É política da empresa: nunca se sabe quais são as audiências das séries e filmes que passam na Netflix ou são seu exclusivo. Mas sabe-se que, no caso da 13 Reasons Why (em português Por 13 Razões), ela é provavelmente a série mais fraturante do canal de streaming. O guião trata de uma adolescente perturbada, que acaba por se matar. Só que antes, deixa 13 cassetes (sim, cassetes, das antigas) gravadas em que aponta o dedo aos colegas e assim os culpa pelo seu fim radical, (alerta, spoiler!) cortando os pulsos.
A primeira temporada (uma segunda dose está quase assegurada) da adaptação do livro com o mesmo nome, de Jay Asher, já se transformou na mais discutida do Twitter. De acordo com a empresa de métricas online Fizziology, ela pode mesmo ostentar o título de série mais popular de sempre a ser produzida pela Netflix – gerou 3,5 milhões de tweets na semana de estreia, entre 31 de março e 7 de abril.
Calcula-se que nem todos os comentários tenham ido no mesmo sentido, porque há os seguidores ferrenhos da série, há os que viram, mas consideram que os mais novos só o devem fazer quando acompanhados, e os que pensam que a história romantiza o suicídio e expõe os mais vulneráveis a imagens demasiado explícitas de violação, bullying e morte.
Por cá, a Netflix ainda não registou qualquer queixa ou crítica menos agradável. Mas, internacionalmente, viu-se obrigada a reagir, em comunicado.
“Sabíamos que os temas tratados na série eram sensíveis e por isso trabalhámos com especialistas em saúde mental para que eles atestassem se esses assuntos poderiam ter impacto real e dramático na vida dos teenagers. Com isto em mente, classificámo-la para maiores de 13 anos, juntámos avisos nos três episódios mais gráficos, produzimos o documentário Beyond The Reasons (Por trás das Razões) e criámos site global para ajudar as pessoas a encontrar recursos de saúde mental nos seus países.”
O criador da série, Brian Yorkei, acrescenta ainda que trabalharam muito para que os temas se tornassem difíceis de digerir: “Queríamos que fosse doloroso assistir aos episódios para mostrar claramente que não há nada que justifique alguém tirar a sua própria vida.”
A produtora executiva Selena Gomez, atriz e cantora de 24 anos, também se viu obrigada a esclarecer que pretendia que temas como o bullying e o suicídio na adolescência “fossem absorvidos pelos espectadores mais jovens de forma a ficarem assustados ou confusos e os obrigasse a falar sobre isso.”
Entretanto, na Nova Zelândia, reajustaram a classificação da série para 18 anos. Não admira – o país tem uma das mais altas taxas de suicídio juvenil na OCDE e os defensores de saúde mental estão bastante preocupados com as consequências que o consumo compulsivo de Por 13 Razões pode ter junto dos adolescentes.
A verdade é que, no Brasil, já se fala num aumento exponencial de pedidos de ajuda recebidos pelo Centro de Valorização da Vida, que combate o suicídio, aumento esse que é atribuído a este argumento televisivo.
Nos EUA, as escolas estão a enviar comunicados aos pais para que eles controlem as crianças mais vulneráveis e não as deixem ver o programa sem supervisão. “Mesmo sendo feio, o suicídio pode gerar imitações”, garante Victor Schwartz, psiquiatra de um grupo americano de prevenção ao suicídio.
Em Portugal, os ânimos estão serenos. Demais. A linha SOS Voz Amiga (Tel. 21 354 4545, 91 280 2669 e 96 352 4660), para onde deve ligar quem tem tendências suicidas só funciona entre as quatro da tarde e a meia-noite. E quando tentámos ligar para saber se por cá os pedidos de ajuda tinham aumentado entre os mais novos, ninguém atendeu.