Estes e outros dados constam do estudo “Igualdade de Género ao Longo da Vida – Portugal no contexto europeu”, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, e da autoria de sete investigadores, divulgado esta segunda-feira e ao qual a Lusa teve acesso.
Em declarações à agência Lusa, a coordenadora do estudo salientou que uma das novidades desta investigação está no facto de trazer uma perspetiva prolongada no tempo, estudando três fases da vida, desde a infância e juventude (entre os 15 e os 29 anos), passando pela ‘rush hour of life’ (dos 30 aos 49 anos) e terminando na fase tardia da vida ativa (dos 50 aos 64 anos).
De acordo com Anália Torres, uma das constatações que “chocou perceber” foi que apesar de as mulheres serem, em média, mais escolarizadas do que os homens, entram no mercado de trabalho em desvantagem, ganhando salários mais baixos e com empregos mais precários, um fenómeno que em Portugal é “bastante acentuado”.
Particularmente na ‘rush hour of life’, a “jornada de trabalho das mulheres é pesadíssima”, com elas a acumularem horas do emprego com as horas de trabalho doméstico ou de assistência à família, sendo as mães portuguesas “as que mais trabalham na Europa”.
“Em todos os países da Europa e em todas as profissões, as mulheres ganham menos do que os homens”, constatou a coordenadora do Centro Interdisciplinar de Estudos de Igualdade de Género da Universidade de Lisboa.
Apesar de a ‘rush hour of life’ ser a fase da vida em que os salários/hora são mais elevados, os homens e as mulheres portuguesas “são dos mais mal pagos no contexto europeu”, sendo as mulheres “especialmente atingidas pelos salários baixos”, já que “em todos os países analisados os homens têm um salário médio/hora superior ao das mulheres”.
Anália Torres destacou ainda que o fosso salarial entre homens e mulheres em Portugal atinge tanto os salários mais elevados como os mais baixos, havendo nos quadros dirigentes uma diferença salarial que ronda os 600 euros.
De acordo com o estudo, em Portugal, a maior disparidade salarial regista-se entre os representantes do poder legislativo e de órgãos executivos, dirigentes, diretores, gestores e executivos (586 euros), seguindo-se os trabalhadores qualificados da indústria, construção e artífices (364 euros) e os operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da montagem (353 euros).
O fosso salarial atinge também os trabalhadores não qualificados, havendo uma diferença de 203 euros entre os salários de homens e mulheres.
“É brutal, é muito dinheiro, e nos salários baixos esta desigualdade é fortíssima”, sublinhou Anália Torres.
O estudo constatou que as desigualdades se mantêm ao longo da vida e ao chegar à fase tardia da vida ativa, as mulheres têm pensões mais baixas, consequência de terem descontado menos, já que tinham salários mais baixos.
São também elas que muitas vezes saem do mercado de trabalho mais cedo, frequentemente para dar assistência à família, seja filhos, netos ou pais idosos, o que faz com que tenham uma carreira contributiva mais curta.
“A probabilidade de, no fim da linha, entrar na pobreza, é grande”, salientou Anália Torres.
Para a coordenadora do estudo, para se conseguir acabar com as desigualdades é preciso primeiro ter consciência que elas existem, apontando que às vezes pode haver alguma resistência devido à ideia de que muita coisa mudou em relação ao passado.
“Acho que o estudo traz uma consciência real para perceber que de facto, apesar de muita coisa ter mudado, há ainda um longo caminho a percorrer”, defendeu a investigadora.
Nesse sentido, deu como exemplo a família, apontando que tanto homens como mulheres deveriam ter as mesmas condições para constituir família e cuidar dos filhos e que as chamadas tarefas domésticas não têm género.
Sublinhou, por outro lado, que há uma “batalha” a fazer junto das empresas para as convencer da necessidade de haver discriminação positiva, defendendo que também aqui haja quotas na distribuição dos cargos diretivos.
Lusa