Os confinamentos ditados pela pandemia de Covid-19 fizeram-no ganhar uns quilos extra e não consegue perdê-los, apesar das horas que passa no ginásio? A resposta está no seu cérebro e não nos seus bíceps, segundo Herman Pontzer, professor de Antropologia Evolutiva na Duke University e de Saúde Global no Duke Institute for Global Health, nos Estados Unidos da América.
O propósito deste investigador é quebrar o mito de que, quanto mais exercício fizermos, mais calorias gastamos e, deste modo, emagrecemos. Afinal, não é bem assim.
Uma das suas mais recentes experiências foi pôr alunos – voluntários – sob stresse, com o objetivo de contabilizar a energia gasta em momentos de ansiedade. Pontzer pediu a uma aluna para, começando no número 1 022, subtrair continuadamente 13 até chegar a zero. Sempre que errasse, teria de voltar ao início. A estudante tropeçou várias vezes na subtração e foi ficando nervosa. Enquanto isso, nos bastidores, uma equipa ia medindo a sua pressão arterial, os batimentos cardíacos e a quantidade de dióxido de carbono (CO2) expelido. Este foi apenas um dos exercícios realizados pelo investigador para estimar a energia que gastamos quando estamos sob stresse, a correr, a saltar ou mesmo quando desenvolvemos uma resposta imunitária a uma vacina.
No livro Burn: The Misunderstood Science of Metabolism, lançado no ano passado, Pontzer desmonta a confusão em torno do que é o metabolismo: “Consiste em todo o trabalho que as células ou o corpo fazem. Tanto aquilo que vemos, como o movimento, como o que não vemos, como os pensamentos, o funcionamento do sistema imunitário, a digestão, a reprodução, a recuperação de lesões ou o crescimento. Sempre que as nossas células funcionam, precisam de energia”, explicou, recentemente, numa entrevista.
Pontzer não está focado no excesso de peso ou na obesidade; o que o norte-americano pretende saber é a quantidade de calorias que gastamos diariamente nas nossas rotinas ou apenas para nos mantermos vivos.
Uma das comparações que fez foi entre humanos e orangotangos. E a conclusão é inesperada. Os quatro animais que entraram na experiência beberam um inofensivo chá frio sem açúcar com isótopos – o indicador mais usado em investigações metabólicas para estimar a produção de dióxido de carbono e o gasto de energia. As amostras de urina dos orangotangos revelaram que queimaram um terço das calorias esperadas pelos cientistas para um mamífero da sua envergadura. Um deles, com 113 kg, gastou 2 050 quilocalorias por dia, enquanto um homem com o mesmo peso perde cerca de 3 300. Os orangotangos mostraram-se os “mais preguiçosos da família dos macacos”, talvez porque, no decorrer da sua evolução, “tiveram escassez de alimentos”, habituando, desta forma, o seu corpo a sobreviver com menos calorias por dia.
O exercício pode evitar que se fique doente, mas a dieta é “a melhor ferramenta para controlar o peso”. O balanço é sempre entre as calorias que se ingerem e as que se gastam
Outros estudos feitos com macacos em cativeiro mostraram que os humanos, quando ajustada a massa corporal, queimam mais 20% de energia por dia do que os chimpanzés e 40% mais do que os gorilas.
Herman Pontzer também quis avaliar o gasto de energia dos Hadza (uma tribo com cerca de 40 mil anos de existência, que vive no Norte da Tanzânia). Os Hadza são uma comunidade tradicional de caçadores-coletores, caçam e colhem plantas e frutos para viver. Sendo um estilo de vida ativo e ágil, têm muito mais atividade física diária do que, por exemplo, um citadino típico. Contudo, surpreendentemente, não queimam mais calorias do que o “americano típico”.
Numa entrevista à revista da universidade de Harvard, onde estudou, o antropólogo-biólogo explicou que, se tivermos em consideração o tamanho do corpo, a percentagem de gordura e a idade, “não há diferença no gasto diário de energia entre homens e mulheres Hadza e os adultos nos EUA, da Europa ou do Japão”.
A explicação para a incredulidade dos investigadores está no facto de nos concentramos demasiado nas calorias que queimamos quando fazemos exercício. O modelo atual de sociedade está cada vez mais virado para corpos perfeitos que caibam num pequeno biquíni ou nos músculos que se mostram na praia. Mas, na verdade, é no processo básico para nos mantermos vivos, ao nível do sistema nervoso ou na manutenção das células ativas, que “gastamos a maior parte da energia”.
Com isto não se pretende dizer que a atividade física não é importante para a saúde, pelo contrário. É essencial para o bom funcionamento do sistema cardiovascular, reduz o risco de desenvolver doenças como a diabetes, fortalece ossos e articulações, aumenta a resistência muscular e ajuda a diminuir o stresse.
O exercício pode evitar que se fique doente, mas a dieta é “a melhor ferramenta para controlar o peso”. Herman Pontzer nota que, ao fim de um ano de um programa de exercícios feitos de forma diligente e séria, é expectável que se percam dois quilos. O que não é muito. Afinal, o balanço é sempre entre as calorias que se consomem e as que se gastam diariamente.
Os seus estudos indicam que é difícil perder peso porque o nosso corpo “não está preparado para mudar assim tão facilmente”. Pontzer diz que o metabolismo humano evoluiu ao longo de milhões de anos “para se defender contra a perda de peso” – e é isso que pretende continuar a mostrar nas próximas investigações.
Mitos sobre o emagrecimento
Há quem faça muitas asneiras para perder peso. Quatro dicas úteis
Devo evitar os hidratos de carbono?
Não, eles são essenciais ao bom funcionamento do organismo e a sua principal fonte de energia. Apresentam-se sob a forma de açúcar simples, amido (massa ou arroz) e fibra (pão, leguminosas ou massas integrais). Para uma dieta equilibrada, deve reduzir-se a ingestão de açúcar, optando-se pelos outros dois.
O óleo de soja é mais saudável?
Este óleo passa por um processo de hidrogenação, ou seja tem gorduras trans na sua composição, as menos benéficas para a saúde. O melhor é moderar a sua utilização.
Ser vegetariano emagrece?
As pessoas vegetarianas tendem a ter um peso mais equilibrado, mas o que conta é a quantidade consumida de alimentos. Se ingerir mais calorias do que aquelas que gasta, o resultado será igual.
O “light” é melhor?
Depende. Há produtos que se anunciam light porque substituem o açúcar por outro tipo de adoçantes menos calóricos, como a estévia. Para serem light, é necessária uma redução de 25% das calorias em comparação com o produto normal.