D. João V exibia virtudes públicas assentes numa religiosidade extremada, mas tinha vícios privados perversos, como o assédio a jovens freiras. Torrou o ouro do Brasil em luxos e despesismos, sem obra que se visse, enquanto o povo mal conseguia sobreviver. Até que ponto é justo este retrato?
Foi esse o meu ponto de partida, o retrato de um rei beatão com “energias estranhas”. Mas é preciso olhá-lo dentro de diversos contextos. Sim, não deixou obra que se visse, mas grande parte dos seus investimentos foram feitos em coisas invisíveis. D. João V tinha uma academia para artistas portugueses estudarem em Roma, é um precursor das bolsas que hoje conhecemos, de investigação e de estudos, comprou bibliotecas inteiras e a do Paço era considerada a maior e a melhor da Europa. Olhamos muito para a figura do rei autoritário e senhor absoluto, e para os seus vícios privados, que obnubilaram por completo todas as outras realizações, que são pré-iluministas, que vêm abrir o caminho ao marquês de Pombal em muitos aspetos.