Quando, há dois anos, a fotojornalista Martha Cooper expôs as suas fotografias de grafítis em comboios, na galeria Underdogs, em Lisboa, fez questão de conhecer Luísa Cortesão.
Aos 72 anos, esta americana, que foi a primeira mulher a documentar o grafíti, desde os finais dos anos 1970, nunca conhecera ninguém que tivesse começado na Arte Urbana tão tarde. De mochila às costas, Luísa Cortesão, 65 anos, entusiasma-se com o barulho das latas de spray enquanto é fotografada para a VISÃO.
Mãe da artista plástica Rosa Pomar, autora do livro Malhas Portuguesas e dona da loja Retrosaria, Luísa Cortesão aceitou a dica da filha, quando esta lhe contou que estavam abertas as inscrições para “um workshop de street art para velhinhos.” Faltou ao primeiro dia do Lata 65, mas apareceu no seguinte.
Entusiasmou-se com a aula de stencil, que tinha o artista Adres como professor.
E logo fez o seu primeiro cartão recortado com a forma de uma velhinha marreca, com uma lata de spray na mão, que viria a servir de molde para as suas pinturas nas paredes como a que pintou atrás de um mural do SAM3, em Marvila.
O programa do Lata 65, workshop saído do Woolfest Festival de Arte Urbana da Covilhã, e vencedor do orçamento participativo de Lisboa, em 2013, foi delineado por Lara Seixo Rodrigues, na altura “cheia de dúvidas sobre as capacidades dos idosos “, apesar de os considerar as pessoas com mais tempo e mais interesse por este género de atividade artística. No final de cada curso, de uma coisa tem a certeza: “Quanto mais estranhos forem os desenhos mais giros ficam nas paredes.” As bruxas montadas em vassouras são a imagem de marca de Luísa Cortesão, que já se proclamava feiticeira quando brincava com as filhas, e mais tarde, com as netas.
“Costumava dizer-lhes: ‘Quando tiverem 8 anos, ensino-vos a voar com a vassoura'” Enquanto para Lara Seixo Rodrigues o grafíti é trabalho, para Luísa Cortesão é um prazer e uma brincadeira a que está atenta desde os anos 1990, quando o artista francês Nemo’s passou pelo nosso país e “deixou nas paredes de Lisboa a marca repetida, mas sempre diferente, de uma intrigante silhueta negra, de chapéu, gabardine e pasta de executivo”, como se escrevia na Revista do semanário Expresso. Luísa recorda os desenhos de Minimal Animal no Cais do Ginjal, ou os de Exas na Cruz Quebrada, quando viajava de comboio na Linha de Cascais para ir dar consultas a Carcavelos. Foi médica até aos 59 anos, quando um problema de saúde a atirou para a reforma, de um dia para o outro. Passou a ter tempo para ler, passear, cuidar das netas e grafitar paredes.
Luísa Cortesão sempre foi uma mulher ligada às novas tecnologias. Fez um site de educação terapêutica para os seus pacientes com gifs animados, mais tarde teve um blogue e, em 2001, sem a existência do skype, magicou um site para comunicar com a filha Rosa, que frequentava em Nova Iorque um curso de ilustração.
O seu gosto pelo desenho vem da infância, quando, por volta dos 6 anos, juntamente com os dois irmãos, brincava com o linóleo velho da sala para criar fanzines para a família.
Hoje em dia, não hesita em dizer que “ser mulher entre os artistas é uma vantagem, mas ser velha é melhor”. No primeiro workshop em que participou como professora, vibrou ao ver as pessoas desenvolverem uma nova aptidão, aprendendo a olhar para as coisas de outra maneira. “O stencil é a metáfora perfeita para isto tudo. Deixas ficar o que habitualmente se deita fora.
É preciso inverter o modo de pensar.”