Sempre que nascem pintainhos machos nas criações de galinhas poedeiras, estes são trucidados, gaseados ou asfixiados. É assim em Portugal e em todo o mundo. A razão é económica: os machos desta estirpe não têm valor comercial porque demoram muito mais tempo do que os chamados “frangos de carne” (geneticamente apurados para crescerem depressa) a atingirem o peso ideal para consumo.
Por causa disso, quando nascem, os pintos machos são abatidos (uma diretiva da União Europeia determina que isso aconteça até às 72 horas de vida das aves). Em Portugal, abatem-se nesta fase algumas dezenas de milhares de pintos machos por mês. No planeta, estima-se que a prática atinja sete mil milhões de animais por ano – quase o mesmo que a população total de humanos.
A prática é das mais controversas no já de si controverso mundo da pecuária intensiva, e grupos ativistas de defesa dos animais têm lutado há anos para que seja proibida. Esta semana, conseguiram uma pequena vitória: o ministro da agricultura de França, Didier Guillaume, anunciou que o abate de pintos machos será banido a partir de 2021 (tal como a castração de leitões sem anestesia). A indústria tem, assim, menos de dois anos para se adaptar.
“Vai ser um problema. Não sei como vão fazer”, comenta José João Nunes, professor de Medicina Veterinária e diretor do departamento de avicultura de uma empresa de alimentação animal. “Um frango de carne leva 21 dias a atingir um quilo de peso. Um frango destes só chega lá ao fim de três meses. Não é viável, do ponto de vista económico.” O mais natural é que, ficando mais cara a criação das aves, a medida resulte numa subida substancial do preço da carne de frango e dos ovos, avisa. “O consumidor não vai aceitar bem aumentos de 50% do preço.”
O ministro francês da Agricultura disse esperar que, até ao fim do próximo ano, já exista uma forma de descobrir o sexo dos frangos ainda no ovo. Essa, na verdade, é uma solução que está a ser procurada pelo setor há muito, mas ainda não há métodos fiáveis que possam ser aplicados a grande escala. Um dos mais promissores foi apresentado em janeiro de 2017 num estudo científico publicado na principal revista da especialidade, a Poultry Science. A técnica consiste em alumiar os ovos com lâmpadas de halogéneo e em analisar os padrões através de uma câmara hiperespectral, para determinar a cor das penas do embrião. Quando realizado aos 14 dias (ou seja, sete dias antes da eclosão), o teste consegue descobrir o sexo da ave com uma eficácia de 97%. No entanto, além de esta tecnologia estar ainda longe de poder ser aplicada em aviários industriais, só resulta num tipo específico de galinha, em que os machos e as fêmeas têm diferentes cores de penas.
Outro método testado em laboratório, apresentado num estudo em 2013, consiste em retirar líquido do ovo com uma agulha extremamente fina aos nove dias de incubação; de seguida, é analisada a concentração de sulfato de estrogénio, o que permite perceber o sexo do embrião, com 98% de garantia. Mas a análise demora quatro horas a ser feita, além de provocar uma taxa de mortalidade dos embriões à volta de 3%, o que o torna inaplicável em larga escala. “Esses métodos estão numa fase muito inicial. Não é ainda possível aplicá-los na prática”, diz José João Nunes.
É uma questão de tempo até o debate sobre a matança de pintos chegar a Portugal – o PAN já disse que vai pedir informações ao governo sobre o assunto.
Apesar de a matança de pintos logo ao nascimento ser considerada por muitos uma prática desumana, a carne não é desperdiçada. Os restos das aves são esmagados e desidratados, para fazer uma farinha proteica que depois é usada em rações de cães e gatos.
Nota: este artigo foi atualizado com novos dados.