Enquadrado pelas embalagens de vidro gigantes que servem de depósito de cremes mas também de decoração da loja, Pierre Starck leva-nos numa viagem por uma marca (quase, quase) centenária que já não fala apenas português. Nascidos na fábrica Nally, e vendida na perfumaria Benamôr, que lhes daria nome, os cremes que prometem atrasar o aparecimento das rugas e garantir mãos hidratadas estiveram quase a desaparecer, mas ganharam novo fôlego em 2015. E hoje, sete anos depois, abrem caminho noutras geografias, quais portugueses dos tempos primordiais em busca de novas terras e aventuras. Tal como há décadas, os produtos continuam a ser criados na fábrica em Alenquer, as bisnagas de alumínio na Sociedade Artística em Monção – a parceria já tem 90 anos – e as caixas de papel em Braga.
“Há um enorme respeito pelo que foi feito até agora, pela tradição e até pelo design da época”, que continua a colorir as embalagens. “O processo de fabrico é o mesmo de sempre, o enchimento das embalagens é feito de forma manual e com muito cuidado e reflete todo o conhecimento das pessoas que trabalham connosco há várias gerações”, continua o CEO da Benamôr que, com o sócio Filipe Serzedelo, deu um novo rumo à marca queridinha da rainha D. Amélia – ou pelo menos assim reza a lenda.
E é num português pintado de sotaque francês que Starck justifica o sucesso crescente da Benamôr. “Foi o primeiro creme de rosto nacional e mantém a mesma estrutura desde 1925. Os ingredientes são praticamente os mesmos, exceto os que foram preciso alterar ao longo do tempo para cumprir as regras europeias. E 98% deles são naturais. O creme de rosto Benamôr é um caso único na cosmética mundial”, e isso torna a marca particularmente apetecível, numa altura em que, como explicámos no texto anterior, os consumidores procuram consistência, memórias, segurança. “A raiz da longevidade da marca é a qualidade”, assegura o responsável, que durante três anos namorou o antigo dono da Benamôr para conseguir comprar-lhe a marca. Quando, finalmente, o convenceu, em 2015, tinha três referências – creme de rosto, creme de corpo e creme de mãos – e muito conhecimento na estrutura. Olhando para casas como a L’Occitane, referência na perfumaria e cosmética mundiais, Starck sabia também que tinha nas mãos um verdadeiro tesouro.
O creme de rosto Benamôr é um caso único na cosmética mundial
pierre stark, ceo da bênamor
“A marca conta uma história, com a sua fábrica, os produtos feitos à mão; tem muita qualidade, utilizando sobretudo produtos naturais e tentando melhorar sempre as suas técnicas e é sustentável: 85% das embalagens são de alumínio, um dos produtos mais recicláveis do mundo da cosmética, que permite uma poupança de 92% de energia a partir da primeira reciclagem, mantendo todas as suas propriedades”, explica.

Atentos ao mercado, lançaram, em 2019, a opção de “refill” de alguns produtos – daí os frascos de vidro em tamanho gigante. “Vendemos alguns cremes em garrafas de 500 ml que as pessoas podem voltar a encher numa das nossas lojas, por um preço mais baixo.” Uma opção que podem tomar sem pôr em causa a qualidade dos produtos graças à proximidade com a fábrica.
“A exigência no mercado da cosmética é muito elevada. É preciso sermos exigentes, funcionais e temos como principal objetivo conseguir que as pessoas voltem a comprar assim que o produto acaba. Na verdade, esse é o desafio de qualquer marca de cosmética”, continua o gestor. “Isso significa que temos de ser superinovadores, superexigentes e muito equilibrados em termos de imagem”, continua. Daí a opção por manter o design Art Déco da Benamôr, com algumas alterações subtis que permitam um equilíbrio entre a tradição e a contemporaneidade do mercado.
Essa manutenção da imagem também permite aos sócios detentores da marca explorar um dos eixos fundamentais para a Benamôr: a ligação emocional entre gerações. São muito poucos os portugueses que não se lembram de ver as avós ou as mães a usar, pelo menos uma vez, um creme desta marca e poder regressar a ele é também uma espécie de regresso à infância – e, lá está, à história partilhada. E apesar de não ser possível capitalizar internacionalmente essa emoção da memória, a verdade é que a Benamôr já conseguiu entrar em 30 países em apenas seis anos. Fora da Europa, o destaque vai para a China e a Coreia do Sul, os EUA, o Chile e o Brasil, onde espera chegar este ano. “A batalha começa agora”, atira com um sorriso Pierre, enquanto explica que quer mesmo fazer da Benamôr a marca que todos ofereçam de presente, dentro ou fora de Portugal.
“Temos a oportunidade e a qualidade.” Portanto, seria um ótimo presente para o centenário, que se celebra em 2025, ter feito da Benamôr uma marca cosmética mundial. Nos planos, como primeiro passo, está abrir uma loja própria na vizinha Espanha… Porque não?
Este texto integrou o trabalho “As Fénix Renascem”, publicado originalmente na edição da EXAME de maio de 2022