No auditório do Taguspark, em Oeiras, estão em cena várias peças de teatro: desde os “Monólogos da Vagina” à comédia “Man Talks”, passando por “Ruy, a História Devida”, com Ruy de Carvalho. Mas, ao final desta quinta-feira, o local foi palco de outra iniciativa. Teve um homem a falar, praticamente em monólogo, mas quem esperava que António Mexia fosse falar da sua história de vida ia ao engano.
O tema da palestra era “Liderança na Energia – Mitos e Realidades”, e marcou o regresso do antigo CEO da EDP à vida pública, depois de vários anos em que primou pela discrição, na sequência da sua saída da empresa no âmbito do caso judicial das rendas excessivas da EDP. Até hoje, António Mexia foi constituído arguido mas não acusado, mas os danos para a sua imagem são evidentes, num gestor que, durante mais de uma década, foi dos mais poderosos e admirados do País.
No âmbito dessa saída, e tal como descreveu o Expresso, Mexia fez um acordo para não trabalhar em empresas concorrentes da EDP durante um período, que terminou no final de 2023. Em janeiro, com convite público e algum afã mediático presente, o gestor surgiu atrasado mas sorridente, pela mão de Alexandre Fonseca, Ex-Presidente da Altice Portugal e administrador do Taguspark.
É ainda recebido por António Saraiva, ex-presidente da CIP e presidente do Conselho de Administração do Parque Tecnológico. Os cumprimentos são calorosos e António Mexia sorri enquanto os fotógrafos captam a imagem da sua entrada, já com conhecimento de que não o poderiam fazer dentro do auditório, quando começasse a palestra.

Em palco, Mexia falou durante pouco menos de uma hora. A solitária poltrona branca ficou vazia, com o orador sempre de pé, num registo que se foi soltando ao longo do tempo. A sua apresentação centrou-se sobretudo nos desafios portugueses e mundiais da transição energética, tendo como fio condutor seis “mitos” que procurou contrariar: “Temos tempo”; “A solução só implica dinheiro”; “As renováveis são caras”; “Temos já o desenho de mercado ideal para concretizar a transição”; “O preço da energia é um custo de contexto negativo em Portugal”; e, por último, “A geopolítica da energia é uma fatalidade”.
Em cada um destes pontos foi dando a sua visão com base em dados, contrariando estes mitos – “que são pegajosos” e geram “uma gosma nas ideias” – e fornecendo o contexto para essa sua opinião. Entre as ideias-fortes ficou a defesa de que “o nuclear não é solução para Portugal” e que até temos os meios mas nos falta uma coisa, a vontade. Defende a necessidade de um “ativismo”, no sentido de uma atuação virada para a ação, mais rápida e decidida. E que “Portugal tem um excelente ponto de partida” para a transição, devido ao seu mix energético e grande penetração de renováveis, entre outros fatores. Mas que, tanto em Portugal como na Europa, o tempo de decisão e a convição na ação são muito inferiores ao que sucede nos principais blocos concorrentes.
“A transição energética e digital são decisivas para responder aos dois maiores desafios do nosso tempo: as alterações climáticas e as desigualdades sociais”, afirmou já perto do fim, numa apresentação na qual lembrou por diversas vezes tanto a sua formação de economista como a sua experiência no setor, sem nunca mencionar sequer a palavra EDP.

Quando pediu mais “ativismo”, esclareceu, é num sentido de urgência de atuação e de cooperação na ação. Mas não se furtou a um comentário acerca dos ativistas que têm atacado governantes e responsáveis de empresas de energia. “Prefiro um ativista que me possa atirar tinta aqui para o palco do que um negacionista das alterações climáticas. O maior problema é o da inação”, conclui.
À saída do palco, foi rodeado de jornalistas. Sorrindo, escusou-se a falar deste seu regresso à vida pública, da atualidade ou do seu futuro profissional, alegando querer que fosse dado ênfase aos temas que tinha focado em cima do palco.
Os próximos tempos o dirão.