Ao jardim de Belém chegámos à hora que José Maia Moreira, 48 anos, padre do Opus Dei e capelão num colégio em Telheiras, terminava o pequeno turno de duas horas, das 14 às 16, dedicado em exclusivo à confissão. “Ao inscrever-me na jornada quis logo reservar lugar num dos 150 confessionários. Não há maior alegria do que ser instrumento do perdão”, justifica.
Ao longo de duas horas, José Maia Moreira deve ter ouvido cerca de uma vintena de fiéis católicos: os que gostam de falar e pedem perdão por coisas específicas, outros mais demorados, com maior dificuldade em falar e que precisam de mais conselhos.
A maior parte dos pecados inserem-se nas temáticas dos Mandamentos da Lei de Deus: amar a Deus sobre todas as coisas; não tomar o seu santo nome em vão; guardar os domingos e dias santos; honrar pai e mãe; não matar; não pecar contra a castidade; não furtar; não levantar falso testemunho; não desejar a mulher do próximo; não cobiçar as coisas alheias – recomendações com três mil anos. A estes pecados, seguramente, se juntarão os sete pecados mortais: soberba, avareza, inveja, ira, luxúria, gula e preguiça.
Há meia dúzia de filas disponívies, consoante a língua – as pessoas podem confessar-se em francês, castelhano, português, italiano, inglês, outras e língua gestual, com a língua portuguesa a ter a mais longa espera. Mesmo à torreira do sol, estão pessoas há mais de uma hora à espera de chegar ao confessionário.
Estes 150 confessionários com dois assentos cada são uma verdadeira instalação artística no âmbito de arquitetura religiosa. Alinhados da forma certa, numa determinada perspetiva que permite perceber o desenho da cruz inclinada, como Cristo a carregou às costas a caminho da crucificação.
As pequenas contas da dezena, aro que se coloca num dos dedos e que se roda com o polegar para rezar um mistério, são as aberturas do confessionário que permitem ver de fora para dentro e vice-versa.
Este é um confessionário sem divisória entre pároco e fiel, aberto, fomentando a proximidade com os jovens, olhos nos olhos, um dos apelos feitos pelo Santo Padre nos seus mais recentes discursos.
A autora desta obra é Daniela Luís, voluntária e coordenadora da equipa de voluntários do Parque do Perdão, mas também arquiteta. Foi a responsável por passar o esboço de Helena Silva, outra voluntária, mas com emprego na área financeira, para um protótipo que depois fosse construído, com materiais recicláveis, por reclusos de estabelecimentos prisionais de Paços de Ferreira, Porto e Coimbra, onde existem carpintarias. Um exemplo replicado da jornada na Cidade do Panamá.
Lá atrás na fila, Eloísa Fernandes integra um grupo de freiras, Escravas da Eucaristia e da Mãe de Deus, a maioria de Cabo Verde, congregação com presença em nove países.
Mora no Porto, numa residência de uma comunidade religiosa, perto da Rotunda da Boavista, e a cada duas semanas está perdoada dos pecados, com a confissão mais amiúde. “São momentos de graça. É como se Deus me estivesse a abraçar de cada vez que me confesso. Não vim aqui despejar, mas sim contactar com a misericórdia de Deus. Se ao menos as pessoas se questionassem mais e se deixassem tocar por Deus…”, desabafa a irmã.
A poucos dias de fazer 50 anos, Rita Horta e Costa veio acompanhada pela filha e pela afilhada, meninas de 13 e 10 anos. Estão de férias e, por ser um acontecimento único em Portugal, quiseram estar presentes. Catequista e responsável por missões com crianças e jovens, Rita está habituada a confessar-se sempre com a mesma pessoa, mas agora quer estar em paz e quando vir o Papa na missa final quer estar perdoada.
Em amena cavaqueira, Isabel da Cunha, 19 anos, e António Pascoal, 21, vão avançando lentamente na fila. São voluntários da jornada – ela na área de segurança nos eventos centrais, ele em logística de palco – e aproveitaram a folga para ir ao confessionário.
Desde a Páscoa que não têm falado dos seus pecados com ninguém, culpas que andam muito à volta das omissões – rezarem menos do que deveriam, invejas, pequenas mentiras piedosas. Isabel classifica a confissão como gratificante, António sente-se agradecido, até porque nem sempre defende tanto a igreja com é suposto.
O mais curioso desta dupla é não serem namorados, nem familiares, nem amigos – pelo menos por enquanto, pois acabaram de se conhecer na fila. Dois jovens que fazem parte da “juventude do Papa”, o grito mundial da última semana.