Com o estado de emergência quase, quase a chegar ao fim, e o estado de calamidade a entrar em vigor já no próximo dia 4 de maio (segunda-feira), avizinham-se já algumas mudanças no acesso às praias: o plano de desconfinamento do governo, aqui relatado pela VISÃO, prevê que já a partir da próxima segunda-feira seja de novo possível fazer desportos individuais e ao ar livre, desde que sem utilização de piscinas ou balneários. Rui Rodrigues Teixeira, comandante da Capitania do Porto de Cascais, confirma à VISÃO que os praticantes de pesca lúdica e de desportos náuticos como surf, kitesurf, stand Up Paddle (SUP) ou bodyboard também poderão voltar à água nesse dia. Desde que sem ajuntamentos.
A abertura da época balnear não deverá acontecer antes do dia 1 de junho
Rui Rodrigues Teixeira, capitão do porto de cascais
Ainda assim, para a maior parte das pessoas, e pelo menos nalguns concelhos da Grande Lisboa, o acesso às praias deverá continuar condicionado durante o mês de maio. Em Cascais, por exemplo, o paredão deverá ficar fechado até ao dia 18 deste mês, data em que se desce um degrau no plano de desconfinamento do governo, confirma à VISÃO o comandante Rui Rodrigues Teixeira. E mesmo nessa altura ainda não deverá ser aberta a época balnear. “As medidas vão sendo avaliadas a cada 15 dias, mas a informação que tenho é de que a abertura não deverá acontecer antes do dia 1 de junho”, diz a mesma fonte.
O plano de desconfinamento prevê uma redução gradual das interdições, mas a capitania de Cascais, que abrange uma área que vai de Cascais a uma parte de Torres Vedras, passando pelas praias de Sintra e de Mafra, continua firme em manter condicionamentos nos acessos aos areais, mesmo que quem os procura fosse apenas andar ou correr por curtos períodos de tempo. “É importante que a população siga as restrições e adote os comportamentos de segurança, sem se expor em demasia. Convém lembrar que continuamos com dever cívico de recolhimento domiciliário”, mesmo em estado de calamidade, reforça o comandante.
O governo deverá lançar na próxima quarta-feira, dia 6, um regulamento de acesso às praias com as normas gerais de acesso
Nos últimos dias têm-se intensificado as reuniões entre autarquias, capitanias, forças de segurança, Associação Nacional de Municípios, Autoridade Marítima e Agência Portuguesa do Ambiente (APA), entre outras entidades, para que em conjunto sejam encontradas soluções para a abertura das praias este ano. As medidas a impor ainda estão em discussão, mas sejam quais forem a única certeza é a de que neste Verão o acesso às praias será inevitavelmente condicionado, devido às normas de distanciamento social impostas pela pandemia da Covid-19. O governo deverá lançar na próxima quarta-feira, dia 6, um regulamento de acesso às praias com as normas gerais de acesso. Que servirá de base para que depois cada município faça os devidos ajustes à sua realidade: nem todas as praias têm as mesmas características (a mesma dimensão ou o mesmo tipo de acessos) ou sequer a mesma procura.
Cascais recusa acessos com discriminação
Algumas das possíveis soluções que têm sido avançadas por diversas entidades são a instalação de torniquetes ou barreiras à entrada, controlando o número de pessoas que acede à praia, ou o alargamento das áreas concessionadas, que permitiria que os chapéus e espreguiçadeiras ficassem a pelo menos dois metros de distância uns dos outros. Mas se a primeira ideia recebe pouco acolhimento dos autarcas e da Autoridade Marítima devido à escassez de profissionais para vigiar os areais, a segunda faz aumentar o receio de que sejam criadas praias para ricos e outras para pobres.
Recusamos medidas que promovam a discriminação. Uma das nossas premissas base é a igualdade de acesso. Não vamos instituir soluções que impossibilitem o acesso a determinados grupos e criem praias desiguais.
Joana Balsemão, vereadora da Câmara municipal de Cascais com o pelouro do urbanismo
Joana Balsemão, vereadora com o pelouro do Urbanismo na Câmara Municipal de Cascais, garante à VISÃO que o município não irá embarcar “por medidas que promovam a discriminação”. Ou seja, o concelho de Cascais, que tem areais que costumam estar lotados como o de Carcavelos, e praias com acessos mais remotos, como a da Bafureira, recusa-se a abrir praias apenas a quem pagar por um dia de chapéu e espreguiçadeira aos concessionários daquele espaço, ou a soluções que passem, por exemplo, por fechar os acessos via comboios da Linha de Cascais. “Uma das nossas premissas base é a igualdade de acesso. Não vamos instituir soluções que impossibilitem o acesso a determinados grupos e criem praias desiguais.”
Alguns parques de estacionamento junto às praias poderão permanecer encerrados ou com lugares muito limitados durante o Verão
Ainda assim, a responsável pelo Urbanismo admite que a abertura das praias poderá ser feita de forma faseada, com as praias a serem divididas em três áreas: estabelecimentos comerciais, paredão e areal. “No litoral também há uma dimensão económica, não só de lazer. A abertura de alguns bares e restaurantes de praia ou esplanadas poderá não coincidir com a reabertura das praias. Poderá ser feita uma coisa de cada vez, porque nos casos destes estabelecimentos há uma dimensão económica mas também de controlo e segurança que pode ser mais facilmente atingida, como o espaçamento entre as pessoas.” Pelo contrário, outras zonas poderão ter constrangimentos durante o verão inteiro, como os parques de estacionamento. “É outra zona que estamos a considerar”, admite Joana Balsemão, pelo que alguns parques de estacionamento poderão permanecer encerrados ou com lugares muito limitados.
A autarquia montou inicialmente um grupo de trabalho interno que tem testado “vários modelos em Excel” e tem estado em contacto permanente com “concessionários, escolas de surf, capitania, associações de nadadores salvadores, Agência Portuguesa do Ambiente e delegada regional de saúde” para definir um modelo de reabertura das praias. E está a aguardar com expectativa as orientações do Governo: “Se forem orientações genéricas, os municípios vão ter de encontrar as suas próprias fórmulas. A ser uma normativa muito detalhada e exigente, vai ter de incluir apoio na fiscalização e implementação”, diz Joana Balsemão, que deixa já críticas antecipadas ao que pode estar a ser preparado: “É fácil escrever as melhores leis mas elas serem só letras se não houver ferramentas para apoiar os municípios. Não é justo pedir-lhes que assegurem a época balnear mais difícil das nossas vidas em plena fase de transferência de competências e que fiquem com a responsabilidade da fiscalização sem terem gente suficiente para fiscalizar.”
Não é justo pedir aos municípios que assegurem a época balnear mais difícil das nossas vidas e que fiquem com a responsabilidade da fiscalização sem terem gente suficiente para fiscalizar
Joana Balsemão, vereadora da câmara municipal de Cascais com o pelouro do urbanismo
A Capitania de Cascais supervisiona uma área de 77 quilómetros de costa, que abrange 32 praias, em quatro municípios diferentes. Mas a Polícia Marítima nesta área só tem 18 profissionais efetivos, podendo esse número ser reforçado com apenas mais seis durante o Verão. “Não é realista que se consiga fiscalizar. Nem vão ser certamente os nadadores salvadores que vão substituir a Polícia Marítima”, avisa a vereadora, que também tem muitas dúvidas sobre a possibilidade de avançar com soluções como torniquetes à entrada das praias. “Tenho dúvidas sobre se será viável do ponto de vista tecnológico mas também sobre se será aceitável do ponto de vista sociológico e cultural.”
Para já, apesar das muitas reuniões, o capitão do porto de Cascais diz que “ainda nada está definido” e que em conjunto estão a ser estudadas as melhores de formas de controlar os acessos aos areais, permitindo que todos possam ir à praia este Verão mas sem se colocarem a si ou a outros em risco. O plano deverá envolver as capitanias, nadadores salvadores e militares da Marinha (no âmbito do programa Seawatch).
Almada deve mudar já regras de acesso às praias
Em Almada, como a VISÃO explicou na passada semana, o paredão da Costa da Caparica foi interditado, bem como o acesso às praias urbanas. Mas as praias de maior dimensão e mais a sul, como a de São João da Caparica ou a da Fonte da Telha, ficaram abertas – condicionadas apenas às regras do estado de emergência, isto é, acessíveis apenas à prática de alguns desportos, passeio de animais de companhia e aos chamados passeios higiénicos, com menos de cinco pessoas.
Apesar disso, a presidente da Câmara de Almada, Inês de Medeiros, admite que algumas restrições poderão ser já levantadas na próxima segunda-feira. “A partir do momento em que os desportos náuticos passam a estar autorizados (desde que sem uso de balneários), creio que algumas regras terão de mudar. É esperado que no início da próxima semana tenhamos de fazer ajustamentos ao estado de calamidade.”
Temos praias que pela sua morfologia são mais fáceis de controlar mas também temos quilómetros de praia corrida que não sei muito bem como conseguiremos vigiar
Inês de medeiros, presidente da Câmara municipal de Almada
Sobre o que acontecerá daí em diante, a autarca faz depender todas as decisões do regulamento nacional que está a ser elaborado na sequência das reuniões entre a Agência Portuguesa do Ambiente e as autarquias. O concelho de Almada tem 13 quilómetros de praias e engloba praias urbanas, praias concessionadas e praias sem vigilância. Todas elas exigirão, à partida, diferentes níveis de controlo. “Iremos adaptar o regulamento nacional ao nosso território, com medidas para evitar o aglomerado de pessoas e com reforço da fiscalização. Temos praias que pela sua morfologia são mais fáceis de controlar mas também temos quilómetros de praia corrida que não sei muito bem como conseguiremos vigiar”, diz à VISÃO a autarca Inês de Medeiros.
Isaltino Morais: “Franciscos às sextas e Marias às quintas? Não me parece”
Já Isaltino Morais remete decisões só para depois do fim do estado de emergência. “Não me precipito, mas tenho ouvido por aí muita coisa estapafúrdia. Fuzileiros a vigiar praias? Os Franciscos às sextas e as Marias às quintas? Não me parece. Mas as regras gerais que sejam definidas que depois o município fará as suas adaptações.” Até agora, Oeiras tem mantido o Passeio Marítimo aberto (a única exceção aconteceu no fim de semana da Páscoa) e as praias (de Santo Amaro de Oeiras, da Torre e de Paço de Arcos) com acesso condicionado, mas não proibido.
A circulação entre concelhos está proibida durante este fim-de-semana, mas com a previsão de temperaturas a ultrapassar os 30 graus este domingo, 3 de maio, a Autoridade Marítima emitiu um comunicado a avisar que a Polícia Marítima iria reforçar ações de fiscalização e vigilância a recomendar à população que “se mantenha afastada das praias, assumindo um comportamento de segurança e evitando expor-se ao risco”, lembrando não só os riscos associados à pandemia da Covid-19, mas também que as praias ainda não estão a ser vigiadas, algo que só deverá acontecer com o início da época balnear.