Cerca de 30 bombeiros foram, esta sexta-feira, condenados a penas de prisão suspensa ou ao pagamento de multas por terem participado num esquema que, entre 2014 e 2016, lhes permitiu falsificar e vender dezenas de certificados de habilitações literárias, a esmagadora maioria dos quais a bombeiros voluntários que exerciam funções em quartéis na Grande Lisboa – não só na corporação de Camarate, que se tornaria na “sede” do grupo, mas também em Oeiras, Almada, Cacilhas, Barreiro, Seixal, Moscavide, Carnaxide, Sacavém ou Zambujal, e também em São Martinho do Porto, no concelho de Alcobaça (Leiria) –, que estes utilizaram para concorrer a concursos internos e empregos no INEM e no privado.
No julgamento, que contou com 59 arguidos, os três líderes do esquema – Pedro Silva, Nuno Paredes e Zélia Oliveira –, na altura dos factos bombeiros voluntários em Camarate, foram condenados a penas suspensas: Pedro e Nuno a três anos; Zélia a dois.
Outros quatro acusados, considerados pelo tribunal como intermediários – como Mário Pessoa (também bombeiro em Camarate), António Santos e Jorge Cartaxo (em Carnaxide) e Sário Antunes (em São Martinho do Porto) –, que terão passado a promover e vender os “serviços” deste grupo (que custavam entre 50 a 500 euros), em troca de uma comissão, junto de outras corporações e pessoas, foram condenados ao pagamento de uma multa. Cerca de duas dezenas de bombeiros que, segundo o tribunal deu como provado, compraram e utilizaram os certificados de habilitação também foram condenados a pagar uma multa – as multas ficaram fixadas entre os 1.400 e os 2.400 euros.
Na leitura da sentença, no Campus da Justiça, em Lisboa, a juíza-presidente destacou que tinha servido de agravante para a aplicação da pena aos líderes deste esquema o facto do crime ter sido cometido por bombeiros, uma profissão que, socialmente, é considerada “digna”.
Luís Martins absolvido
O arguido mais mediático foi um dos oito absolvidos neste processo. O tribunal não deu como provado que o comandante dos Bombeiros Voluntários de Camarate, Luís Martins, tenha comprado e utilizado um dos certificados de habilitações literários falso, como acusava o Ministério Público (MP).
Antes do início do julgamento, Luís Martins já tinha admitido, à VISÃO, que no quartel que comanda “existia” esta atividade criminosa, mas que “desconhecia por completo” a mesma, só se apercebendo do esquema no dia em que a PJ realizou buscas naquela corporação. Sempre negou, no entanto, “veementemente”, que tenha pedido ou usado um certificado falso em seu nome.
O MP ainda não anunciou se vai recorrer desta decisão.
PSP “apanhou” rede
O esquema não se resumiu ao universo dos bombeiros. Foi, aliás, por outra fresta que o edifício da organização criminosa começaria a ruir. Segundo o MP, um vigilante e formador de vigilantes, que trabalhava em duas empresas de segurança privada, localizadas em Sintra e Odivelas, também participou no golpe. Na qualidade de formador, este homem terá decidido “dar uma ajuda” aos futuros seguranças, permitindo que estes adquirissem certificados do 12º ano, tendo em vista a emissão dos respetivos cartões profissionais, pela Divisão de Segurança Privada da PSP. Mais: tendo em conta que para se frequentar cursos de vigilante são exigidos testes médicos, e este indivíduo terá contado com a colaboração de um médico para, alegadamente, serem “facilitadas” fichas de aptidão física em nome dos formandos.
O plano resultou até agosto de 2015, altura em que a PSP deu “de caras” com os certificados falsos, durante o processo de renovação do cartão profissional de dois seguranças privados, também acusados neste processo. O acaso fez disparar os “alarmes” e deu início à investigação, que ficou concluída em julho de 2016.
Correção: este artigo foi alterado, terça-feira, dia 22 de novembro, depois de, por lapso, ter sido erradamente referido que João Alves (bombeiro voluntário no Zambujal) foi condenado neste processo, quando, na verdade, foi absolvido dos crimes de que era acusado. Ao próprio e demais envolvidos endereçamos as nossas desculpas por este erro.