Se durante décadas a economia mundial era influenciada principalmente pelos EUA, nos últimos anos tem ficado também cada vez mais dependente da China. A potência asiática construiu e expandiu um império e tem sido o grande apoio da economia global em tempos de crise. Durante a grande recessão que se seguiu à crise financeira, por exemplo, foi o crescimento chinês a atenuar o impacto da tempestade económica e financeira nos EUA e Europa.
Mas há um reverso da moeda. O maior peso da China torna também o mundo mais dependente do que aconteça nesta que é a segunda maior economia do mundo. E os analistas já começam a fazer contas sobre os possíveis impactos que o surto de coronavírus originado naquele país possa ter no crescimento global e nos mercados financeiros. As medidas tomadas para conter a epidemia levaram à paralisação de fábricas que são essenciais na cadeia global de produção, encerraram lojas e deixaram cerca de 60 milhões de pessoas de quarentena naquele que é também um dos mercados emissores mais importantes para o turismo.
Para tentarem medir os potenciais estragos de um contágio do vírus à economia, os analistas têm traçado alguns paralelos com o que aconteceu durante o a epidemia de síndrome respiratória aguda grave (SARS) no início de 2003. Os economistas da Capital Economics estimam que “o crescimento global tenha sido cerca de um ponto percentual mais fraco no segundo trimestre de 2003 devido ao efeito do SARS”. Mas realçam que “houve depois uma recuperação mais forte de três pontos percentuais do que antes do surto de SARS pelo que a perda foi mais que recuperada”.
Mas, desta vez, o contágio dos problemas da economia chinesa ao resto do mundo pode ser mais rápido e provocar mais danos. É que desde esse ano de 2003 a influência chinesa aumentou de forma significativa, como se pode verificar em diversos indicadores.
Colosso económico
A China pesa cada vez mais na economia mundial. Os dados mais recentes do Banco Mundial, relativos ainda ao final de 2018, mostravam que o país valia quase 16% do PIB global. É a segunda maior economia do mundo e aproxima-se cada vez mais dos EUA, que ainda assim têm um peso de quase 24%.
A ascensão chinesa tem sido rápida: em 2003 o peso da China na economia global não chegava sequer aos 4%. Nesse ano, o PIB chinês era de 1,66 biliões (milhões de milhões) de dólares. Em pouco mais de 15 anos, a potência asiática conseguiu multiplicar esse valor para mais de 13,6 biliões de dólares.
Fábrica do mundo
Em 2003 a China estava longe da liderança no campeonato das exportações. As vendas de mercadorias ao exterior eram de apenas 438 mil milhões de dólares, um valor bastante inferior aos quase 725 mil milhões de dólares de exportações de bens por parte dos EUA. Mas a potência asiática acelerou bastante. Em pouco mais de 15 anos, o gigante conseguiu multiplicar as vendas de bens ao exterior para 2,49 biliões de dólares. Já o crescimento dos EUA tem sido mais moderado, com as exportações de bens a totalizarem 1,66 biliões de dólares.
Em cada 100 euros de produtos exportados no mundo, 13 euros são relativos a bens produzidos na China. O peso da potência asiática no comércio mundial mais que duplicou desde 2003. É da segunda maior economia do mundo que vem uma parte significativa das componentes que alimentam a indústria automóvel e eletrónica, por exemplo. Conter a epidemia de coronavírus obrigou a encerrar muitas fábricas na China, o que ameaça a produção em unidades industriais de outros países que dependem de fornecedores da segunda maior economia do mundo. Na Coreia do Sul, a construtora automóvel Hyundai já teve de encerrar fábricas devido à falta de peças. Já a Fiat admite a paralisação de unidades na Europa.
Motor do turismo
A China tem sido o grande motor do turismo mundial, que deverá ser afetado com as quarentenas no país. Mais ainda porque o surto de coronavírus decorreu durante as festividades do ano novo chinês. Os dados mais recentes (2018) apontam que os turistas chineses geraram quase 150 milhões de viagens para o exterior, mais 14 vezes do que no início dos anos 2000, de acordo com um estudo da consultora McKinsey.
Além de serem cada vez mais, os turistas chineses são também dos que mais gastam. Em 2003, o turismo proveniente do país asiático valia, em termos globais, 16,7 mil milhões de dólares. Os dados mais recentes mostram que esse valor se multiplicou por 15 para quase 258 mil milhões de dólares. Esses valores fazem indiciar que o impacto do coronavírus em setores como o das companhias aéreas possa ser significativo.
Maior setor bancário do mundo
Apesar do poderio e da presença global da banca americana, o setor bancário chinês é ainda maior. “À medida que a economia chinesa se expandia, cresceu também um grande sistema financeiro. O sistema bancário é agora o maior do mundo com uma dimensão de 40 biliões de dólares e o seu mercado de ações e obrigações são, respetivamente, o segundo e o terceiro maiores a nível mundial”, refere a McKinsey.
Aliás, as três maiores instituições bancárias na lista da Fortune 500 são chinesas (Industrial &Commercial Bank of China, China Construction Bank e Agricultural Bank of China). O quarto lugar é ocupado pelo americano JPMorgan e a fechar o top 5 dos maiores bancos está o chinês Bank of China, que ultrapassou o Bank of America. O maior banco europeu, o Santander, não vai além da décima posição neste ranking.
Mais empresas na lista dos gigantes globais
Na lista da Fortune das 500 maiores empresas globais (ordenadas por volume de negócios), a China conseguiu colocar quase 119 instituições, quase tantas como as americanas. Em 2003, o país asiático tinha bem menos Golias empresariais. O crescimento tem sido alicerçado não só pela expansão da economia doméstica, mas também por uma presença mais global das empresas chinesas. A State Grid, que é a terceira maior do país, é acionista de referência da portuguesa REN, por exemplo.
O aumento de dimensão e de influência global das empresas chinesas tem sido feito a uma velocidade relâmpago, acelerando após a grande crise financeira de 2008. Nesse ano, apenas 26 das 500 maiores da Fortune eram chinesas.