Um novo estudo científico desenvolvido por investigadores da Universidade de Harvard revelou novas particularidades surpreendentes do cérebro humano. A equipa de cientistas usou uma pequena amostra de tecido cerebral – de apenas um milímetro cúbico – para criar a maior reconstrução 3D do cérebro de sempre, que mostra, em detalhe, as cadeias de ligações estabelecidas entre as células cerebrais. Através da pequena amostra – pertencente a mulher de 45 anos com epilepsia – os investigadores puderam observar cerca de 57 mil células, 150 milhões de sinapses e 230 milímetros de vasos sanguíneos, presentes no córtex temporal.

O tecido cerebral da amostra – partido em pedaços de espessura semelhante à do cabelo humano – foi submetido a análises ao microscópio, de forma a captar da melhor forma possível os detalhes da estrutura cerebral até à nanoescala. Publicado na revista científica Science, o estudo juntou cientistas da Universidade de Harvard com especialistas da Google Research. Após as observações realizadas em laboratório, os cientistas recorreram a algoritmos de Inteligência Artificial, produzidos pelos especialistas da Google, capazes de mapear os caminhos dos neurónios no cérebro e de reconstruir as estruturas complexas do cérebro. “O objetivo era obter uma visão de alta resolução desta parte mais misteriosa da biologia que cada um de nós carrega às costas. A razão pela qual não o fizemos antes é o facto de ser um desafio enorme. Foi realmente muito difícil fazer isto”, explicou o professor de biologia molecular da Universidade de Harvard, Jeff Lichtman
De acordo com as suas conclusões, os cientistas observaram que os chamados “neurónios piramidais” mostraram uma curiosa simetria, com alguns dos seus ramos – chamados de dendrites – virados para diferentes direções. No mesmo sentido, as imagens tiradas através do microscópio mostraram também algumas espirais axónios – as fibras que transportam sinais de uma célula cerebral para a outra – gerando alguns padrões curiosos.
Por fim, recorrendo ao mapa foi ainda possível perceber as ligações que os neurónios estabelecem com outras células. Ao todo, os cientistas concluíram que mais de 96% dos axónios presentes estabeleceram uma ligação com apenas uma célula, e cerca de apenas 3% estabeleceram duas ligações. Apesar de poucos, alguns neurónios estabeleceram também dezenas de ligações, chegando um só caso a atingir as mais de 50 ligações entre um neurónio e uma célula, algo nunca antes observado na estrutura do cérebro.
O grupo de cientistas responsáveis pelo estudo acredita que as observações retiradas podem vir a ajudar a explicar alguns comportamentos humanos mais “automatizados”. Por exemplo, o ato de tirar o pé do acelerador ou de travar num sinal vermelho, são ações que requerem pouco raciocínio após algum tempo de prática. “Penso que estas ligações poderosas podem fazer parte do sistema de informação aprendida e do aspeto da aprendizagem no cérebro”, referiu Lichtman.
A equipa de especialistas disponibilizou o conjunto de ferramentas utilizadas no estudo ao público para que outros investigadores as possam utilizar nas suas investigações. “Dado o enorme investimento feito neste projeto, era importante apresentar os resultados de uma forma que permitisse a qualquer pessoa tirar partido deles”, contou Viren Jain, um dos colaboradores da Google envolvido no estudo.