O presidente executivo da EDP nega que a elétrica esteja a beneficiar de rendas excessivas ao abrigo dos Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC) e argumenta que o decreto-lei que estabeleceu este mecanismo não só remonta a 2004 como teve entretanto a luz verde de Bruxelas e a autorização legislativa pelo Parlamento.
“As avaliações anuais da ERSE sobre os CMEC (…) confirmam mais uma vez a inexistência de rendas excessivas à luz do decreto-lei de 2004,” afirmou esta quarta-feira, 2 de maio, António Mexia, referindo-se a alegadas conclusões do regulador a que a elétrica diz só ter tido acesso “por estarem no site do Parlamento, a pedido do PCP.”
Em declarações aos jornalistas em Lisboa, à margem do fórum “The Sustainable Energy for All”, o CEO da energética acrescentou que aquela avaliação anual “não tem nenhumas reservas sobre alterações introduzidas em 2007 ou posteriores,” que, reforça, se “limitaram a implementar aquilo que é a legislação de 2004.” “Nas avaliações da ERSE não há nenhuma reserva em relação àquilo que foi a pura implementação do Decreto-Lei de 2004 em 2007,” insistiu.
Segundo os documentos publicados no site do Parlamento, nos últimos anos a ERSE deu pareceres “de um modo geral” favoráveis à determinação do ajustamento anual dos CMEC. Pareceres que são dados tendo em conta o decreto-lei 240/2004, o mesmo que estabeleceu as regras destes mecanismos. Contudo, no parecer emitido em 2004 em relação ao projeto de decreto-lei que criou os CMEC, a ERSE chamava a atenção para que o documento suscitava “numerosos problemas que devem ser cuidadosamente ponderados”, nomeadamente o aumento “da receita dos produtores vinculados e da entidade concessionária da RNT face à situação atualmente [então] existente (CAE) à custa dos consumidores”.
O processo legislativo e os procedimentos administrativos na base deste regime transitório (aplicável aos produtores de energia elétrica que acordaram a cessação dos contratos de aquisição de energia – CAE – dos seus centros eletroprodutores com a REN) estão no centro do inquérito dirigido pelo Ministério Público do Departamento Central de Investigação e Ação Penal e que em junho do ano passado constituiu António Mexia como um dos arguidos.
“[Estou] perfeitamente tranquilo sobre o assunto. Não falo sobre o processo,” acrescentou hoje aos jornalistas nas declarações transmitidas pela SIC Notícias, e dias depois de o Observador noticiar que Manuel Pinho, ex-ministro da Economia do Governo Sócrates, terá recebido cerca de um milhão de euros do saco azul do BES, incluindo no tempo em que era ministro, e que o antigo presidente do BES, Ricardo Salgado, passou a arguido neste processo. Segundo aquele órgão, suspeita-se de que Pinho teria beneficiado BES e EDP.
Em entrevista recente à VISÃO, António Mexia tinha-se demarcado da aprovação das condições dos CMEC, argumentando que as bases foram aprovadas em 2004 – quando ainda não estava na elétrica – “Os CMEC são um assunto de 2004. E não de 2007”, afirmou, numa referência ao ano em que a fórmula de cálculo daqueles instrumentos ficou concluída e a compensação começou a ser posta em prática. Em dez anos, este mecanismo terá valido mais de 2,5 mil milhões à elétrica, segundo contas do Observador.
Na semana passada, o presidente do PSD, Rui Rio, tinha proposto a ida de Manuel Pinho ao Parlamento para explicar os alegados recebimentos enquanto ministro. E esta quarta-feira o Bloco de Esquerda formalizou a proposta de criação de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar as rendas excessivas aos produtores de eletricidade, com que, entre outros, se pretende apurar “a existência de corrupção de responsáveis administrativos ou titulares de cargos políticos com influência ou poder na definição destas rendas”.
Deverá ser no âmbito desta comissão que Pinho será chamado ao Parlamento, mas a sua defesa já fez saber que o ex-ministro só falará sobre o processo quando for ouvido pelo Ministério Público, algo que não terá acontecido desde que foi constituído arguido, em julho do ano passado.
Esta segunda-feira vários meios de comunicação social noticiaram que o Governo aceitou a recomendação da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) para cortar em 102,4 milhões de euros o valor a receber pela EDP pelos CMEC até 2027 (ano até ao qual os contratos para remuneração garantida de 16 centrais da EDP cessam gradualmente), passando esta componente variável para 154,1 milhões de euros – em vez dos 256,5 milhões contabilizados pela REN. A este valor acresce ainda uma parcela fixa de 675 milhões de euros ao longo do período 2017-2027.
(notícia atualizada às18:52)