O empresário e colecionador José Berardo, hoje detido por suspeita de crimes económicos, tem cerca de 2.200 obras das suas coleções de arte arrestadas pelas autoridades, parte delas no museu instalado no Centro Cultural de Belém.
O empresário José Berardo e o seu advogado André Luís Gomes foram hoje detidos no âmbito de uma operação que visou “um grupo económico” que terá lesado vários bancos, disse à agência Lusa fonte ligada ao processo.
Em julho de 2019, foram arrestadas cerca de 2.200 obras de arte do empresário e colecionador, entre as quais as 862 existentes no Centro Cultural de Belém (CCB), com as restantes 1.200, do jardim Bacalhôa Buddha Eden, no Bombarral, e da Aliança Underground Museum, nas caves Aliança-Vinhos de Portugal, em Aveiro.
O arresto foi feito na sequência de um processo interposto em tribunal pelo Novo Banco, a Caixa Geral de Depósitos e o BCP, para recuperarem uma dívida próxima de 1000 milhões de euros (mais de 962 milhões de euros).
Em causa, esteve um aumento de capital da Associação Coleção Berardo (ACB), dona das obras, feito à revelia dos bancos, que tinham os títulos desta entidade por garantia, e que diluiu a participação das instituições financeiras na associação, conforme relatou José Berardo aos deputados, no parlamento, em maio de 2019.
Dois anos mais tarde, em maio deste ano, o antigo diretor de recuperação de crédito do Novo Banco Daniel Santos, numa audição parlamentar relacionada com esta instituição financeira, disse que a ação principal contra Berardo continua em curso, e o arresto das obras “está confirmado”, tendo sido validado em segunda instância.
Quando da decisão do arresto pelo tribunal, em 2019, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, garantiu à Lusa que a decisão não punha em risco a existência do Museu Coleção Berardo.
As obras arrestadas no Centro Cultural de Belém, encontram-se aqui ao abrigo de acordo estabelecido em 2006, entre o Estado português e José Berardo, para a exibição da coleção de arte moderna e contemporânea do empresário, que possui peças de artistas como Jean Dubuffet, Joan Miró, Yves Klein e Piet Mondrian, que marcaram a História da Arte do último século.
Em novembro de 2016, uma adenda veio renovar este acordo por mais seis anos, até 2022, com a possibilidade de ser renovado automaticamente, se não for denunciado nos seis meses antes do final do prazo.
A penhora dos títulos da Associação Coleção Berardo, dados como garantia aos bancos credores de entidades ligadas a José Berardo, por ordem judicial, em julho de 2019, aconteceu dois emses depois de José Berardo ter dito no parlamento que o Estado perdera o direito de compra da coleção de arte, o que viria a ser contrariado pelo Governo.
Em maio desse ano, a ministra Graça Fonseca disse que o Governo usaria “as necessárias e adequadas medidas legais” para garantir que a chamada Coleção Berardo, patente em Lisboa, continuasse inteira e acessível ao público.
Graça Fonseca indicou então que a Cultura, a Justiça e as Finanças estavam “articulados” para defender a “imperiosa necessidade de garantir a integridade, a não-alienação e a fruição pública” das obras expostas no CCB, frisando que as hipóteses ao dispor do executivo são suficientes para garantir essa integridade da coleção.
O Museu Coleção Berardo abriu em 2007 com um acervo inicial de 862 obras da coleção de arte do empresário, cedidas ao Estado, avaliadas nessa altura em 316 milhões de euros pela leiloeira internacional Christie’s.
O teor deste acordo impede qualquer classificação da coleção de 862 obras, se não for exercido o direito de opção de compra, pelo Estado.
A cláusula 10.ª deste documento, que se mantém válida após a adenda de 2016, determina igualmente que o Estado não pode impedir a coleção de sair do país, caso termine o acordo de empréstimo das obras.
Em abril deste ano, o Governo reconduziu os representantes do Estado no conselho de administração da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea – Coleção Berardo – Catarina Vaz Pinto, Elísio Summavielle e Rui Patrício -, constituída no âmbito deste acordo.
Além de exibir parte da coleção de arte moderna e contemporânea no Museu Coleção Berardo, no CCB, José Berardo detém outros museus no país.
Em abril deste ano, inaugurou, também na capital, em Alcântara, o Berardo – Museu Arte Deco (B-MAD), com uma exposição baseada nas coleções de Arte Nova e Arte Deco.
O projeto para criação do novo museu reabilitou a antiga residência de veraneio do então Marquês de Abrantes, mandada construir na primeira metade do século XVIII, que tinha como primeira habitação o Palácio de Santos, ou Palácio de Abrantes, atual Embaixada de França em Lisboa.
No Bombarral, detém o Buddha Eden Garden, cerca de 35 hectares na Quinta dos Loridos, onde se encontram centenas de figuras orientais como budas, pagodes, estátuas de terracota e outras esculturas.
Em 2010, abriu o Underground Museum em Sangalhos, Anadia, ligado à enologia, num espaço subterrâneo onde exibe coleções de arte africana, fósseis, cerâmica, minerais e azulejos antigos.
No distrito de Évora, em Estremoz, numa parceria com a autarquia local, abriu em 2020 um museu dedicado à coleção de azulejos, com exemplares do século XV até à atualidade.
AG (ZO/CC/JE/JRS) // MAG