O processo de transferência do controlo das fronteiras aeroportuárias dos inspetores da Polícia Judiciária (PJ) para a PSP “não está a correr bem”, revela à VISÃO Rui Paiva, do Sindicato dos Profissionais de Investigação Criminal da PJ (SPIC/PJ). O problema, diz o dirigente sindical, está “na falta de agentes da PSP” para substituírem os elementos do extinto SEF que, entretanto, foram integrados na PJ, mas que, por agora, se mantêm em funções nos aeroportos.
“O papel destes elementos da PJ (ex-SEF) seria, apenas, de transmitir conhecimentos e dar o apoio necessário aos agentes da PSP colocados nos aeroportos, mas que não tinham experiência naquelas funções. O que acontece, na realidade, é que a larga maioria das forças de segurança que, hoje, controlam as fronteiras aeroportuárias continuam a ser estes elementos da PJ (ex-SEF), uma vez que não há agentes da PSP para que essa transição seja feita”, diz Rui Paiva.
Em resposta às perguntas da VISÃO, a direção nacional da PSP esclareceu que já estão habilitados “393 polícias na valência de controlo da fronteira aérea”, mas admitiu que, neste momento, apenas “265 agentes da PSP” prestam este serviço “em regime de exclusividade”, menos de metade dos 700 elementos das forças de segurança afetos aos aeroportos portugueses. O objetivo seria, no final deste processo, aumentar este número para mil polícias.
“Já manifestámos, várias vezes, que para passarmos o conhecimento têm de haver pessoas da PSP nos locais. Se, neste momento, a PSP não preenche sequer 50% do efetivo, que é o mínimo que defendemos, como é que vamos fazer esta passagem de testemunho? Se está previsto na lei que o controlo estratégico, tático e operacional das fronteiras aeroportuárias é da competência da PSP, que sentido faz termos, atualmente, 70% de pessoas da PJ e 30% da PSP?”, questiona Rui Paiva.
O calendário definido pelo Ministério da Administração Interna (MAI) prevê que a transição do controlo das fronteiras aéreas – da PJ (ex-SEF) para a PSP – esteja concluído a 50% no final de 2024 e a 100% em outubro de 2025. Segundo Rui Paiva, “isso não vai ser possível a este ritmo”. “Se a lei prevê um período de transição de dois anos, têm de lá estar pessoas para que os conhecimentos sejam passados. Assim, nem a PSP assume as funções nos aeroportos, nem a PJ pode utilizar os seus novos elementos [oriundos do SEF] em funções de investigação criminal”, lamenta o dirigente do SPIC/PJ, sindicato recém-criado, e que absorveu os ex-SEF da PJ.
PSP desvaloriza críticas…
Contactada pela VISÃO, a direção nacional da PSP não reconhece o problema e faz um balanço “muito positivo” do processo, dando como exemplo “três momentos recentes e distintos”: a Jornada Mundial da Juventude, o Verão e o Inverno IATA/2023. “Nestes momentos, de elevada exigência e complexidade operacional (aumento substancial do número de voos e de passageiros), não se verificaram disrupções nos nove postos de fronteira à responsabilidade da PSP. Por outro lado, a mútua cooperação operacional entre a PSP e a PJ tem sido ajustada às necessidades da operação”, informa a PSP.
A PSP assegura que o calendário para a transição do controlo das fronteiras aeroporuárias para aquela polícia será cumprido dentro do previsto pelo governo. “Como é público, é intenção da PSP assegurar que todos os polícias da PSP que operam em aeroportos detenham uma dupla capacitação técnica: segurança aeroportuária e controlo fronteiriço”, refere, prevendo “a formação de mais 250 guardas de fronteira” ao longo deste ano. “A este ritmo, estamos convictos que será possível assegurar que o efetivo total da PSP nos nove postos oficiais de fronteira (aproximadamente um milhar de polícias) detenha a dupla capacitação funcional”, assegura, confirmando outubro de 2025 como o prazo previsto para o processo ficar concluído.
… mas sindicato da PSP confirma problemas
Apesar da confiança da PSP, Paulo Santos, presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), admite a existência de problemas, confirmando à VISÃO a falta de elementos da PSP para o serviço de controlo das fronteiras aeroportuárias.
“As esquadras da PSP já estão desfalcadas, a partir do momento em que se atribuem mais missões aos polícias, neste caso nas fronteiras, é evidente que se torna impossível assegurar todas as funções. Precisávamos de muito mais gente, na área da segurança e na das fronteiras”, reclama.
Paulo Santos explica esta situação com os problemas “de de raiz que existem na PSP”, principalmente “a falta de atratividade da carreira de polícia”, confirmada com “a incapacidade de preencher as vagas nos últimos concursos da PSP”.
“Andamos há dois anos a falar deste problema e da forma como ele está a prejudicar o serviço. É fácil dizer que a PSP não tem capacidade para assegurar as funções nos aeroportos. É verdade… mas há falta de agentes da PSP em todo o lado, não é só nos aeroportos. Podemos abrir os concursos que quisermos, que cada vez vão aparecer menos pessoas interessadas em ir para a polícia. Como é que a PSP pode responder a estes problemas se o Governo não dá instrumentos para resolve-los? Isso é que não percebo”, afirma.
O presidente da ASPP/PSP acredita que “só com a revisão das tableas salariais, dos suplementos, só com os governantes a tratarem os elementos da PSP com a mesma dignidade como são tratados os da PJ, ex-SEF, que trabalham lado a lado nos aeroportos, é que podemos responder, de forma correta, aos desafios que nos são impostos”. Recorde-se que os polícias, nas últimas duas semanas, têm levado a cabo protestos à porta da Assembleia da República para exigirem melhores condições de trabalho.