Silêncio da Procuradoria geral da República, papel do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), processo de averiguações à procuradora Maria José Fernandes e as palavras do ex-presidente do SMMP, António Ventinhas, sobre o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva. Foram estes os temas que dominaram os “pontos prévios” da última reunião (22 de novembro) do Conselho Superior do Ministério Público, órgão máximo desta magistratura, na qual os membros não magistrados tentaram colocar em discussão alguns aspetos da “Operação Influencer”, mas nem a Procuradora-geral, Lucília Gago, nem os magistrados deste órgão pretenderam aprofundar.
De acordo com vários relatos recolhidos pela VISÃO, após ter dado início à reunião de 22 de novembro, Lucília Gago perguntou se existam pontos prévios à ordem de trabalhos estabelecida. Após algum silêncio, o advogado Tiago Geraldo, membro designado pela ministra da Justiça, interveio, declarando ser impossível fugir do assunto que está na ordem do dia: a Operação Influencer, que levou às detenções de Diogo Lacerda Machado e de Vítor Escária, chefe de gabinete de António Costa, entre outros arguidos.
Para este membro do CSMP – sócio da sociedade de advogados Morais Leitão, um dos alvos das buscas da Operação Influencer e com dois advogados constituídos arguidos – este órgão, apesar de lhe estar vedada a discussão de casos concretos, tem competência para debater o funcionamento do Ministério Público, uma vez que a sua a sua atuação pode colocar em causa o prestígio da magistratura. Com os procuradores em silêncio, Tiago Geraldo criticou o facto de, nas últimas semanas, ter sido o SMMP a surgir publicamente como porta-voz da Procuradoria-geral da República quando, na sua opinião, a comunicação com os cidadãos deveria partir da instituição.
Lucília Gago interveio na discussão apenas para dizer que, na sequência de uma participação do diretor do Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Francisco Narciso, tinha sido aberto um processo de averiguações ao artigo da procuradora-geral adjunta Maria José Fernandes, publicado no jornal Público.
No texto, recorde-se, a partir da pergunta “Ministério Público: como chegamos aqui?”, Maria José Fernandes desfiou várias críticas ao atual estado de alguma investigação criminal: “procuradores que não hesitem em meios de recolha de prova intrusivos, humilhantes, necessários ou não, são o top da competência! Outros magistrados de elevado escalão que seguem esta linha argumentativa e a verbalizando no discurso público também têm o elogio garantido. Pelo contrário, quem se opõe à estridência processual é rotulado protetor dos corruptos!”
A procuradora defendeu, sobretudo para o DCIAP, onde têm decorridos várias investigações com forte acompanhamento mediático, como a “Operação Influencer”, mais “pensamento crítico”, “discussão interdisciplinar, nomeadamente com colegas de outras jurisdições tocantes ou conexas”. Porém: “Temo que se tornem cabines herméticas, onde pontuam algumas prima donnas intocáveis e inamovíveis e onde a “falta de meios”, de peritos disto e daquilo é sempre a velha razão para os passos de tartaruga a que se movem as investigações”.
Curiosamente, no dia seguinte (23 de novembro) à reunião do CSMP, em declarações ao jornalista na sede da Polícia Judiciária, em Lisboa, Lucília Gago declarou não se sentir responsável “por coisa nenhuma”, isto é, pela demissão do primeiro-ministro e a consequente queda do governo, na sequência da Operação Influencer. A PGR confirmaria ainda que foi ao Palácio de Belém “a solicitação do senhor Presidente da República”, sem esclarecer, no entanto, se tinha sido o primeiro-ministro a pedir ao chefe do Estado que o fizesse. “É o senhor Presidente da República que me nomeia, portanto, é absolutamente norma que queira comigo conversar sobre temas relevantes”, acrescentou.
Quanto ao célebre último parágrafo do comunicado de 7 de novembro, Lucília Gago justificou-se: ” O parágrafo do comunicado diz com transparência aquilo que está em causa na investigação. A necessidade de escrever o parágrafo é de transparência. Esse parágrafo teria de ser colocado, sob pena de, se não constasse, se pudesse afirmar que estava indevidamente a ocultar-se um segmento de enorme relevância”.
Procuradores defenderam processo de averiguações
Ainda segundo os relatos recolhidos, o anúncio do processo de averiguações a Maria José Fernandes foi o único momento em que alguns magistrados que integram o CSMP intervieram, manifestando apoio à decisão, uma vez que, de acordo com os próprio, tal artigo poderia configurar uma violação do “dever de reserva”, a que estão sujeitos os procuradores.
Neste contexto, intervieram ainda os advogados Rui Silva Leal e Vânia Gonçalves Álvares, ambos eleitos para o CSMP pela Assembleia da República. O primeiro referiu-se aos erros dos procuradores da Operação Influencer – troca de portarias, da confusão de nomes entre o primeiro-ministros, António Costa, e o ministro da Economia, António Costa Silva – e como estes acabaram por colocar em causa a imagem pública da magistratura.
Por sua vez, Vânia Álvares (membro a tempo integral do conselho) referiu que, em matéria de dever de reserva e de correção dos magistrados, também se deveria ter em conta as declarações do ex-presidente do SMMP, António Ventinhas. À Rádio Observador, o atual diretor do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Faro, reagindo a palavras de Augusto Santos Silva, afirmou que o presidente da Assembleia da República “vestiu o fato de trauliteiro”