O universo é substancial: 550 pessoas suspeitas, arguidas ou condenadas por fogo posto em florestas, desde 1997. A partir do estudo destes casos, o Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais (ISPJCC) fez o retrato do incendiário português.
Este é um crime sobretudo masculino. Em 2015, por exemplo, 94% dos 52 incendiários detidos pela PJ eram homens. Provêm, por norma, de famílias disfuncionais, e vivem sozinhos em locais isolados. E são biscateiros – ou, como se lê nos documentos da pesquisa, exercem “atividades profissionais de subsistência”.
Isto porque “possuem fracas competências académicas” e demonstram “grandes dificuldades de integração na comunidade e de relacionamento social”. Mostram, igualmente, diminuto “autocontrolo de impulsos” e “fraca consciência das consequências dos seus atos”.
Curiosamente, a piromania é uma perturbação quase sem expressão no estudo do ISPJCC. Já um vasto conjunto de problemas psicológicos assumem relevância: depressão, défice cognitivo, demência alcoólica, perturbações da personalidade e esquizofrenia.
Em muitos casos, aliás, “os agressores não conhecem o proprietário dos terrenos que incendeiam”. Só um “grupo restrito” surge como tendo recorrido ao incêndio enquanto instrumento de “represália contra um indivíduo de forma objetiva”.
Para cometer o crime, uma esmagadora maioria, perto dos 100%, usa isqueiros, fósforos ou velas. Depois, por norma, ficam a observar o incêndio e até ajudam no combate às chamas. Outro comportamento-padrão é atearem o fogo perto da área da sua residência ou do local onde na altura trabalham.
Quanto à reincidência, em 2015 chegou a 25% das pessoas detidas pela PJ. Também revelam tendência para cometer este crime indivíduos que têm no cadastro condenações por furto e agressão sexual.
Mas a psicóloga Cristina Soeiro, professora no ISPJCC e envolvida na coordenação deste estudo, lança um alerta: “Nos últimos anos é cada vez maior o peso dos casos de incendiários com problemas de saúde mental associados a alcoolismo.” E avança uma urgência: “É necessário investir mais na intervenção concertada da repressão e do diagnóstico e tratamento” destas pessoas. Se isso não acontecer, avisa Cristina Soeiro, “o problema persistirá ano após ano”.
Falta a percentagem residual, a das mulheres incendiárias. Também aqui a pesquisa encontrou um “quadro de depressão grave”, mas sobretudo devido a “problemas relacionais”. É fraseado académico para desgosto de amor.