderiam chamar informalmente “Os Geraldes” (em homenagem ao grande divulgador Geraldes Lino, do blogue DivulgandoBD). E podiam! A questão é que (como a Amadora percebeu com os Zé Pacóvio e Grilinho) esse tipo de “insider knowledge” não é útil para chegar fora do mundo estrito da BD num país onde ele é reduzido. Que deve ser, como me farto de repetir, o objetivo ÚNICO de coisas deste género. Pregar aos convertidos é a atividade mais inútil que conheço, sobretudo quando são poucos e, pior ainda, muitas vezes organizados em sub-“ghettos”. O que espero dos PPBD é que levem alguns leitores ocasionais a pensar pegar nos nomeados/premiados. E que se surpreendam.
Mas deixemos o nome, o que interessa são a mecânica e os resultados. Um júri de 25 individualidades ligadas à banda desenhada recebe uma listagem das obras relevantes (editadas em 2012), incluindo sempre que possível pdfs das mesmas. Se são especialistas Amadores/Profissionais de BD não devem precisar de “borlas” em papel. No mínimo, dadas as circunstâncias, vão a livrarias folhear… Cada jurado seleciona primeiro as várias obras/autores (quatro, no máximo) que acha devem ser nomeadas em diferentes categorias. As mais votadas entram numa lista de nomeados, votando as mesmas 25 pessoas agora apenas numa obra/autor em cada categoria. A organização (um conjunto de editores e críticos, que não vota) contabiliza os votos, e anuncia os premiados (5ª feira passada na Torre do Tombo). No próximo ano a lista de 25 pessoas deverá ser distinta.
Questões:
1- Quaisquer Prémios valem sempre o que o meio em que estão inseridos vale, do ponto de vista artístico, comercial, institucional. É bom não nos esquecermos disto.
2- Há mercado de BD em Portugal para três prémios com alcance nacional? Não. Os livros importantes são absolutamente óbvios em cada ano. Mas isso significa aceitar o “status quo”? Esta iniciativa só pode ser considerada boa, nem que seja para agitar as águas. Desde quando é mau haver alternativas?
3- Como referi logo no início, quando soube dos PPBD e fui convidado para ser jurado dos mesmos, vão ser precisas 3-4 edições para se fazer um balanço. E será útil comparar os vencedores dos vários prémios nacionais (embora não tenham exatamente as mesmas categorias) para saber da sua complementaridade/oposição.
4- Apenas são consideradas pelos PPBD obras de autores nacionais. No futuro talvez fosse de expandir.
5- Sabe-se que o número máximo de votos terá de ser 25, e é público e notório desde logo quem são esses 25, algo que, ou nunca aconteceu nos restantes prémios (pelo menos não me lembro de ver números totais de votos, quando muito percentagens), ou está reduzido a um universo de cinco votos. Isto é obviamente bom pelo alcance e transparência. Mas era útil a organização divulgar se, de facto, todos os 25 votaram (update: votaram 23). E quantos votos cada vencedor teve (update: não parece que vá ser divulgado; acho mal). Transparência, sempre.
6- Os jurados estão envolvidos com/na BD. Isso é bom (sabem do que falam) e mau (têm amigos/inimizades no meio). Mas não estou muito bem a ver como poderia ser diferente. É assim em todos os outros prémios, das Humanidades às Ciências. Cabe aos organizadores gerar uma lista equilibrada de 25 (não é tão difícil quanto parece, mas é crucial: 70% dos premiados podem ser decididos logo na escolha do júri). E depois, claro, presumir que todos os jurados vão levar a tarefa a sério. Que serão, numa palavra, profissionais….
7- A dimensão do mercado (ou a razoabilidade e abrangência dos 25 jurados, como quiserem) vê-se pela forma como a minha lista de nomeados foi quase idêntica à lista final.
Quanto aos Premiados, foram estes:
ÁLBUM DO ANO
O Baile – Autores:Joana Afonso (desenho), Nuno Duarte (argumento)
ARGUMENTISTA DO ANO
Nuno Duarte (O Baile)
DESENHADOR DO ANO
Joana Afonso (O Baile)
COLORISTA DO ANO
Joana Afonso (O Baile)
LEGENDADOR DO ANO
Mário Freitas (O Baile)
DESIGNER DE PUBLICAÇÃO DO ANO
Mário Freitas (O Baile)
ANTOLOGIA DO ANO
Zona Desenha (Associação Tentáculo)
WEBCOMIC DO ANO
Margem Sul (Pedro Brito)
8- Por outras palavras: “O Baile” deu baile. Desta lista “acertei” só duas (colorista e webcomic). Nada tenho contra “O Baile” (e admiro imenso o trabalho anterior de Nuno Duarte, e esta estreia de Joana Afonso). É um um livro muito importante, mas com demasiados temas fortes que não consegue aprofundar como mereciam.
9- A meu ver “Diário Rasgado” de Marco Mendes foi, de longe, o melhor livro de 2012. Tal como “Mesinha de Cabeceira 23” foi, e aí mesmo de muito longe, a melhor antologia. A “Zona Desenha” é uma publicação mais desigual, mas muito meritória. Os meus outros desacordos em relação aos vencedores não são de modo algum tão fortes.
10- São opiniões.
11- Que podem ser devidamente justificadas, e sujeitas a contraditório, como é óbvio. Mas os prémios eram previsíveis. Percebo perfeitamente porque os vencedores terão ganho, posso explicar, e nada tem a ver com “cunhas”. Quando quiser que ganhem os livros que eu ache mais importantes criarei eu próprio um prémio, e terei sempre toda a razão.
12- Gostei de descobrir os webcomics, e gostei particularmente do trabalho de Pedro Brito, claramente à frente dos restantes. “The Mighty Enlil” e “Story of GodZ” têm potencial, embora não me interessem muito do ponto de vista temático. Já quanto a “Os Positivos” acho (muito) melhores (enfim, não sei se será a melhor palavra…) as diatribes inflamadas do seu criador do que a BD em si.
13- Como sói dizer-se: para o ano há mais. Entretanto quem tiver chegado até aqui e não for do bendito “meio da BD” dê uma vista de olhos nos vencedores, quando puder (já agora no “Diário Rasgado” e “Mesinha de Cabeceira 23”). Vale a pena.
PS- Mário Freitas, da Kingpin (um dos organizadores dos PPBD, sem direito a voto) ganhou dois prémios diretamente, e “O Baile” é um livro seu. Maria José Pereira, da ASA (uma das organizadoras dos PPBD, sem direito a voto) tinha vários livros a concurso e não ganhou nada. Conclusões?
a)- Calhou, porque “O Baile” é superior aos livros da ASA nomeados.
b)- Mário Freitas levou avante os seus pérfidos desígnios maquiavélicos e/ou Maria José Pereira deixou-se levar como um anjinho.
Essencialmente a visão (final e resumida) sobre os PPBD vai depender de qual opção se escolhe aqui.